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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Diplomas que publicam, alteram e regulamentam o Código Penal

Diplomas que publicam, alteram e regulamentam o Código Penal


Lei n.º 24/82, de 23 de Agosto – autoriza o Governo a legislar com vista a um novo Código Penal e a adoptar as disposições adequadas de direito criminal, de processo criminal e de organização judiciária, bem como a legislar em matéria de contravenções e contra-ordenações e ainda sobre o regime penal de jovens


Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, rectificado pela Declarações de Rectificação de 3 de Dezembro de 1982 e de 31 de Janeiro de 1983 – Aprova o Código Penal


Alterado e regulado por:


Lei n.º 6/84, de 11 de Maio – Exclusão de ilicitude em alguns casos de interrupção voluntária da gravidez (altera os artigos 139.º, 140.º, 141.º)


Lei n.º 43/87, de 28 de Dezembro, rectificada pela Declaração de Rectificação de 10 de Fevereiro de 1988 – autoriza o Governo a alterar os artigos 132.º, 144.º e 386.º do Código Penal


Decreto-Lei n.º 101-A/88, de 26 de Março (altera os artigos 132.º, 144.º e 386.º / medidas de protecção da vida ou da integridade física de agentes e funcionários das forças de segurança)


Lei n.º 16/92, de 6 de Agosto – autoriza o Governo a legislar relativamente aos processos especiais de recuperação das empresas e de falência


Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 141/93, de 31 de Julho – Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência (altera os artigos 325.º, 326.º e 327 / revisão dos termos da incriminação da insolvência, da falência e do favorecimento de credores)


Lei n.º 35/94, de 15 de Setembro, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 17/94, de 13 de Dezembro – autoriza o Governo a rever o Código Penal


Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 73-A/95, de 14 de Junho – Aprova o Código Penal (reviu, republicou e renumerou o Código Penal / corrige o desequilíbrio entre as penas previstas para os crimes contra as pessoas e os crimes contra o património. Reorganiza o sistema de penas permitindo recurso às medidas alternativas às penas curtas de prisão)


Lei n.º 90/97, de 30 de Julho – Altera os prazos de exclusão da ilicitude nos casos de interrupção voluntária da gravidez (altera o artigos 142.º)


Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro (altera os artigos 5.º, 7.º, 10.º, 83.º, 84.º, 86.º, 101.º, 102.º, 113.º, 120.º, 121.º, 132.º, 138.º, 150.º, 152.º, 155.º, 158.º, 160.º, 161.º a 167.º, 169.º, 170.º, 172.º a 181.º, 184.º, 185.º, 221.º a 223.º, 227.º a 229.º, 240.º, 275.º, 287.º, 320.º, 321.º, 335.º, 344.º, 358.º e 364.º / artigos relativos aos crimes sexuais, contra a liberdade de imprensa, contra a liberdade de circulação e o regime de liberdade condicional. Disposições relativas a ilícitos penais laborais)


Lei n.º 7/2000, de 27 de Maio – 5ª alteração ao Código Penal, reforça as medidas de protecção a pessoas vítimas de violência (altera o artigo 152.º)


Lei n.º 77/2001, de 13 de Julho – 6ª alteração ao Código Penal (altera os artigos 69.º, 101.º, 291.º, 292.º e 294.º / condução de veículos com motor)


Lei n.º 97/2001, de 25 de Agosto – 7ª alteração ao Código Penal (altera os artigos 255.º, 262.º, 265.º e 266.º / falsificação de moeda)


Lei n.º 98/2001, de 25 de Agosto – 8ª alteração ao Código Penal, altera o regime de uso e porte de arma (altera o artigo 275.º)


Lei n.º 99/2001, de 25 de Agosto – 9ª alteração ao Código Penal (altera os artigos 169.º, 170.º, 172.º, 176.º e 178.º / torna público o crime de abuso sexual de crianças)


Lei n.º 100/2001, de 25 de Agosto – 10ª alteração ao Código Penal (altera o artigo 143.º / torna público o crime de ofensa à integridade física contra agentes das forças de segurança)


Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro – 11ª alteração ao Código Penal, altera o regime jurídico dos crimes de tráfico de influência e de corrupção (altera os artigos 335.º, 372.º, 373.º e 386.º)


Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro – procede à conversão de valores expressos em escudos para euros em legislação na área da justiça


Lei n.º 23/2002, de 21 de Agosto – autoriza o Governo a alterar o Código de Processo Civil no que respeita à acção executiva


Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 5-C/2003, de 30 de Abril – Regime da Acção Executiva (adita o artigo 227.º-A / frustração de créditos)


Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 16/2003, de 29 de Outubro – Lei Combate ao Terrorismo, 14.ª alteração ao Código Penal (altera o artigo 5.º / factos praticados fora do território português; revoga os artigos 300.º e 301.º / organizações terroristas, terrorismo)


Lei n.º 100/2003, de 15 de Novembro, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 2/2004, de 3 de Janeiro – Código de Justiça Militar (altera o artigo 308.º - traição à Pátria / revoga os artigo 237.º e 309.º a 315.º - crimes contra a independência e integridade nacionais)


Lei n.º 39/2003, de 22 de Agosto – autoriza o Governo a legislar sobre a insolvência de pessoas singulares e colectivas


Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março – Código da Insolvência e Recuperação de Empresas (altera os artigos 227.º, 227.º-A, 228.º e 229.º / insolvência e favorecimento de credores; adita o artigo 229.º-A / agravação de penas)


Lei n.º 11/2004, de 27 de Março, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 45/2004, de 5 de Junho – Regime de prevenção e repressão do branqueamento de vantagens de proveniência ilícita, 16ª alteração ao Código Penal (adita o artigo 368.º-A / branqueamento)


Lei n.º 31/2004, de 22 de Julho – Adapta a legislação penal portuguesa ao Estatuto do Tribunal Penal Internacional, 17ª alteração ao Código Penal (altera os artigos 5.º e 246.º - factos praticados fora do território português e incapacidades / revoga os artigos 236.º, 238.º, 239.º, 241.º e 242.º - crimes contra a paz e contra a humanidade)


Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro – Aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições (revoga o artigo 275.º/ substâncias explosivas ou análogas e armas)


Lei n.º 16/2007, de 17 de Abril – Exclusão da ilicitude nos casos de interrupção voluntária da gravidez (altera o artigo 142.º / interrupção da gravidez não punível)


Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 102/2007, de 31 de Outubro – 23ª alteração ao Código Penal (altera os artigos 2.º, 5.º, 6.º, 11.º, 30.º, 38.º, 41.º a 47.º, 50.º a 64.º, 78.º a 80.º, 90.º, 102.º, 113.º, 115.º, 116.º, 118.º, 121.º, 122.º, 127.º, 132.º, 144.º a 147.º, 152.º a 155.º, 158.º, 160.º a 167.º, 169.º a 179.º, 184.º, 187.º, 190.º, 192.º, 204.º, 206.º, 212.º, 213.º, 216.º a 218.º, 222.º, 224.º, 240.º, 246.º, 249.º, 250.º, 255.º, 256.º, 260.º, 261.º, 271.º, 272.º, 274.º, 275.º, 277.º, 278.º a 280.º, 285.º, 286.º, 288.º, 290.º, 291.º, 293.º, 296.º, 299.º, 329.º, 338.º, 347.º, 353.º, 364.º, 367.º, 368.º-A, 371.º, 383.º e 386.º / adita os artigos 90.º-A a 90.º-M, 152.º-A e 152.º-B / altera a ordenação sistemática / revoga o n.º 6 do artigo 61.º e o n.º 2 do artigo 153.º/ republicação / principais alterações: responsabilidade penal das pessoas colectivas, diversificação das sanções, reforço da tutela de pessoas particularmente indefesas, novos crimes contra a liberdade pessoal e sexual, efectiva reparação do prejuízo causado à vítima nos crimes contra o património)


Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro - altera o regime jurídico do divórcio (altera os artigos 249.º e 250.º)


Lei n.º 32/2010, de 2 de Setembro (altera os artigos 111.º, 118.º, 372.º, 373.º, 374.º e 386.º / adita os artigos 278.º-A, 278.º-B, 374.º-A, 374.º-B e 382.º-A)


Lei n.º 40/2010, de 3 de Setembro (altera o artigo 30.º)

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

sábado, 30 de outubro de 2010

Danger danger - Captain bring me down


Hello captain bring me down
I see you've worked your way right through the crowd to me
I couldn't help but see you fall
You were the one that had it all
And now you've come to pay your debts
So we forgive and you forget

The more you live the more you learn
Ain't it funny how the tables turn on you

Hello captain bring me down
Put your feet back on the ground
Hello captain bring me down

When we were young you were so cool and
All the kids they thought that you were the one to be
But playground heroes never fall
They just drown their youth in alcohol and
Watch it slowly fade away
Live to drink another day

You can't make right the things you've wronged
Your glory days have come and gone away

Hello captain bring me down
Put your feet back on the ground
Hello captain bring me down

You wanna leave it all behind you
But you just won't let it go
Oh no, oh no

Solo

The more you live the more you learn
Ain't it funny how the tables turn on you

Hello captain bring me down
Put your feet back on the ground
Hello captain bring me down
Put your feet back on the ground
Hello captain bring me down

Hello captain bring me down
I see you've worked your way right through the crowd to me
I couldn't help but see you fall
You were the one that had it all
And now you've come to pay your debts
So we forgive and you forget.


Harem Scarem - Something to say

SOMETHING TO SAY (lyrics)
by: Harem Scarem

Yesterday I had it all worked out to a "T"
But now something's wrong between you and me
I was wrong, so wrong
To think that I would stay
Seasons come and seasons go
And today is another day
I wanna say now's the time
To go our separate ways
I don't know I might be wrong
Could we find the strength to say
That our love, our love's seen some better days
And who's to say if I had the chance
That I'd make the choice to say
If you ever had something that you wanted to say
You better start talking before I go away
I wish that I could say I've been feeling okay
That I'll be bringing on the better days
But I wouldn't feel right
Knowing I was lying to you
Am I wasting all my time, will we try to make amends
I try to read between the lines
But all I see is the end

Rastrelli Cello Quartett Piazzolla - Oblivion

Stanley Kunitz- Touch me


Summer is late, my heart.
Words plucked out of the air
some forty years ago
when I was wild with love
and torn almost in two
scatter like leaves this night
of whistling wind and rain.
It is my heart that's late,
it is my song that's flown.
Outdoors all afternoon
under a gunmetal sky
staking my garden down,
I kneeled to the crickets trilling
underfoot as if about
to burst from their crusty shells;
and like a child again
marveled to hear so clear
and brave a music pour
from such a small machine.
What makes the engine go?
Desire, desire, desire.
The longing for the dance
stirs in the buried life.
One season only,
and it's done.
So let the battered old willow
thrash against the windowpanes
and the house timbers creak.
Darling, do you remember
the man you married? Touch me,
remind me who I am.

