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sábado, 20 de abril de 2013

Futuro da humanidade em planetas parecidos com a Terra...



Descobertos dois planetas parecidos com Terra










Astrónomos americanos anunciaram hoje ter descoberto, através de um telescópio espacial da NASA, dois planetas semelhantes à Terra e onde pode existir vida.
Segundo declarações de cientistas da NASA (Administração Nacional da Aeronáutica e do Espaço) à revista Science, dois dos cinco planetas que orbitam numa estrela semelhante ao Sol chamada Kepler-62 são de zona habitável, nem muito quente nem muito frio e, possivelmente, com água.
"Estes são os planetas que nós encontrámos mais parecidos com a Terra", disse Justin Crepp, professor assistente de física na Universidade Notre Dame.
Os dois planetas são ligeiramente maiores do que o nosso, cada um deles com um raio de 1,41 e 1,61 vezes o raio da Terra.
Os cientistas ainda não sabem informar se as suas superfícies são rochosas ou líquidas, ou se a sua atmosfera permite vida.
Contudo, o estudo indica que com a sua localização e tamanho "poderiam plausivelmente ser constituídos de compostos condensáveis e sólidos, tanto em terreno seco, numa super-Terra rochosa, como se for composto com uma quantidade significativa de água".
Os planetas foram detetados quando a sua estrela escurecia à sua passagem, processo conhecido como "trânsito".
Justin Crepp viu pela primeira vez um ponto próximo a Kepler-62 há cerca de um ano, e estudou os movimentos dos sistemas durante meses, para confirmar a descoberta.
No final de 2011, a NASA confirmou pela primeira vez um planeta com uma zona habitável fora do nosso sistema solar, Kepler 22b, que gira em torno da sua estrela a cerca de 600 anos-luz de distância.
No entanto, o seu grande tamanho, 2,4 vezes superior à Terra, deixou algumas dúvidas sobre se o planeta é rochoso, gasoso ou líquido.
Kepler é a primeira missão da NASA à procura de planetas como a Terra que orbitem em sóis similares ao nosso.
Esta missão está equipada com a maior câmara enviada para o espaço, em busca de planetas semelhantes à Terra, incluindo estrelas, orbitando em zona quente, habitável e onde possa existir água na superfície do planeta.



Lusa/SOL
19 de Abril, 2013


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KEPLER 62 UM SISTEMA SOLAR COM DUAS TERRAS?

A 1.200 anos-luz de distância da Terra, cinco planetas orbitam uma estrela semelhante ao Sol, na constelação de Lyra, dois dos quais estão fortuitamente localizados na zona habitável, região que permite a existência de água no estado líquido na sua superfície, uma condição necessária para a vida como a conhecemos.
O futuro da humanidade pode passar por colonizar outros planetas, apesar das distâncias serem nos nossos dias uma pura ficção em serem atingidas, se não vejamos, a velocidade da luz ronda os 300 mil quilómetros por segundo, quando a maior velocidade atingida por um ser humano em 26 de Maio de 1969, pelos astronautas da Apolo 10, ao realizarem uma das manobras de reentrada à Terra mais difíceis da história espacial, guiada por um computador pré-histórico, a nave chegou quase aos 40 mil quilómetros por "hora", sendo esta a maior velocidade atingida pelo homem, equivalente ao Mach 36, até hoje.
O astrofísico Stephen Hawking não tem dúvidas: "A raça humana terá de colonizar o espaço para sobreviver nos próximos 200 anos".
Autor do best-seller de literatura científica intitulado "Uma Breve História do Tempo", que traça o cenário do futuro: "Será difícil evitar uma catástrofe no planeta Terra nos próximos cem anos, sem falar dos próximos mil anos ou dos próximos milhões de anos". O cientista lembrou "outras ocasiões do passado em que a sobrevivência humana foi difícil", mencionando em especial "a famosa crise dos mísseis, em 1963, em Cuba".
O aumento da população mundial e os recursos limitados da Terra ameaçarão cada vez mais a espécie humana, afirma o cientista, que é um dos nomes mais respeitados na astrofísica, "Se somos os únicos seres inteligentes da galáxia devemos garantir que sobrevivemos e continuamos".
Viajar no espaço tornou-se numa questão política
A opinião de Stephen Hawking é partilhada pelo Professor Orfeu Bertolami, do Instituo Superior Técnico, em Lisboa, "A colonização do espaço poderá ser uma solução a longo prazo", afirmou ao Expresso o investigador, lembrando contudo que, "com a tecnologia actual, é impossível colocar um homem em Marte".
De acordo com Bertolami, a "propulsão nuclear" poderá ser a chave para o futuro das viagens espaciais.
Contra, está o facto de "o espaço se ter transformado numa discussão política", garante, "Só quando houver convergência dos interesses económicos com a necessidade absoluta de irmos para o espaço é que as coisas começam a andar".

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20.04.2013

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Trinta e nove anos...


Confissão

Trinta e nove anos. Meia vida passada, se isto se for aguentando, tomba daqui, tomba dali. E tudo por fazer! Comecei tarde, sem nenhuma preparação, e com defeitos horríveis, que tenho ido limando pouco a pouco, mas que resistem como fortalezas. 
Nasci afirmativo demais, puritano demais, uno demais, apesar duma timidez confrangedora, duma aceitação natural da volúpia e duma dispersão aflitiva a cada instante. Tenho medo dum polícia e sou capaz de enfrentar um exército; passo a vida a praticar virtudes que proíbo terminantemente aos outros; escrevo um poema, a dar uma consulta. 
De maneira que nunca consegui encontrar aquele equilíbrio criador onde julgo existir o pomar das grandes obras. Debato-me entre forças contraditórias, e ao cabo de cada livro sinto-me insatisfeito e culpado como um pecador que não cumpriu bem a sua penitência. 
Não tenho ambições fora da arte, e, dentro dela, só desejo conquistar a glória de a ter servido humilde e totalmente; mas não consegui ainda dar-lhe tudo, jogar a vida e a morte por ela. Para isso era preciso calcar aos pés o homem civil que sou, e não posso. Necessito de ter as minhas contas em dia como qualquer mortal honrado, e afligem-me os assuntos do mundo como casos pessoais. Também tenho afectos. E a trama de deveres e apegos, embora redima um homem do seu egoísmo nativo, rouba-lhe força criadora. Abandono tudo para correr a casa dum amigo que está com dor de dentes, e passo uma noite em claro porque operei um doente, e ele pode ter uma hemorragia. 
Mas a minha fraqueza maior é não poder desprezar ninguém, mesmo os próprios inimigos. São meus semelhantes, apesar de tudo, e eu não consigo descrer do homem, seja ele como for. Em vez de os esquecer, trago-os no pensamento. Sofro por eles. A minha grande alegria é admirar os outros, e procuro encontrar em cada um as linhas positivas do seu caminho. Afinal somos todos elos de uma grande corrente, e é pelos ferrujentos que ela pode quebrar. Aflijo-me, solidário com a sua humanidade, que gostava de ver mais generosa, sem reparar que o tempo desaparece, alheio às razões que impedem a semente de germinar.
E tudo por fazer!
Mas quê! Quando devia estar a ler os clássicos, andava a capinar café; quando me apetece escrever, estou a curar anginas; e quando é preciso salvar o artista, ponho-me a salvar o homem.


Miguel Torga
"Diário (1946)"



TTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTTT




Sim... Trinta e nove anos passaram...

Sugestão:   From the fifth CD "GOLD" (2