Sentido e função do direito processual penal

 1º CAPÍTULO &1 – Sentido e função do direito processual penal I 
– O direito processual penal no contexto da “ciência global” do direito penal - o crime constitui o objecto das ciências criminais em sentido amplo, onde ganham particular relevo o direito penal, a criminologia e a política criminal 
1 – O direito processual penal e direito penal - Denomina-se direito penal o conjunto o conjunto das normas jurídicas que ligam a certos comportamentos humanos – os crimes – determinadas consequências privativas deste ramo de direito – as penas e as medidas de segurança. - o direito penal substantivo visa a definição dos pressupostos do crime e das suas concretas formas de aparecimento, bem como a determinação, tanto em geral como em espécie, das consequências ou efeitos que à verificação de tais pressupostos se ligam – é dizer, das penas e das medidas de segurança -, bem como ainda das formas de conexão entre aqueles pressupostos e estas consequências. - ao direito processual penal cabe a regulamentação jurídica do modo de realização prática do poder punitivo estadual, nomeadamente através da investigação e da valorização judicial do comportamento do acusado do cometimento de um crime e da eventual aplicação de uma pena ou medida de segurança. - ao direito penal executivo pertence a regulamentação jurídica da concreta execução da pena ou da medida de segurança decretada na condenação e proferida no processo penal. - o direito penal em sentido estrito exige uma regulamentação complementar para que a sua concretização se realize ao estabelecer, por forma geral e abstracta, quais os factos que devem ser considerados crimes e quais as penas que lhes correspondem. - Direito processual penal: ramo do direito que disciplina a investigação e esclarecimento do crime concreto e permite a aplicação da consequência jurídica àquele que, com a sua conduta realizou um tipo de crime. - a relação entre direito penal e direito processual penal é, sob diversos pontos de vista, uma relação mútua de complementaridade funcional. - o direito penal de hoje afirma-se como última ratio da protecção dos bens jurídicos ao colocar como finalidade primordial da pena a reafirmação da norma violada apesar do crime, preocupando-se com a socialização dos delinquentes. - o novo direito penal português baseia-se numa concepção da pena que, arrancando de uma prevenção geral de integração, acentua dialecticamente as dimensões da culpa e da socialização do agente. - arts. 368º e 369º CPP distinguem a questão da culpabilidade da questão da determinação da sanção, respectivamente. - para o actual mandamento de política criminal, o direito penal só deve intervir nos casos de violação de bens jurídicos e, ainda aqui, apenas quando nenhum outro meio menos oneroso de política social seja eficaz para levar a cabo tal protecção. - a liberdade é pressuposto da culpa jurídico – penal - toda a doutrina jurídico – penal da tipicidade teve origem puramente processual na teoria medieval do corpus delicti (corpus delicti = corpo do delito; conjunto de provas da prática de um crime) - o processo penal é autónomo relativamente ao direito substantivo - Pressupostos penais de que depende, em concreto, o nascimento de uma pretensão jurídico – substantiva: exige-se a realização (cometimento) de um tipo de crime.
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Pressupostos da extinção das consequências jurídicas de uma pretensão jurídico – substantiva: prescrição da pena: art. 121º e ss do CPP - Pressupostos funcionais de que depende, em concreto, o nascimento de uma pretensão jurídico – processual: basta a notícia da infracção (arts. 241º e 262, nº 2) Pressupostos da extinção das consequências jurídicas de uma pretensão jurídico – processual: prescrição do procedimento criminal: arts. 117º e ss. do CP. - no direito penal e no direito processual penal estamos perante regulamentações jurídicas autónomas, justificadas pela diversidade de objectos a que se dirigem - a distinção entre direito penal e direito processual penal perde muitas vezes a sua clareza, quando se trata de saber se uma concreta norma ou instituto jurídico (ex. a prescrição, a queixa e a acusação particular) “pertence” ao direito penal ou ao direito processual penal; Ex: * Para efeitos de proibição de retroactividade: comparar arts. 1º, nº 1 e 2º CP ---------- art. 5º CPP * Proibição de aplicação por analogia art. 1º, nº 3 CP ------ art. 4 CPP * Aplicação da lei no espaço: arts. 4 a 7 do CP ------ art. 6 CPP - determinação do regime penal mais favorável: art. 2, nº 4 do CP - a diferença fundamental entre a matéria penal e processual é determinada é determinada pelos diferentes círculos espaços) da vida sobre os quais actuam as normas respectivas. Para além disso, a solução terá de procurar-se e encontrar-se ao nível de cada problema concreto - o direito processual penal surge como o conjunto das normas jurídicas que orientam e disciplinam o processo penal A função essencial do processo penal cumpre-se na decisão sobre se, na realidade, se realizou, em concreto um tipo legal de crime e, em caso afirmativo, na decisão sobre a consequência jurídica que dali deriva. - Dentro do direito de execução das penas temos: 1 – regulamentação directamente atinente à determinação prática do conteúdo da sentença condenatória e, portanto, à realização concreta da reacção criminal naquela imposta: aqui trata-se de matéria substantiva; 2 – regulamentação imediatamente respeitante ao efeito executivo da sentença e, portanto, aos preliminares e ao controlo geral da execução: aqui estaremos perante matéria processual. (Injunção = acto ou efeito de injungir, ordem formal, imposição) (Injungir = impor como obrigação, obrigar) 2 – Direito processual penal e criminologia POPITZ afirma que “uma sociedade que estivesse em condições de descobrir e sancionar toda a deviance, destruiria simultaneamente, o valor das suas normas” porquanto “a função protectora da norma só actua eficazmente se circunscrita a uma reduzida expressão quantitativa” - art. 280º CPP: arquivamento em caso de dispensa da pena - art. 281º CPP: suspensão provisória do processo - Para o CPP de 1987: na pequena e média criminalidade valem de forma especial as ideias de oportunidade, diversão, eficácia da confissão livre e integral do arguido; é a este nível que as soluções de consenso ganham especial relevo. Na criminalidade mais grave devem viabilizar-se as soluções que passem pelo reconhecimento e clarificação do conflito. - Hoje, fazer criminologia é também fazer injunções dirigidas aos agentes de aplicação das normas. 3 – Direito processual penal e política criminal - o programa político – criminal de hoje assenta na ideia de que a imposição de pena só pode ter por justificação a tutela das expectativas criadas pela norma ou a reafirmação da validade da norma violada, o que acarreta consigo consequências relevantes ao nível do processo penal. Um primeiro aspecto prende-se com a celeridade do processo. De facto, já defendia Montesquieu que o efeito de prevenção geral do sistema penal não depende em quase nada de uma grande severidade das penas, mas depende em extremo grau da probabilidade de punição e do lapso de tempo dentro do qual ela venha a efectuar-se. Também a probabilidade de justeza da decisão – condição necessária para que o efeito de prevenção geral de integração se realize – varia na relação inversa do tempo que esta demore a ter lugar.
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Afirmar a finalidade de prevenção geral de integração é também exigir que no processo penal a determinação das consequências jurídicas do crime assuma um relevo especial e formal no decurso do julgamento penal. - Para ZIPF, com a determinação das consequências jurídicas do crime realiza-se a decisão político – criminal no caso concreto: o cumprimento das intenções e do programa político – criminal do sistema dependem, na mais alta medida, de uma justa aplicação das consequências jurídicas do crime. - Na elaboração da sentença distinguem-se a a) questão da culpabilidade – art. 368º, da b) questão da determinação da sanção – art. 369º - art. 371º: permite que a audiência de julgamento seja reaberta no caso de ser necessária produção de prova suplementar para determinação da espécie e da medida da sanção a aplicar. - Para F. Dias, o direito processual é “a forma através da qual as proposições de fins político – criminais se vazam no modus da validade jurídica” e acrescenta que o processo penal é “a forma através da qual as proposições de fins político criminais se vazam no modus da vigência jurídica” - Expressão da ideia de diversão ou desjudicialização são: a) arquivamento no caso de dispensa ou isenção de pena (art. 280º) – diversão simples b) suspensão provisória do processo (art. 281º) – diversão com intervenção II – Finalidades do processo penal - As finalidades do processo penal conexionam-se com um critério de valor adequado à interpretação teleológica das singulares normas e à solução dos concretos problemas jurídico – processuais. Pretende-se a revelação das grandes relações (enquadramentos) funcionais entre as singulares normas e problemas jurídico – processuais e a totalidade da ordem jurídica. - As finalidades primárias a cuja realização o processo penal se dirige são: a) a realização da justiça e a descoberta da verdade material; b) a protecção, perante o Estado, dos direitos fundamentais das pessoas; c) o restabelecimento da paz jurídica comunitária posta em causa pelo crime e a consequente reafirmação da validade da norma violada 1 – A realização da justiça e a descoberta da verdade material - A realização da justiça e a descoberta da verdade material constituem, por consenso praticamente unânime, finalidade do processo penal. »» Por detrás da imposição de uma pena está uma finalidade de prevenção geral de integração e, portanto, uma exigência de verdade e de justiça na aplicação da sanção. - Institutos como o do: a) “caso julgado” (são reconhecidos em processo penal) b) in dubio pro reo (são reconhecidos em processo penal) ….são reconhecidos em processo penal - Exige-se que a verdade material tenha sido lograda de modo processual válido e admissível e, portanto, com o integral respeito dos direitos fundamentais das pessoas que no processo se vêem envolvidas. 2 – A protecção dos direitos fundamentais das pessoas - A protecção dos direitos fundamentais das pessoas perante o Estado surge também como finalidade do processo penal. - o processo penal deverá decorrer segundo as regras do Estado de Direito (o que protege o interesse da comunidade). - As regras do Estado de Direito: a) que se prendem com os direitos fundamentais das pessoas b) que exigem que a decisão final tenha sido lograda de um modo processualmente válido »» vão impedir em certas situações, a obtenção da verdade material (ex. com a proibição das provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas (art. 126º) 3 – O restabelecimento da paz jurídica - Pretende-se restabelecer a paz jurídica comunitária posta em causa pelo crime – ou até pela suspeita da prática do crime: intenção do processo penal é não só condenar os culposos como também absolver os inocentes.
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- art. 32º/2 da CRP “Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.” (princípio in dubio pro reo) - A finalidade do restabelecimento da paz jurídica comunitária liga-se, em grande parte, a valores de segurança (embora haja limitações: ex. art. 449º “Fundamentos e admissibilidade da revisão” – o que atenta o valor de segurança, indo perturbar de novo, tanto a paz jurídica do arguido como a da própria comunidade (p/ F. Dias). Esta situação ocorre em nome, precisamente, da descoberta da verdade material, ainda mesmo que a primeira decisão tenha sido obtida segundo meios processualmente admissíveis. 4 – A “concordância prática” - Princípio axiológico que preside à ordem jurídica de um estado de direito material: o princípio da dignidade do homem, da sua intocabilidade e da consequente obrigação de a respeitar e de a proteger. - As medidas cautelares e de polícia, bem como a detenção são um exemplo de matéria onde é patente a tarefa de concordância prática de: a) tutela de direitos fundamentais das pessoas b) obtenção da verdade material - art. 126º “Métodos proibidos de prova”: está em causa a protecção da dignidade humana As provas obtidas através de tais métodos não podem ser valoradas, ainda que contribuíssem para a descoberta da verdade material. & 2 – Localização do direito processual penal no sistema jurídico I – O direito processual penal como parte do direito processual - Entre nós, desde as posturas de D. Afonso II que o processo assumiu carácter público, no sentido de representar, em primeira linha, o interesse da sociedade na punição do criminoso. - O processo civil, penal, administrativo, constitucional: constituem o produto da exigência teleológica e funcional de adequação à especificidade das normas substantivas que aqueles tipos processuais têm de realizar na vida concreta do direito. - Comparação entre: a) Direito Processual Penal b) Direito Processual Civil »» ambos são processos inteiramente jurisdicionalizados, em que se trata da comprovação de certos factos e da declaração das consequências jurídicas correspondentes. - Processo civil: tem como causa uma relação de direito privado e pertence aos sujeitos desta, que no seu se, quer no seu como. - Processo Penal: deriva juridicamente de um crime, tende à aplicação de uma pena e pertence à sociedade – que a exerce, ela própria (“acção popular”) ou delega o seu exercício em magistrados especializados - A relação de direito privado não postula, necessariamente, uma decisão judiciária para a sua realização concreta (antes esta tem lugar, na generalidade dos casos, independentemente do recurso ao processo) - A submissão de um criminoso a reacções criminais só pode dar-se, dentro do Estado, pela via de um processo e da consequente decisão judiciária. Nulla poena sine processu: o processo penal é o necessário pressuposto de realização e complemento do direito penal. - O direito civil confere aos particulares interessados a faculdade de fazerem valer no processo as suas pretensões ou de renunciarem a elas (na medida em que tal faculdade não lese um interesse público preponderante) – daqui derivando uma quase total disponibilidade do objecto do processo fortemente limitadora dos poderes do tribunal. Uma tal disponibilidade contraria decisivamente a função do processo penal: a de esclarecer os crimes e punir os criminosos. No processo penal, o objecto é praticamente indisponível pelos sujeitos processuais: trata-se de dar realização a um interesse da comunidade e do próprio Estado. - Ao processo civil cabe uma natureza privatística - Ao processo penal cabe uma natureza e uma estrutura publicisticas
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»» Características mais marcantes do processo penal que o distanciam do processo civil: Processo penal: a) tem uma fase de investigação denominada inquérito, tendente a averiguar se e em que condições o arguido cometeu a infracção b) invalidade de princípios como o da auto-responsabilidade probatória das partes, consequente à inexistência de um ónus de provar, contradizer e impugnar. c) impossibilidade de dispor, através de qualquer transacção ou renúncia, do objecto do processo d) atribuição ao juiz de uma quase total discricinaridade cognitiva dentro do tema que lhe seja proposto pela acusação e) ausência de uma real contraposição de interesses entre os sujeitos que formalmente surgem como partes f) necessidade de uma particular adequação das estruturas processuais à tarefa primordial de conhecer e avaliar a personalidade do delinquente, que assim deixa de ser um “abstracto” sujeito para ser a mais concreta “realidade processual” II – O direito processual penal como parte do direito público - Tal como o direito penal, também o direito processual penal constitui uma parte do direito público, por 2 razões: a) o Estado exerce a sua função jurisdicional b) a perseguição e condenação dos criminosos é matéria de uma comunidade constituída em Estado. »» O direito processual penal tem na sua base o problema fulcral das relações entre o Estado e a pessoa individual e da posição desta na comunidade - O processo penal constitui um dos lugares por excelência em que tem de encontrar-se a solução do conflito entre as exigências comunitárias e a liberdade de realização da personalidade individual - meios coercivos: medidas de coacção, exames, buscas, apreensões - terceiros (não arguidos): testemunhas, peritos, pessoas sem qualquer participação processual - o processo penal deve ter em consideração os princípios da necessidade e da proporcionalidade, bem como, no caso de se tratar de direitos fundamentais, a exigir que não seja efectuado o seu conteúdo essencial. & 3 - A conformação jurídico – constitucional do processo penal e a sua estrutura - os fundamentos do direito processual penal são, simultaneamente, os alicerces constitucionais do Estado - A concreta regulamentação de singulares problemas processuais é conformada jurídico – constitucionalmente. I – O processo penal de estrutura inquisitória - Estados europeus absolutistas (sécs. XVII e XVIII): o processo penal é dominado exclusivamente pelo interesse do Estado, que não concede ao interesse das pessoas qualquer consideração autónoma; o julgador tinha liberdade inteiramente discricionária (embora exercida sempre em favor do poder oficial). O arguido era visto como mero “objecto” de inquisição. Ao juiz competia, simultaneamente, inquirir, acusar e julgar. Havia um processo inquisitório ou de estrutura inquisitória. II – O processo penal de estrutura acusatória e o processo penal reformado - No Estado liberal, no centro da consideração está agora o indivíduo autónomo, dotado com os seus direitos naturais originários e inalienáveis. No processo penal travava-se uma oposição de interesse (portanto, de uma lide, disputa ou controvérsia) entre o Estado que quer punir os crimes e o indivíduo que quer afastar de si quaisquer medidas privativas ou restritivas da sua liberdade) -Magna Charta Libertatum de João – sem – Terra: 1215 - Bill of Rights: 1689 - Act of Settlement: 1701 - Code d’instruction Criminelle: 1808 (França)
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- 1822: Mouzinho da Silveira organizou o Ministério Público (de base acusatória) III – O processo penal de estrutura mista, inquisitória mitigada ou moderna - Reconhecia o princípio da acusação: esta competiria ao Ministério Público, enquanto o julgamento seria da competência do juiz. »» Na concepção típica de um processo de estrutura “mista”, “inquisitória mitigada” ou “inquisitória moderna”, tanto o Ministério Público como o defensor são órgãos de administração da justiça penal – tentativa de transformar o defensor em mero colaborador da realização do interesse do Estado, porque também ele, como o Ministério Público, estaria vinculado à descoberta da “verdade material” IV – O processo penal de estrutura acusatória integrado por um princípio de investigação - Constituiria um erro pensar o jurídico como um aparelho de controlo global de estrutura social. - A ideologia do Estado de Direito assenta a razão da sua força no seguinte: persistência na convicção de que, em todas as circunstâncias, os direitos de cada pessoa devem ser defendidos e a sua liberdade salvaguardada. - O Estado de Direito não exige apenas a tutela dos interesses das pessoas e o reconhecimento dos limites inultrapassáveis, dali decorrentes, à prossecução do interesse oficial na perseguição e punição dos criminosos. Ele exige também a protecção das suas instituições e a viabilização de uma eficaz administração da justiça penal. Também um unilateralismo sistemático no sentido da protecção do arguido ameaçaria o Estado de Direito, mesmo nos seus fundamentos. - A via para um correcto equacionamento de evolução do processo penal nos quadros do Estado de Direito material deve partir do reconhecimento e aceitação da tensão dialéctica inarredável entre tutela dos interesses do arguido e tutela dos interesses da sociedade, representados pelo poder democrático do Estado; e encontrar o seu critério numa fórmula adequada de composição destes interesses, em princípio conflituantes. O critério apontado pelo prof. Figueiredo Dias aponta em operar a concordância prática dos interesses conflituantes, sendo certa que onde ela não seja levada a cabo e se dê guarida a um só dos interesses conflituantes, em detrimento do outro, aí estará um sinal seguro – salvo se estiver em jogo a intocável dignidade da pessoa humana – de uma solução antidemocrática e totalitária. A estrutura processual que melhor dá cumprimento ao critério de lograr a harmonização dos interesses em conflito é uma estrutura acusatória integrada pelo princípio da investigação, a qual não vai contra a natureza publicistica do processo penal reafirmada nos quadros do Estado de Direito material. Através do princípio da investigação, pretende-se traduzir o poder dever que ao tribunal pertence de esclarecer e instruir autonomamente – isto é, independentemente das contribuições da acusação e da defesa – o “facto” sujeito a julgamento, criando ele próprio as bases necessárias à sua decisão. Com a integração deste princípio logra-se acentuar convenientemente o carácter indisponível do objecto e do conteúdo do processo penal, a sua intenção dirigida à verdade material, as limitações indispensáveis à liberdade do arguido que não ponham em causa a sua dignidade nem o seu direito de defesa. Há que retirar as consequências do imperativo de justiça social que vive no Estado de Direito material, sem com isso encurtar ou pôr em perigo os elementos de garantia dos direitos das pessoas bem como de não cair na estrutura tradicional do processo civil, no reino do formal, do disponível e do privatístico. - A melhor maneira de o processo contribuir para a criação de legitimação estadual estará em se reger por regras que lhe permitam um funcionamento eficaz e livre de entraves. V – A evolução da estrutura do processo penal português - Em 1929 surgiu o Código de Processo Penal, que antecedeu o agora vigente. O código consagrava um sistema de “forma acusatória” ou de “acusatório formal”. Esta estrutura processual era materialmente inquisitória, já que o mesmo juiz procedia à instrução e ao julgamento, cabendo ao Ministério Público deduzir a acusação.
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& 4 – O direito processual penal e a sua aplicação I – Fontes do direito processual penal português - A mais importante fonte do direito processual penal vigente é o CPP de 17 de Fevereiro de 1987. Ao lado desta fonte principal existe legislação extravagante - Texto definitivo do CPP: DL nº 78/87 de 17 de Fevereiro - O CPP possui uma larga base de legitimação que se optimiza no ponto de confluência da legitimidade material com a legitimidade formal: * da legitimidade material lograda por soluções jurídicas dos problemas sociais reveladoras da máxima funcionalidade compatível com certos referentes axiológicos fundamentais; * com a legitimidade formal, como resultado do processo de argumentação e de consenso democráticos em todas as instâncias politicamente representativas da comunidade. - A formação do CPP foi dominada por soluções da máxima funcionalidade possível à luz dos valores da justiça, da verdade material, da paz jurídica, da defesa da dignidade e dos direitos das pessoas. - Ao lado do “direito legal” tem um lugar de relevo o direito judicial, criado por via jurisprudencial. A jurisprudência não é uma “fonte” em sentido formal, pelo que não deve pôr-se ao mesmo nível de obrigatoriedade que cabe à lei, nem em conflito com ela, de modo a arrastar uma questão de prevalência ou hierarquização. Não basta a norma geral e abstracta para, através dela, se obter, sem mais, por puros métodos lógico – formais, a decisão cabida a uma certa situação; esta é sempre uma decisão no âmbito do particular e do contingente, que só a jurisprudência está em condições de “viver” - Assentos: agora inexistentes no processo penal, pela introdução do recurso da fixação de jurisprudência (art. 437º e ss.) que resolve o problema da uniformização da jurisprudência a partir da autonomia dogmática, metodológica e teleológica do processo penal em relação ao processo civil. »» Fonte material do Direito Processual Penal: * lei * doutrina (a quem compete a construção da dogmática jurídico – processual penal). Também nesta se trata de encontrar soluções justas e adequadas para concretos problemas da vida comunitária. II – Interpretação e integração da lei processual penal - O direito processual penal pode ser reduzido numa sua perspectiva formalista, ao conjunto das normas legais que disciplinam o processo penal. Aqui se depararão os problemas da interpretação da lei e da integração das suas lacunas. »» À norma legal cabe uma dupla função: 1) Função de valoração dos comportamentos processuais como admissíveis e inadmissíveis; 2) Função de determinação daqueles comportamentos no sentido do que previamente tenha sido valorado como processualmente admissível »» O problema da interpretação da lei não ganha, em direito processual penal, autonomia: trata-se aí, como em geral, da necessidade de uma actividade tendente a descortinar o conteúdo de sentido ínsito num certo texto legal. - Há que relembrar 2 pontos já devidamente acentuados: 1) É o da relevância que, para uma interpretação axiológica e teleológica nos domínios da nossa disciplina, assume a consideração das finalidades do processo. 2) É o da necessidade de, por ser o direito processual penal verdadeiro “direito constitucional aplicado” se tomar na devida conta o princípio da interpretação conforme a Constituição. »» art. 4º Integração de lacunas. Perante lacunas da lei, percorrer-se-á um tríplice caminho no processo integrativo: a) analogia
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b) regras do processo civil que se harmonizem com o processo penal c) princípios gerais do processo penal - No direito penal substantivo encontra-se proibida a analogia relativamente: a) à qualificação de um facto como crime (art. 1 CP); b) à definição de um estado de perigosidade (art. 1 CP); c) à determinação da pena ou medida de segurança que lhes corresponde (art. 1 CP) »»» a), b), c): directa consequência do princípio jurídico – constitucional da legalidade (art. 29.º/1 CRP) - art. 29º/1 CRP: este princípio é imposto pela necessidade de garantir os indivíduos contra possíveis arbitrariedades do poder do Estado. Tal garantia não é estendida aos domínios do processo penal, por se tratar aqui de um direito meramente instrumental, que visará só pôr ordem, método e disciplina na administração da justiça. »» Constituindo o princípio da legalidade (art. 29º CRP), a mais sólida garantia das pessoas contra possíveis arbítrios do Estado, não se vê porque não haja ele de estender-se, na medida imposta pelo seu conteúdo de sentido, ao processo penal (isto para F. Dias) - o art. 29º/1 CRP refere o princípio da legalidade à exigência de se não ser “sentenciado criminalmente”, pretendendo aplicá-lo tanto ao direito penal como ao direito processual penal, não obstante a limitação ao primeiro sugerida pelo restante texto legal (isto para F. Dias) - Para Figueiredo Dias, o recurso à analogia do art. 4º CPP fica vedado na medida imposta pelo conteúdo de sentido do princípio da legalidade e, portanto, sempre que o recurso venha a traduzir-se num enfraquecimento da posição ou numa diminuição dos direitos processuais do arguido (desfavorecimento do arguido, analogia “in malem partem”) - Toda a norma que restrinja o conteúdo ou o livre exercício de direitos subjectivos é uma norma excepcional e, por conseguinte (art. 11º CC), não comporta aplicação analógica. - É mais correcto e preferível a via do argumento de analogia que pode retirar-se do art. 5º/2 do CPP. - Se o caso interpretado não tem outro análogo directamente regulado na lei processual penal, manda o art. 4 do CPP recorrer às regras do processo civil que se harmonizem com o processo penal. Confere-se assim, às normas legais do processo civil o estatuto de direito subsidiário, todavia sob condição de se demonstrar a sua harmonia, no caso, com os princípios do processo penal. - Compreende-se que o recurso aos princípios gerais do processo penal, como fonte de integração, seja obrigatoriamente antecedido pelo recurso às normas do processo civil devido à maior certeza e segurança que estas (já legalmente formuladas) oferecem perante aqueles princípios (necessariamente abstractos). Há que requerer harmonia entre as normas do processo civil e os princípios do processo penal, pois há diferenças estruturais e funcionais. Há que ter todo o cuidado antes de se conferir a uma norma de processo civil função integrante de uma lacuna do direito processual penal. - Aos princípios gerais do processo penal não pertence apenas a “função negativa ou de controlo do recurso ao direito subsidiário”, mas também, de acordo com a parte final do art. 4º, uma função positiva e directamente integradora”, quando a lacuna não tenha podido ser colmatada com o recurso à analogia e às regras do processo civil. III – Âmbito de aplicação do direito processual penal português O âmbito de aplicação material do direito processual penal português coincide com os limites da jurisdição portuguesa em matéria penal; é demarcado pela especificidade do objecto de que se trata em processo penal: as questões referentes à realização do direito penal que, em último termo, consideram o crime acusado e as reacções criminais que em abstracto lhe caibam.
»» No nosso direito processual penal, o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime deve, em princípio, ser deduzido no processo penal (art. 71º) e nele decidido (art. 377º). Deste modo, segue-se o chamado sistema de adesão da acção civil à acção penal; e não apenas, na sua formulação moderada, como “possibilidade” de juntar aquela a esta (sistema de alteratividade ou de opção), mas indo até ao ponto de estabelecer o princípio da “obrigatoriedade” da adesão (sistema de dependência
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processual absoluta do pedido civil). Contudo, esta reparação não perde a sua natureza especificamente civil, pois quanto a ela vale, desde logo, a lei civil (art. 128º do CP) e o princípio processual civil da necessidade do pedido (art. 71º e 77º do CPP) »» Distinta da infracção penal que constitui objecto do processo penal é a infracção disciplinar que, todavia, não chega a pôr um problema de delimitação no âmbito de aplicação do direito processual penal, uma vez que o respectivo processo não se encontra, entre nós, nas mãos do poder judicial. - Infracções fiscais: constituem verdadeiros crimes comuns, cuja tramitação se processa no quadro do direito processual penal. - Contra – ordenações (ex. art. 2º do DL nº 242/86 de 27-12-86, sobre a ilicitude fiscal aduaneira): seguem o regime substantivo e processual do ilícito de mera ordenação social; - Ilícito de mera ordenação social: aqui já estamos fora do âmbito de aplicação material do direito processual penal e face a um tipo processual autónomo - O processo penal vale apenas quanto às infracções fiscais que revestem a forma de crime, sendo estas, ao contrário das restantes, da competência dos tribunais judiciais e não dos tribunais fiscais (art. 212º CRP) »» O âmbito de aplicação material do direito processual penal não é integrado pela categoria das contravenções (as contravenções foram abolidas) »» O âmbito de aplicação espacial do direito processual assenta na ideia de que a jurisdição penal se contém estritamente dentro dos limites do Estado, valendo aqui o princípio da territorialidade (art. 6º, 1ª parte) - art. 6º, última parte: a jurisdição penal portuguesa é aplicável a crimes cometidos no estrangeiro, nos limites definidos pelos tratados, convenções e regras do direito internacional. Vale o princípio de que, nas relações entre a jurisdição penal nacional e uma estrangeira, os actos processuais pertencentes a uma, não são obrigatórios para a outra. Desenvolve-se entre os Estados, por meio de convenções e tratados, bilaterais ou plurilaterais, uma mútua cooperação, ajuda e assistência em matéria penal, um princípio de auxílio jurídico inter – estadual em matéria penal. - arts. 229º e ss. Livro V – Relações com autoridades estrangeiras e entidades judiciárias internacionais, havendo como objecto três institutos fundamentais: * extradição 229º * rogatórias ao estrangeiro (art. 230º) * efeito das sentenças penais estrangeiras (art. 234º) - É de relevar o princípio geral da prevalência das convenções e tratados internacionais, intervindo o CPP apenas na sua falta: art. 229º CPP »» Efeitos negativos da sentença penal estrangeira: impedimento do julgamento em Portugal de infracções cometidas no estrangeiro já aí julgadas e impõe que, no caso de novo processo, seja sempre tida em conta a pena que o arguido já tiver cumprido no estrangeiro (art. ?) »» Efeitos positivos da sentença penal estrangeira: a sentença penal estrangeira tem força executiva ainda que necessite de prévia revisão e confirmação. - Em princípio, o problema do âmbito pessoal de aplicação do direito processual penal coincide com o da aplicação pessoal do direito penal substantivo: estão sujeitas à jurisdição penal portuguesa todas as pessoas (e só aquelas) a quem seja aplicável o direito penal português. O Direito Processual Penal não atinge apenas os arguidos suspeitos: também uma ampla gama de “terceiros” se encontra sujeita a determinações processuais em matéria de prazos, de deveres de comparecer, prestar declarações, suportar exames, buscas e apreensões, etc. - É ao Direito Processual Penal que pertence determinar os direitos e os deveres processuais de todas as pessoas, nacionais ou estrangeiras, participantes em um processo penal que deva submeter-se ao direito português. Mesmo relativamente aos arguidos há limitações da aplicabilidade do direito processual penal quanto às pessoas que, ainda quando correspondam parcialmente a limitações do direito penal surgem como limitações autónomas da jurisdição penal portuguesa. É o caso:
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a) das isenções fundadas em preceitos do direito internacional. Abrangem Chefes de Estado estrangeiros, diplomatas e agentes equiparados, suas famílias e, em parte, também o seu pessoal administrativo e técnico, pessoal de serviço e cônsules. b) limitações derivadas do direito constitucional português, atingindo o Presidente da República, os Deputados à Assembleia da República, os membros do Governo (arts. 130º, 157º e 196º da CRP), bem como os membros do Conselho de Estado, o Provedor de Justiça e todos aqueles que o Acordo das Lages e a Convenção da OTAN prevêem. São chamadas imunidades que valem (ora para a própria instauração do processo, ora para a prisão, ora para qualquer destes actos, umas vezes, absolutamente, outras vezes, enquanto não preceder autorização de quem de direito), como verdadeiros pressupostos processuais (pressupostos = obstáculos) c) garantia política concedida aos deputados à Assembleia da República, uma vez que “não respondem civil, criminal ou disciplinarmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções” (art. 157º/1 CRP) »» Quanto ao âmbito de aplicação temporal da lei processual penal, em regra ela – como em geral, toda a lei (art. 12º CC) “só dispõe para o futuro” »»» O princípio jurídico – constitucional da legalidade estende-se, em certo sentido, a toda a repressão penal e abrange, nesta medida, o próprio direito processual penal; 1 – Importa que a aplicação da lei processual penal a actos ou situações que decorrem na sua vigência, mas se ligam a uma infracção cometida no domínio da lei processual antiga, não contrarie nunca o conteúdo da garantia conferida pelo princípio da legalidade. Daqui resultará que não deve aplicar-se a nova lei processual penal a um acto ou situação processual que ocorra em processo pendente, sempre que da nova lei resulte um agravamento da posição processual do arguido, ou em particular, numa limitação do seu direito de defesa (art. 5º, nº 2, al. a)). - Em segundo lugar, a circunstância de o processo ser constituído por uma longa e completa tramitação, em que os diversos actos se encadeiam uns nos outros, de forma por vezes inextricável, pode conduzir a que se não deva aplicar uma alteração legislativa processual a processos iniciados anteriormente à vigência da lei nova, uma vez que a solução poderá acarretar uma quebra da harmonia e unidade dos vários actos do processo (art. 5.º, nº 2, al. b)). 2º CAPÍTULO PRINCÍPIOS GERAIS DO PROCESSO PENAL - A conformação concreta do processo depende: a) da experiência jurídica; b) da vontade legislativa, »»» dirigidos por um número limitado de princípios constitucionais que exprimem os valores preferenciais e os bens prevalentes, em dado momento, numa certa comunidade. Tais princípios devem reconduzir-se ao mínimo que possa contar com o aplauso da comunidade e corresponda à sua consciência ético – jurídica. - Se procurarmos agrupar os mais importantes princípios gerais em correspondência com os grandes capítulos do processo penal, talvez se revele adequada a sua divisão em princípios gerais relativos a: a) promoção ou iniciativa processual: princípios da “oficialidade”, da “legalidade” e da “acusação”; b) prossecução ou decurso processual: princípios da “investigação”, da “contraditoriedade”, da “suficiência” e da “concentração” c) prova: princípios da “investigação”, da “livre apreciação da prova” e “in dubio pro reo” d) forma: princípios da “publicidade”, da “oralidade” e da “imediação” & 5 – Princípios relativos à promoção processual I – O princípio da oficialidade
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- Trata-se aqui a questão de saber a quem compete a iniciativa (o impulso) de investigar a prática de uma infracção e a decisão de a submeter ou não a julgamento. »» É seguro não poder o Estado demitir-se do seu dever de perseguir e punir o crime e o criminoso, ou sequer, negligenciá-lo, sob pena de minar os fundamentos em que assenta a sua legitimidade. Da função de protecção da ordem social (de protecção da vida comunitária, do homem), advém, por conseguinte, ao Estado, o dever de administração e realização da justiça penal. Este dever é o correlato da necessidade sentida pelo Estado, de tomar sob os seus ombros, de forma exclusiva, a tarefa de investigar, esclarecer, perseguir e sentenciar os crimes cometidos dentro da sua “jurisdição”. Conexiona-se com o princípio da exclusão da auto – defesa ou princípio do monopólio estadual da função jurisdicional, que constitui uma exigência irrenunciável das sociedades modernas, fundado por valores tão essenciais como os da realização da justiça, da unidade do Estado e da paz jurídica e social. - O princípio do monopólio estadual da função jurisdicional constitui hoje um alicerce inatacável de todas as sociedades (art. 202º CRP): a autodefesa só é admissível em casos muito excepcionais, rigorosamente delimitados pela lei e subordinados à ideia da “impossibilidade de recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais, para evitar a inutilização prática” do direito (art. 336º CC). A reforçar o fundamento do princípio da oficialidade está a circunstância de na actual concepção do Estado recair sobre este, exclusivamente, o dever de administração e realização da justiça penal, bem como o carácter público das reacções criminais aplicadas em processo penal. »» No nosso direito processual actual, o princípio da oficialidade pretende receber consagração plena, na medida em que cabe a uma entidade pública – ao Ministério Público (art. 219º/1 da CRP) a iniciativa de investigar a prática de uma infracção e a decisão de a submeter ou não a julgamento. - De acordo com o art. 48º CPP, “O Ministério Público tem legitimidade para promover o processo penal” após a aquisição da notícia do crime (art. 241º), cabendo-lhe, consequentemente, “receber as denúncias, as queixas e as participações e apreciar o seguimento a dar-lhes” art. 53º, nº 2, al. a)). Investigada a notícia do crime, na fase denominada “inquérito” (art. 262º/1), é ainda a mesma entidade oficial – o Ministério Público – quem decide, finda aquela, da acusação ou do arquivamento do processo (art. 276º, nº 1). - No nosso direito processual penal actual há limitações e excepções ao princípio da promoção processual oficiosa: a) limitações derivadas da existência dos crimes semi – públicos b) excepções advindas da existência dos crimes particulares em sentido estrito Crimes públicos: - Dizem-se crimes públicos aqueles em que o Ministério público promove oficiosamente e por sua própria iniciativa, o processo penal e decide com plena autonomia da submissão ou não submissão da infracção a julgamento (em relação a estes crimes vale inteiramente o princípio da oficialidade) Denominados crimes semi – públicos ou semi – particulares - Dizem-se crimes particulares, em sentido amplo, aqueles em que a legitimidade do Ministério Público para promover o processo precisa de ser integrada por uma queixa do ofendido ou de outras pessoas (art. 49º/1 CPP e 113º, nº 1, 2 e 3) Denominados crimes particulares em sentido estrito - Aqueles em que, para além da queixa, é necessário que o titular deste direito, depois de constituído assistente, deduza acusação particular (art. 50º/1), caso queira que o facto seja submetido a julgamento (art. 285º/1). Ao Ministério Público cabe apenas, se quiser, juntar a sua acusação à do assistente (art. 285º/3). Estes são uma verdadeira excepção ao princípio da oficialidade: o particular decide sobre a investigação da prática da infracção e também sobre a submissão da mesma a julgamento, enquanto que os primeiros (semi – públicos ou semi – particulares(?)) comportam apenas uma limitação, na medida em que neles o Ministério Público continua a decidir autonomamente sobre a submissão ou não da infracção a julgamento. (ver def. dic. P. 140 e 142)
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- O fundamento da existência de crimes particulares lato sensu reside, por um alado, em que certas infracções (por ex. certas formas de ofensas corporais, danos, furtos, injúrias, difamações) não se relacionam com bens jurídicos fundamentais da comunidade de modo tão directo e imediato que aquela sinta, em todas as circunstâncias da lesão – por ex. atenta a sua insignificância -, necessidade de reagir automaticamente contra o infractor. Se o ofendido entende não fazer valer a exigência de retribuição, a comunidade considera que o assunto não merece ser apreciado em processo penal. A adicionar, em certas infracções, por ex. nos crimes sexuais, no furto entre parentes) a promoção processual contra ou sem a vontade do ofendido pode ser inconveniente ou mesmo prejudicial para interesses seus dignos de consideração, porque estreitamente relacionados com a sua esfera íntima ou familiar; perante um tal conflito de interesses juridicamente relevantes, o legislador dá prevalência ao interesse do particular considerado em si mesmo e no reflexo que assume em interesses públicos. » Há que verificar se na queixa e na acusação particular deparamos com exigências do direito penal substantivo ou antes, com verdadeiros pressupostos processuais. » Há que decidir se na queixa e na acusação particular deparamos com exigências de direito penal substantivo ou antes com verdadeiros pressupostos processuais. - conexionam-se com a queixa os artigos: 148º/4, 168º, 174º, 178º/3, 211º; 213º/2; 214º/2; 224º/2 - conexionam-se com a acusação particular os artigos: 164º, 165º, 167º, 169º, 173 por remissão do 174º » A decisão sobre a exigência ou não exigência de queixa e de acusação particular inscreve-se no espaço processual e não afecta a valoração social da relação da vida a que se refere. - Há hipóteses em que a lei torna a iniciativa de investigar a prática da infracção e a decisão de a submeter a julgamento dependentes da co – actuação do ofendido ou de outras pessoas, a quem a lei confere o direito de queixa ou de acusação particular. II – O princípio da legalidade - De acordo com o princípio da perseguição oficiosa dos crimes, visa o Estado corresponder ao seu dever de administração e realização da justiça penal, obtendo a condenação judicial de todos os culpados e só dos culpados da prática de uma infracção. - Em processo penal é fundamental o princípio da legalidade - Em processo civil dá-se ao autor a faculdade de avaliar a oportunidade da propositura da acção »» De acordo com os artigos 262º/2 e 283º/1, o Ministério Público está obrigado a promover o processo penal, abrindo o inquérito, sempre que tenha adquirido a notícia de um crime (art. 241º e ss.) e a deduzir acusação se tiver recolhido indícios suficientes de se ter verificado crime de quem foi o seu agente. Não há lugar para qualquer juízo de “oportunidade” sobre a promoção e prossecução do processo penal, antes esta se apresenta como um dever para o Ministério Público, uma vez verificadas determinadas condições. A actividade do ministério Público desenvolve-se sob o signo da estrita vinculação à lei (daí falar-se em princípio da legalidade). » Num possível conflito entre o dever de legalidade e o de obediência hierárquica (no âmbito do Ministério Público), em princípio deverá prevalecer o dever de legalidade - Princípio da imutabilidade: a acusação pública não pode ser retirada a partir do momento em que um tribunal foi chamado a decidir sobre ela. Deste modo, fica excluída, tanto a renúncia à acusação como a desistência dela. - Nos crimes particulares em sentido amplo é possível tanto a renúncia como a desistência desde que esta se verifique, sem oposição do arguido, até à publicação da sentença da 1ª instância (art. 51º CPP e 116º CP) » Consequência do princípio da legalidade: art. 242º CPP: denúncia obrigatória ao Ministério Público que impende sobre as entidades policiais, quanto a todos os crimes de que tenham conhecimento, e sobre os funcionários (art.? CP), demais agentes do Estado e gestores públicos, quanto aos crimes de que tomarem conhecimento no exercício das suas funções e por causa delas.
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» Consequência do princípio da legalidade: art. 244º: faculdade de denúncia, que a qualquer pessoa é atribuída, relativamente a todo o crime de que tenha notícia, desde que o procedimento respectivo não dependa de queixa ou de acusação particular. - art. 244º (denúncia facultativa) “Qualquer pessoa que tiver notícia de um crime pode denunciá-lo ao Ministério Público, a outra autoridade judiciária ou aos órgãos de polícia criminal, salvo se o procedimento respectivo depender de queixa ou de acusação particular” - A consagração do princípio da legalidade põe a justiça penal a coberto de suspeitas e de tentações de parcialidade e arbítrio. Se fosse possível aos órgãos públicos encarregados do procedimento penal apreciar da “conveniência” do seu exercício e omiti-lo por “inoportuno”, avolumar-se-ia o perigo do aparecimento de influências externas, da ordem mais diversa, na administração da justiça penal e, mesmo quando tais influências não lograssem impor-se, o perigo de diminuir (ou desaparecer) a confiança da comunidade na incondicional objectividade daquela administração. - O princípio da legalidade conexiona-se com a igualdade na aplicação do direito, havendo directa incidência jurídico – constitucional (art. 13º CRP). O princípio da legalidade contém a directiva, dirigida ao titular público da promoção processual, de que exerça os poderes que a lei lhe confere sem atentar no estado ou nas qualidades da pessoa ou nos interesses de terceiros – ressalvadas, naturalmente, as limitações derivadas dos pressupostos processuais ou de condições de aplicabilidade do próprio direito penal substantivo. Deste modo, o princípio da legalidade depende e potencia o efeito de prevenção geral que está ligado à pena e a toda a administração da justiça penal. - art. 280º: arquivamento em caso de dispensa da pena - art. 281º: suspensão provisória do processo - art. 283º: acusação pelo Ministério Público » Pode acontecer que, em vez do despacho de acusação, ocorra arquivamento em caso de dispensa da pena (art. 280º) ou suspensão provisória do processo (art. 281º). Quer dizer, não obstante o Ministério Público ter recolhido durante o inquérito, indícios suficientes de se ter verificado crime e de quem foi o seu agente (art. 283º), ele não submete a infracção a julgamento: arquiva ou suspende provisoriamente o processo, o que significa também que o conflito jurídico – penal é solucionado fora do sistema formal de aplicação da justiça penal, já que a decisão tomada nos termos do art. 280º, bem como a que dá aplicação ao art. 281º, não é susceptível de impugnação (arts. 280º/3 e 281º/5). Estas disposições, no âmbito da pequena e média criminalidade permitem ao Ministério Público a omissão da acusação em casos e sob pressupostos legalmente determinados e em função do programa político – criminal subjacente ao direito penal substantivo. Para Figueiredo Dias, a intervenção do sistema formal de controlo deve estritamente limitar-se pelas máximas da mais lata diversão e da menor intervenção socialmente suportáveis, o que por sua vez radica na ideia matriz de que função de toda a intervenção penal só pode ser a protecção de bens jurídicos ou a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violada. - O direito processual penal português acolhe o princípio da legalidade da iniciativa e prossecução processual como ponto de partida. - A fiscalização e controlo da decisão do Ministério Público conexiona-se com dois mecanismos essenciais: a) o controlo judicial da decisão do Ministério Público desencadeado pelo arguido quando requer a abertura da instrução relativamente a factos pelos quais tenha deduzido acusação ou pelo requerimento do assistente relativamente a factos pelos quais o Ministério Público não tenha deduzido acusação (art. 286º/1 CPP) b) a intervenção hierárquica quando é proferido um despacho de arquivamento e a instrução não é requerida (art. 278º CPP) III – O princípio da acusação (ver princípios no dic.)
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- A imparcialidade e objectividade, conjuntamente com a independência são condições indispensáveis de uma autêntica decisão judicial. Estas condições só estarão asseguradas quando a entidade julgadora não tenha também funções de investigação preliminar e acusação das infracções, mas antes possa apenas investigar e julgar dentro dos limites que lhe são postos por uma acusação fundamentada e deduzida por um órgão diferenciado (em regra o MP ou um juiz de instrução). É precisamente com este conteúdo que se afirma o princípio da acusação, princípio caracterizador do nosso direito penal actual e com assento no art. 32.º/5 da CRP. - Um processo de tipo acusatório (seja ele puro, como o inglês clássico, ou esteja integrado por um princípio da investigação), supõe – para além do princípio da acusação – a aceitação da participação constitutiva dos sujeitos processuais na declaração do direito do caso: a) o tribunal a quem cabe o julgamento não pode, por sua iniciativa, começar uma investigação tendente ao esclarecimento de um crime e à determinação dos seus agentes: isto tem de ter lugar numa fase cuja iniciativa e direcção caiba a uma entidade diferente. Esta implicação do princípio da acusação é acolhida no artigo 262º/1, alusivo ao inquérito: “O inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher provas, em ordem à decisão sobre a acusação” A fase de inquérito inicia-se quando o MP adquire a notícia do crime (arts. 241 e 262º/2) cabendo também a esta magistratura (MP)a direcção do inquérito (art. 263º/1), bem como o encerramento deste, através do arquivamento ou da dedução da acusação (art. 276º/1). De acordo com o art. 288º/1, “A direcção da instrução compete a um juiz de instrução, assistido por órgãos de polícia criminal”. Esta fase, a ter lugar, ocorre num momento anterior ao julgamento, o que impõe, por referência às aludidas razões de imparcialidade e objectividade, que uma entidade distinta proceda ao julgamento (art. 40º CPP) já que a decisão tomada a final por aquele juiz contende directamente com o objecto do processo (arts. 358º e 359º) - art. 40º (Impedimento por participação em processo) » Para o CPP, cabe ao MP a investigação processual preliminar, bem como a dedução da acusação. - Para a concretização efectiva do princípio da acusação é indiferente que a direcção desta fase caiba ao MP ou a um juiz de instrução – ambos são entidades distintas do juiz de julgamento. De acordo com os artigos 32º/5, 202º, 203º e 222, a repartição de competências que o princípio da acusação pressupõe há-de realizar-se entre o juiz e o MP e não entre o juiz de julgamento e o juiz de instrução. b) A dedução da acusação é pressuposto de toda a actividade jurisdicional de investigação, conhecimento e decisão. Ela afirma publicamente que sobre alguém recai uma suspeita tão forte de responsabilidade por um crime que impõe uma decisão judicial; é a afirmação pública e solene de que a comunidade jurídica chama um seu membro à responsabilidade. - O juiz julga e decide sobre uma infracção apenas quando esta lhe é previamente acusada pelo Ministério Público (art. 283º) ou, excepcionalmente, pelo assistente (crimes particulares em sentido estrito – art. 285º/1). De todo o modo, tratar-se-á sempre de uma entidade distinta do juiz de julgamento. c) A acusação define e fixa, perante o tribunal, o objecto do processo. Segundo o princípio da acusação, a actividade cognitiva e decisória do tribunal está estritamente limitada pelo objecto da acusação. Deve afirmar-se que objecto do processo penal é o objecto da acusação, sendo este que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal e a extensão do caso julgado. É a este efeito que se chama a vinculação temática do tribunal e é nele que se consubstanciam os princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consumação do objecto do processo penal.
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O objecto do processo deve manter-se o mesmo da acusação ao trânsito em julgado na sua totalidade (unitária e indivisivelmente) e – mesmo quando o não tenha sido – deve considerar-se decidido. A vinculação temática do tribunal, implicada no princípio da acusação constitui a pedra angular de um efectivo e consistente direito de defesa do arguido, que assim se vê protegido contra arbitrários alargamentos da actividade cognitória e decisória do tribunal e assegura os seus direitos de contraditoriedade e audiência; também só assim o Estado pode ter a esperança de punir só os verdadeiros culpados. - art. 1, nº 1, al. f) alteração substancial dos factos (conexiona-se com o objecto do processo) - Embora a acusação do Ministério Público ou do assistente (tratando-se de crimes particulares em sentido estrito) vincule tematicamente o tribunal (arts. 283º, nº 3 e 359º, nº 1), não cabe exclusivamente aquela acusação tal vinculação. Esta vinculação ocorrerá também por via do requerimento para abertura da instrução, como resulta dos artigos 287º/3, 303º/3, 309º/1, 359º/1 e 379º/1, al. b). & 6 – Princípios relativos à prossecução processual I – O princípio da investigação - Com o princípio da investigação pretende-se traduzir o poder – dever que ao tribunal incumbe de esclarecer e instruir autonomamente , mesmo para além das contribuições da acusação e da defesa , o “facto” sujeito a julgamento, criando aquele mesmo as bases necessárias à sua decisão. - princípio “instrutório” ou “inquisitório” = princípio da investigação - O princípio da investigação dirige-se, primariamente, ao conseguimento das bases da decisão e, portanto, à matéria das provas, por isso, também se pode designá-lo correctamente por princípio da verdade material. - O princípio da investigação é tratado dentro dos princípios relativos à prova. II – O princípio da contraditoriedade - Cabendo ao juiz penal (nos termos do princípio da investigação) cuidar, em último termo, do conseguimento (da obtenção) das bases necessárias à sua decisão, então, ele deve ouvir quer a acusação quer a defesa. É este o sentido e conteúdo do princípio do contraditório. - Toda a prossecução processual deve cumprir-se de modo a fazer ressaltar não só as razões da acusação, mas também as da defesa. O juiz penal não tem de permanecer passivo a ouvir o debate que perante ele se desenrola. Ele deve ouvir todo o participante processual – o arguido, o defenso, o assistente, a testemunha, o perito – relativamente ao qual deva tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte. - art. 32º, nº 5 CRP consagra expressamente o princípio do contraditório art. 327º, nº 1 refere-se, de forma expressa e acabada à fase do julgamento. - À luz do princípio do contraditório devem ser compreendidas as disposições contidas nos artigos 321º/3, 355º/2 e 360º/1 e 2. - O princípio do contraditório é também assumido de forma expressa na fase da instrução: art. 298º CPP …”por forma oral e contraditória”…(cfr. ainda art. 301º/2 CPP) - Fase do inquérito: escrita e secreta, havendo lugar ao princípio do contraditório: art. 61º, nº 1, als. a), b) e f). - art. 69º, nº 2, al. a) o princípio do contraditório estende-se de forma expressa ao assistente » O processo penal português não é ab initio totalmente contraditório (não se verifica a extensão total do contraditório ao inquérito).
Para F. Dias, a existência de uma fase inicial em que oficialmente se investigue uma notícia do crime, sem participação contraditória do sujeito, se bem que aparentemente protectora dos direitos fundamentais dos cidadãos, pode vir a prejudicar, tanto o interesse público na repressão da criminalidade,
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como o interesse do arguido no seu bom nome e reputação e em que a sua paz jurídica não seja posta em causa senão em face de uma suspeita com um mínimo razoável de fundamento. - O princípio do contraditório conexiona-se com a oportunidade conferida a todo o participante processual de influir, através da sua audição pelo tribunal, no decurso do processo. III – O princípio da suficiência e as questões prejudiciais - art. 7º CPP: princípio da suficiência. - O processo penal é, em princípio, lugar adequado ao conhecimento de todas as questões cuja solução se revele necessária à decisão a tomar. No iter (iter = caminho, método) que conduz a este decisão podem surgir questões de diversa natureza (penal, civil, administrativa…) cuja resolução condiciona o ulterior desenvolvimento do iter. A lei dá competência ao juiz penal para delas conhecer, o que revela a sua intenção primacial de considerar que o processo penal a si mesmo se basta, que é auto – suficiente, o que traduz a consagração do princípio da suficiência: art. 7º CPP O fundamento do princípio da suficiência é o seguinte: se não se contivesse dentro dos mais apertados limites a possibilidade de o processo penal ser sustido ou interrompido, pelo simples surgimento nele de uma questão (penal, ou sobretudo, não penal) susceptível de uma cognição judicial autónoma, pôr-se-iam em sério risco as exigências compreensíveis e relevantíssimas, de concentração processual ou de continuidade do processo penal e permitir-se-ia que, por este modo, se levantassem indirectamente obstáculos ao exercício daquele processo. O tema da “suficiência” remete-nos para o das questões prejudiciais em processo penal. Questões prejudiciais são aquelas que, possuindo objecto – ou até natureza – diferente do da questão principal do processo em que surgem, e sendo susceptíveis de constituírem objecto de um processo autónomo, são de resolução prévia indispensável para se conhecer em definitivo da questão principal, dependendo o sentido deste conhecimento da solução que lhes for dada. - No plano processual, o que importa à qualificação conceitual de uma questão como prejudicial é, apenas, que ela constitua: a) um antecedente jurídico concreto da decisão da questão principal, por postular que ela se resolva antes da decisão final da questão principal; b) uma questão autónoma, quer no seu objecto, quer mesmo na sua natureza; por isso, o problema jurídico, nela implícito seria susceptível de constituir objecto próprio de um processo independente; c) uma questão necessária à decisão da questão principal, uma vez que o sentido da sua resolução é elemento condicionante do conhecimento e decisão da questão principal. Exemplos: Costumam distinguir-se, relativamente à doutrina do processo penal, três grupos ou espécies de questões prejudiciais: a) as questões prejudiciais não penais em processo penal (ex. a relativa à propriedade de uma coisa, objecto de um eventual crime de furto – questão prejudicial civil; dentro deste grupo há que dar particular atenção às questões prejudiciais constitucionais em processo penal (art. 280º CRP). Trata-se aqui de uma prejudicialidade conexionada com a legitimidade constitucional (e, portanto, validade) da própria lei aplicável (a subsumir no conceito geral de questão prejudicial). b) as questões prejudiciais penais em processo não penal (ex. a atinente à falsificação criminosa de um escrito com que se pretende fundar legalmente uma acção civil) c) as questões prejudiciais penais em processo penal (ex. a de saber se é criminoso um certo facto ofensivo da honra e consideração de outrem – art. 180º/1 CP) AA) Se o princípio da suficiência vigorar sem qualquer limitação, resultará daí que a existência de uma questão prejudicial em processo penal não suscita nenhum problema específico: será sempre o tribunal penal – isto é, o tribunal da questão principal – o competente para conhecer da questão prejudicial e decidi-la em vista da resolução da questão principal. É a tese doutrinalmente chamada do conhecimento obrigatório de todas as questões prejudiciais pelo tribunal penal, consignado no princípio “o juiz da acção deve ser o juiz da excepção”.
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Materialmente pode ela basear-se na exigência de que não se suscitam obstáculos à concentração e continuidade do processo penal, como ainda na intenção primária de verdade material. O seu único limite residirá na necessidade de respeito pela força de caso julgado de que se encontre já revestida a decisão da questão prejudicial pelo tribunal especificamente competente para ela. É o sistema para que tende a legislação germânica, onde mal se poderá falar, com fundamento, de um específico problema de prejudicialidade em processo penal. BB) Nos antípodas estará a tese da devolução obrigatória da questão prejudicial, pelo tribunal penal, para o tribunal para ela especificamente competente. Mas não é para uma tal tese que hoje se inclina a generalidade das legislações. Exemplos: 1) o relevo da questão da propriedade de uma coisa móvel, no crime de furto, pode ser anulado pela suposição (mesmo que falsa) do agente de que a coisa era sua; 2) o facto de uma pessoa não ser considerada, pelo direito administrativo, como funcionário público pode ser irrelevante em face do mais lato conceito de “funcionário” do art. 375 CP » O que impressiona aqui não é tanto uma eventual “contradição de julgados” entre o tribunal não penal e o tribunal penal, mas a inutilidade a que ficaria votada a devolução, incapaz de compensar os inconvenientes de que sempre advirão de uma descontinuidade do processo penal. - art. 7º CPP: princípio da suficiência: tem o seu bom fundamento nas exigências de concentração e continuidade processual penal, pelo que deve ser defendido na medida do possível. Em suma, o princípio da suficiência deve valer sem qualquer limitação (F. Dias) - O problemas dos limites ao princípio da suficiência em processo penal surge só relativamente às questões prejudiciais não penais em processo penal, supondo que elas não tenham sido já decididas ou estejam pendentes em outro processo. É para estas questões que o art. 7º CPP dita a regulamentação subsumível ao esquema geral de um sistema de devolução facultativa ou suficiência discricionária. O art. 7º/2 faz depender a devolução de uma questão prejudicial não penal surgida em processo penal da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: 1º - que a questão seja de resolução necessária “para se conhecer da existência de um crime” A doutrina entende o requisito como impondo que a questão prejudicial implique o conhecimento de um elemento constitutivo do crime e, portanto, de um elemento que decida da condenação ou absolvição do arguido. 2º - que o tribunal verifique não poder ser a questão “convenientemente resolvida no processo penal” A questão tem de apresentar-se como “séria” no sentido de exigir um específico conhecimento sobre ela; todavia, sem que esta “necessidade” e “seriedade” da questão tenha de conformar um requisito autónomo de devolução. Uma vez valorada a questão, o juiz só deverá deixar de ordenar a devolução quando, não obstante, “o processo (penal) ofereça prova segura de todos os elementos da infracção” Acórdão do STJ, de 25-11-70). É através do requisito da conveniência que a lei põe na mão do juiz penal um amplo poder discricionário no que respeita à devolução da questão prejudicial (embora não haja discricionaridade livre ou desvinculada) 3º - o art. 7º/3 faz uma exigência formal relativamente ao momento da suspensão do processo para decisão da questão prejudicial no tribunal competente: o tribunal ordena oficiosamente e o MP, o assistente e o arguido requerem a suspensão do processo pós a acusação ou o requerimento para a abertura da instrução. » O juiz pode ordenar de ofício, a devolução e consequente suspensão do processo penal – sem que o MP, o assistente e o arguido estejam inibidos de a requerer; toda a preocupação da lei é a de assegurar que, com a devolução, se cause o menos dano possível ao princípio da suficiência, a de evitar que a devolução crie obstáculos ao exercício do processo penal.
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- art. 7º/4 “O tribunal marca o prazo da suspensão, que pode ser prorrogado até um ano…Esgotado o prazo sem que a questão prejudicial tenha sido resolvida…a questão é decidida no processo penal.” IV – O princípio da concentração O princípio da concentração do processo penal exige uma prossecução, tanto quanto possível unitária e continuada de todos os termos e actos processuais, devendo o complexo destes, em todas as fases do processo, desenvolver-se na medida do possível concentradamente, seja no espaço, seja no tempo. O princípio enforma todo o decurso ou prossecução do processo penal e é, em geral, fundado pela necessidade de que se não suscitem obstáculos ou impedimentos ao exercício do processo. O princípio ganha o seu maior e autónomo relevo no que toca à audiência de discussão e julgamento, ligando-se aí aos princípios da forma enquanto corolário dos princípios da oralidade e da imediação. Porque este princípio da imediação pode também ser visto como máxima instrumental do princípio da investigação ou da “verdade material”, a concentração ganha ainda significado dentro dos próprios princípios da prova. Num processo escrito, o conseguimento, pelo tribunal, das bases da sua decisão será logrado através de uma sequência de termos protocolares, de contributos e declarações escritas. A oralidade e a imediação exigem, pelo contrário, uma audiência unitária e continuada em que tenha lugar a apreciação conjunta e esgotante de toda a matéria do processo. Daqui a concentração espacial exigindo que a audiência se desenvolva por inteiro num mesmo local, apropriado ao fim que com ela se pretende obter e onde devem ser trazidos todos os participantes processuais (a sala de audiência); e a concentração temporal exigindo que, uma vez iniciada a audiência, ela decorra, em continuidade até final. - art. 328º (Continuidade da audiência). Consagra claramente o princípio da concentração no que toca à sua manifestação temporal de continuidade da audiência. - Quanto à questão espacial (falta um texto expresso sobre o ponto): subentende-se no art. 355º CPP - arts. 328º, nº 2 e 3: são referidas as situações em que pode ocorrer a interrupção da audiência - Os intervalos limitativos da continuidade da audiência podem ter lugar sob a forma de: a) simples interrupções b) verdadeiros adiamentos, se a simples interrupção não for bastante para remover o obstáculo (art. 328, nº 2 e 3) » À interrupção ou ao adiamento por período não superior a 8 dias, o CPP liga o efeito de continuação da audiência – art. 328º/4 - art. 328º/6 “O adiamento não pode exceder trinta dias. Se não for possível retomar a audiência neste prazo, perde eficácia a produção de prova já realizada” » Interrupção ≠ adiamento * Interrupção: após a interrupção, a audiência continua *Adiamento: após o adiamento, a audiência recomeça & 7 – Princípios relativos à prova I – O princípio da investigação ou da verdade material Perante o acto inicial de promoção de qualquer espécie de processo dão-se, fundamentalmente, duas possibilidades opostas de construir a respectiva prossecução processual: a) numa delas, as partes disporão do processo (tal qual dispõem da respectiva relação jurídica material) como coisa ou negócio seu; b) na outra será o tribunal a investigar, independentemente das contribuições dadas pelas partes, o facto sujeito a julgamento e, assim, a construir autonomamente as bases da sua decisão. Deste modo, se opõem dois princípios (dizendo sobretudo respeito à matéria de adquirir para o processo material probatório) que não deixam de condicionar toda a prossecução processual: a) de um lado, o princípio dispositivo, de contradição ou discussão, ou da verdade formal
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b) do outro, o princípio da investigação, instrutório, inquisitório ou da verdade material »» Ser um processo presidido pelo princípio da contradição ou discussão significa um duelo das partes na presença e sob a arbitragem do juiz. O processo será aqui, antes de tudo, discussão sobre a existência ou inexistência de uma pretensão feita valer judicialmente pelo autor. Ao juiz cabe apenas zelar pela observância das normas que a pugna tem de respeitar e proclamar o resultado desta. De uma tal concepção derivam certas consequências: a) É às partes – e só a elas – que compete a adução do material de facto que há-de servir de base à decisão. O autor e o réu proporcionarão ao juiz, mediante as suas afirmações de facto e as provas que carrearam, a base factual da sua decisão, sem que àquele seja permitido indagar de modo autónomo sobre a veracidade do facto trazido a julgamento. Por isso, na sua decisão, o juiz só poderá ter em conta os factos alegados pelas partes e as provas por ela produzidas. b) na lógica desta consequência está a circunstância de recair sobre as partes todo o risco da condução do processo, através dos ónus, que sobre elas incidem, de afirmar, contradizer e impugnar: é a tudo isto que se chama o princípio da auto – responsabilidade probatória das partes. A sentença procura e declara a verdade formal (intraprocessual). c) Com o princípio de contradição ou discussão, vem a combinar-se o princípio do dispositivo. Sendo objecto do processo uma relação jurídica material disponível, às partes pertence o direito de disporem do objecto do processo, quer pondo-lhe fim através da desistência da instância, quer determinando o próprio conteúdo da sentença de mérito através do pedido, da confissão, da desistência do pedido e da transacção. 2 – É completamente diversa da que ficou exposta a construção do processo integrado pelo princípio da investigação, a saber: a) a adução e o esclarecimento do material de facto não pertence aqui exclusivamente às partes, mas em último termo ao juiz: é sobre ele que recai o ónus de investigar e esclarecer oficiosamente o facto submetido a julgamento (independenetemente das contribuições das partes). Esta consequência do princípio da investigação encontra-se consagrada, com carácter geral, no art. 340º CPP e, a propósito de problemas particulares, nos artigos 154º, 164º 174º 267º 288º 290º 354º, etc.. Não há impedimentos ou limitações da actividade probatória do MP, do assistente ou do arguido; o tribunal faz total aproveitamento desta actividade probatória. A actividade investigatória do tribunal não é limitada pelo material de facto aduzido pelos outros sujeitos processuais, antes se estende autonomamente a todas as circunstâncias que devam reputar-se relevantes. Exemplo: A acusado de um crime de homicídio doloso, alega provocação da vítima e acção em legítima defesa, justificativa do facto. O tribunal não tem de indagar, autónoma e exaustivamente, da existência de causas justificativas a propósito de qualquer crime; mas tem de o fazer não só quando tal lhe seja alegado, mas sempre que surja a mínima suspeita da possível existência de uma qualquer daquelas causas. b) Dado o dever de investigação judicial autónoma da verdade, logo se compreende que não impenda sobre a acusação e a defesa, em processo penal, qualquer ónus de afirmar, contradizer e impugnar, nem se atribui qualquer eficácia à não apresentação de certos factos nem ao “acordo”, expresso ou tácito, que se formaria sobre os factos não contraditos; a adicionar, o tribunal não tem de limitar a sua convicção aos meios de prova apresentados pelos interessados. » Diz-se que, em processo penal está em causa, não a “verdade formal”, mas a “verdade material”, que há-de ser tomada em duplo sentido: 1) no sentido de uma verdade subtraída à influência que, através do seu comportamento processual, a acusação e a defesa queiram exercer sobre ela;
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2) no sentido de uma verdade que, não sendo “absoluta” ou “ontológica”, há-de ser, antes de tudo, uma verdade judicial, prática e, sobretudo, não uma verdade obtida a todo o preço, mas processualmente válida. Exemplo: não pode falar-se de verdade material se a confissão de que A matou B foi extorquida por artifício ou tortura (mesmo que A tenha morto B!) »»» toda a verdade autêntica passa pela liberdade da pessoa, pelo que a sua obtenção à custa da dignidade do homem é impensável. c) Em processo penal não vale o princípio de discussão nem há lugar para o princípio dispositivo; » Há indisponibilidade do objecto do processo penal e há impossibilidade de desistência da acusação pública, de acordos eficazes entre a acusação e a defesa e de limitações postas ao tribunal na apreciação jurídica do caso submetido a julgamento. - art. 360º CPP (alegações orais): * pode o MP pedir a absolvição do arguido e o tribunal condená-lo * pode a defesa, considerando provado o crime, pedir a condenação em uma pena leve e o tribunal absolver o arguido. 3 – O princípio da investigação vale no direito processual penal português vigente sem excepções ou mesmo limitações de tomo importando, no entanto, destacar o seu carácter subsidiário, de que são expressão acabada as regras de inquirição de testemunhas (art. 384º CPP) * a testemunha é interrogada por quem a indicou, sendo depois sujeita a contra – interrogatório; * os juízes e os jurados formulam à testemunha as perguntas que entenderem necessárias para o esclarecimento do depoimento prestado e para a boa decisão da causa. E o princípio vale tanto para o juiz, na instrução e no julgamento, como para o MP. - Ao princípio da acusação pertencerá delinear o thema decidendum e o thema probandum Thema decidenduum = tema ou matéria a decidir Thema probanduum = tema ou matéria a provar - Ao princípio da investigação pertencerá conferir ao tribunal o domínio daqueles temas assim delineados, quer no que toca à adução do material de facto, quer no que toca às provas. - o art. 125º determina que “são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei” A legalidade dos meios de prova, bem como as regras gerais de produção da prova e as chamadas “proibições de prova” são condições de validade processual da prova e, por isso mesmo, critérios da própria verdade material. - art. 514 CPC (Factos que não carecem de alegação ou de prova) - Também em processo penal há factos necessitados e não necessitados de prova » Como princípios instrumentais do da investigação surgem-nos: a) princípio da oralidade b) princípio da imediação Efectivamente, uma investigação e um esclarecimento do facto sujeito a julgamento que se queiram totais e completos, só poderão ser alcançados pelo juiz se, por um lado, ele não estiver ligado ao conteúdo dos autos e protocolos escritos e se, por outro lado, puder adquirir uma impressão pessoal do arguido e dos meios de prova. II – O princípio da livre apreciação da prova (ou sistema da “prova livre”) 1 – Com a produção da prova em julgamento visa-se oferecer ao tribunal as condições necessárias para que este forme a sua convicção sobre a existência ou inexistência dos factos e situações que relevam para a sentença.
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» No direito processual penal português vigente, o princípio da livre apreciação da prova está plasmado expressamente no art. 127º CPP “Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente” - O princípio da livre apreciação da prova ganha relevo para a decisão da causa que se segue à audiência de julgamento e vale para todo o decurso do processo penal e para todos os órgãos de administração da justiça penal, mesmo para o MP, o juiz de instrução e para os órgãos seus auxiliares. Assim o consagra o art. 127º CPP ao referir-se à “livre convicção (não só do juiz, mas) da entidade competente” - A livre apreciação da prova, a valoração desta segundo a livre convicção do juiz significa, negativamente, a ausência de critérios legais predeterminados do valor a atribuir à prova. - A apreciação da prova é discricionária e os seus limites não podem ser licitamente ultrapassados: a liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a “verdade material” -, de tal modo que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral, susceptível de motivação e controlo. A consequência mais relevante da aceitação destes limites à discricionaridade estará em que, sempre que tais limites se mostrem violados, será a matéria susceptível de recurso ainda que o tribunal ad quem conheça, em princípio, matéria de direito: solução acolhida expressamente no art. 410º, nº 2 e que a doutrina denomina de “recurso de revista ampliada” - Em processo penal busca-se a verdade “material”. O juiz procura a verdade prático – jurídica. Uma das funções primaciais de toda a sentença (maxime da penal) é a de convencer os interessados do bom fundamento da decisão, pelo que a convicção do juiz há-de ser, além de uma convicção pessoal, uma convicção objectivável e motivável, portanto, capaz de impor-se aos outros. Uma tal convicção existirá quando e só quando o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável. » As comprovações judiciais devem ser sempre motiváveis, exigência que decorre expressamente dos artigos 365º, nº 3 e 374º, nº 2. - O princípio da livre apreciação da prova e da livre convicção do juiz vale em geral, no nosso direito processual penal, para todo o domínio da prova produzida. Todavia: a) Relativamente à prova testemunhal (art. 128º e ss.) o princípio vale sem quaisquer limitações, excepção feita ao testemunho de ouvir dizer (art. 129º) b) Relativamente às declarações do arguido, quanto aos factos que lhe são imputados, teremos de distinguir consoante ele negue os factos que lhe são imputados, os confesse ou nada diga sobre eles. A negação fica submetida por inteiro ao princípio da livre apreciação e convicção; princípio que vale em matéria de confissão apenas quando o crime for punível com pena de prisão superior a 5 anos (artigo 344º, nº 3, al. c) e nº 4) - art. 344º, nº 3: limitação ao princípio da livre apreciação da prova. Relativamente ao silêncio do arguido, encontramos na lei uma verdadeira limitação à livre apreciação e convicção, na medida em que aquele nunca pode desfavorecer o arguido: art. 61º/1, al. c), 343º/1 e 345º/1 c) Em matéria de prova pericial, a lei (art. 163º/1) determina que o juízo técnico, científico ou artístico se presume subtraído à livre apreciação do julgador, o que traduz uma excepção ao princípio consagrado no art. 127º. O julgador, embora mantendo inteira liberdade de apreciação da base de facto pressuposta pelo perito – e, contrariando-a pode furtar validade ao parecer – só pode divergir do juízo contido no parecer do perito, fundamentando devidamente a divergência (art. 163º/2) se puder fazer uma apreciação também técnica, científica ou artística, ou se se tratar de uma caso inequívoco de erro.
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d) Quanto a factos constantes de documento, vale o princípio da livre apreciação da prova, mesmo se se tratar de um documento autêntico ou autenticado (art. 169º), podendo o tribunal, em qualquer caso, declarar um documento junto dos autos como falso (art. 170º). III – O princípio in dubio pro reo - Em processo civil, de acordo com o princípio de contradição e discussão, é às partes que compete a produção dos meios de prova necessários à decisão, como é sobre elas que recai todo o risco da condução do processo em matéria probatória. Daí que, se qualquer delas não produzir os meios de prova necessários à fundamentação das suas afirmações, recaiam sobre si as consequências desvantajosas respectivas: é o princípio do ónus da prova. Diferentemente se passam as coisas em processo penal, onde compete, em último termo ao juiz, oficiosamente, o dever de instruir e esclarecer o facto sujeito a julgamento: não existe aqui, por conseguinte, qualquer verdadeiro ónus da prova que recaia sobre o acusador ou o arguido. - Em direito processual penal não existe o chamado ónus da prova formal, segundo o qual as partes teriam o dever de produzir as provas necessárias a ancorar as suas afirmações de facto, sob pena de não verem os factos respectivos ser tidos como provados. » Alguns autores aceitam um ónus de prova material em processo penal, querendo com ele significar que, se o tribunal, mesmo através da sua actividade probatória, não lograr obter a certeza dos factos, mas antes permanecer na dúvida, terá por princípio de decidir em desfavor da acusação, absolvendo o arguido, por falta de prova. Não é exacto que uma absolvição por falta de prova constitua, em processo penal, uma decisão desfavorável à acusação, quando esta seja, como é normalmente, acusação pública (representada, em princípio pelo MP). Não é função do MP sustentar “a todo o custo” a acusação contra o arguido, mas sim auxiliar o juiz na descoberta da verdade material; não recai sobre o MP um “dever de acusação”, mas antes um “dever de objectividade”: o MP não é parte, pelo menos no sentido de que não possui um interesse necessariamente contraposto ao do arguido. Por isso é que, mais do que equívoco, acaba por ser erróneo falar de ónus da prova material a cargo do MP. A absolvição por falta de prova, em todos os casos de persistência de dúvida no espírito do tribunal, não é consequência de qualquer ónus da prova, mas sim da intervenção do princípio in dubio pro reo. » À luz do princípio da investigação, bem se compreende que todos os factos relevantes para a decisão (quer respeitem ao facto criminoso, quer à pena) que, apesar de toda a prova recolhida, não possam ser subtraídos “à dúvida razoável” do tribunal, também não possam considerar-se como “provados”, nem possam desfavorecer a posição do arguido: um non liquet (non liquet = não está claro) na questão da prova tem de ser sempre valorado a favor do arguido. É com este sentido e conteúdo que se afirma o princípio in dubio pro reo (art. 32º/2 da CRP). » Princípio in dubio pro reo: * art. 32º/2 da CRP * art. 9º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão * art. 11º/1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem da ONU * art. 6º/2 da Convenção do Conselho da Europa - O Princípio in dubio pro reo, a “presunção de inocência” pertence aos princípios fundamentais do processo penal em qualquer Estado de Direito. - O sentido e o conteúdo do princípio in dubio pro reo encontra-se constitucionalmente fundado no princípio da presunção de inocência até ao trânsito em julgado da sentença de condenação (art. 32º/2 da CRP) e só vale, evidentemente, em relação à prova da questão de facto e já não a qualquer dúvida suscitada dentro da questão de direito: aqui, a única solução correcta residirá em escolher não o entendimento mais favorável ao arguido, mas sim aquele que, juridicamente, se reputar mais exacto.
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Relativamente ao facto sujeito a julgamento, o princípio in dubio pro reo aplica-se sem qualquer limitação e, portanto, não apenas aos elementos fundamentadores e agravantes da incriminação, mas também às custas de exclusão da ilicitude e da culpa, às condições objectivas de punibilidade, bem como às circunstâncias modificativas atenuantes e, em geral, a todas as circunstâncias relevantes em matéria de determinação da medida da pena que tenha por efeito a não aplicação da pena ao arguido ou a diminuição da pena concreta. Com excepção ao princípio in dubio pro reo (portanto, in dubio contra reum) costumam apontar-se certos tipos de crime (arts. 164º e 165º do CP) nos quais o não conseguimento da prova de certos factos ou circunstâncias actua em desfavor do arguido. Porém, não se trata aqui de “presunções de culpa” (constitucionalmente ilegítimas à luz da presunção de inocência – art. 32º/2 CRP), mas só de que em tais tipos de crime é posto a cargo do agente um certo risco pela sua conduta. - O princípio in dubio pro reo apresenta-se como o correspectivo processual do princípio da culpa, do princípio “não há pena sem culpa”. - Nos pressupostos processuais, o que está em jogo não é o interesse do arguido, mas a admissibilidade de um processo que até pode interessar àquele, para que nele demonstre a sua inocência. - O princípio in dubio pro reo é um princípio geral de processo penal, pelo que a sua violação conforma uma autêntica questão de direito que cabe, como tal, na cognição do Supremo Tribunal de Justiça e das Relações. - art. 428º/1 “As relações conhecem de facto e de direito” - É admissível, dentro de certos limites, uma condenação com base em uma comprovação alternativa dos factos. Exemplo: o juiz convence-se que o arguido cometeu um crime patrimonial, embora não consiga determinar, para além de toda a dúvida razoável, se os elementos de facto integram um furto ou um abuso de confiança. & 8 - Princípios relativos à forma I – Os princípios da forma como princípios estruturais da fase de julgamento - O princípio da publicidade e o princípio da oralidade têm o corolário mais importante no princípio da imediação. Estes princípios valem, predominantemente, para a fase de audiência e julgamento, sendo este o seu campo de eleição e o local onde tais princípios ganham o mais pleno significado. O princípio da oralidade é instrumental relativamente ao modo de assunção das provas, ligando-se por aí aos princípios da investigação e ao da livre convicção do juiz. » Pluralidade, oralidade e imediação são máximas essenciais de conformação do processo penal sob o ponto de vista da forma de obter a decisão que naquele se busca e a que tende. II – O princípio da publicidade - arts. 206º CRP e 321 CPP: as audiências dos tribunais são públicas - art. 86º (publicidade do processo e segredo de justiça). A publicidade do processo implica: art. 86º/2º: “A publicidade do processo implica, nos termos definidos pela lei e, em especial, pelos artigos seguintes, os direitos de: a) Assistência, pelo público em geral, à realização dos actos processuais; b) Narração dos actos processuais, ou reprodução dos seus termos, pelos meios de comunicação social; c) Consulta do auto e obtenção de cópias, extractos e certidões de quaisquer partes dele.” - art. 86º/1 “O processo penal é, sob pena de nulidade, público, a partir da decisão instrutória ou, se a instrução não tiver lugar, do momento em que já não pode ser requerida. O processo é público a partir do recebimento do requerimento a que se refere o art. 287.º, nº 1, alínea a), se a instrução for requerida apenas pelo arguido e este, no requerimento, não declarar que se opõe à publicidade.”
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»O processo penal desempenha uma função comunitária, que é assunto da comunidade jurídica, pelo que se compreende a sua publicidade, como forma óptima de dissipar quaisquer desconfianças que se possam suscitar sobre a independência e a imparcialidade com que é exercida a justiça penal e são tomadas as decisões. - a publicidade da audiência constitui uma garantia para toda a comunidade, além de fomentar e aguçar o sentimento jurídico dos membros da comunidade. Todavia, apesar das vantagens, aceitam-se excepções ao princípio a fim de salvaguardar a “dignidade das pessoas” e da “moral pública”, de acordo com o art. 206º da CRP e art. 87.º, nº 2 e 3. - art. 87.º, nº 3”Em caso de processo por crime sexual que tenha ofendido um menor de 16 anos, os actos processuais decorrem em regra com exclusão da publicidade” Todavia, a exclusão da publicidade não abrange a leitura da sentença. - arts. 87.º, nº 1 e 321.º, nº 3: a restrição ou exclusão da publicidade ocorrem, oficiosamente ou a requerimento do MP, do arguido ou do assistente, por despacho do juiz, devidamente fundamentado e precedido, sempre que possível, de audição contraditória dos sujeitos processuais interessados. - art. 87º, nº 6 “Não implica restrição ou exclusão da publicidade, para efeitos do disposto nos números anteriores, a proibição, pelo juiz, da assistência de menor de 18 anos ou de quem, pelo seu comportamento, puser em causa a dignidade ou a disciplina do acto” - Importa que, do princípio da publicidade, relacionado com os meios de comunicação social, não venha sensível perigo para a consistência e eficácia do direito de defesa do arguido ou da pretensão punitiva do Estado. Exige-se que sejam acautelados os interesses ligados à reserva da intimidade da vítima do crime e acautelado, também, um julgamento justo. Pretende-se evitar que, alguma comunicação social sensacionalista desencadeie campanhas emocionais ou demagógicas contra ou a favor do arguido. Os excessos na publicidade informativa do processo penal podem mesmo contribuir para a criação de um sistema informal de “justiça penal sem julgamento”, em que sofreriam irreparável dano a presunção de inocência do arguido e as suas garantias fundamentais (art. 32º, nº 1). - art. 88.º, nº 2 regula as situações em que não é autorizada a reprodução, transmissão e publicação de elementos processuais, sob pena de desobediência simples. - arts. 322º e 323 conferem amplos poderes de disciplina da audiência e direcção dos trabalhos ao presidente. III – Os princípios da oralidade e da imediação - O processo penal português passou a ser regido pelo princípio da oralidade desde o século XIX - O princípio da oralidade encontra-se hoje explicitamente em várias normas positivas, ou resultando de preceitos que supõem uma actividade processual exercida na presença dos participantes processuais e, portanto, oralmente: ex. arts. 96º, 298º, 348º, 350.º, 355.º, 360.º, 363.º e 423.º. Todavia, oralidade, não significa exclusão da escrita, no sentido de proibição de que dos actos que tenham lugar oralmente fiquem registos, protocolos ou actas a servir de, por exemplo, controlo de assunção da prova, maxime em matéria de recursos. - “Oralidade” como princípio geral do processo penal tem em vista a forma oral de atingir a decisão: o processo será dominado pelo princípio da escrita quando o juiz profere a decisão na base de actos processuais que foram produzidos por escrito (actas, protocolos, etc.); será dominada pelo princípio da oralidade quando a decisão é proferida com base numa audiência de discussão oral da matéria a considerar. - Ligado ao princípio da oralidade, deparamos com o princípio da imediação, que em geral se pode definir como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de tal modo que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da sua decisão. Também aqui, como no princípio da oralidade, o ponto de vista decisivo é o da forma de obter a decisão
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» Um dos progressos mais efectivos e estáveis na história do direito processual penal reside na aceitação dos princípios da oralidade e da imediação. Desde o momento em que se reconheceu a primacial importância da consideração da personalidade do arguido no processo penal, não mais se podia duvidar da absoluta prevalência a conferir aos princípios da oralidade e da imediação Só estes princípios permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só eles permitem avaliar o mais concretamente possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais. Só eles permitem, por último uma plena audiência destes mesmos participantes, possibilitando-lhes da melhor forma que tomem posição perante o material de facto recolhido e comparticipem na declaração do direito do caso. Observe-se também que os princípios da oralidade e da imediação se não afirmam sem limitações. A título de exemplo, há que referir que a audiência de julgamento pode ter lugar, excepcionalmente, na ausência do arguido (art. 334º) e que, também de forma excepcional, é permitida a leitura de autos e de declarações na audiência de julgamento (art. ?) Fim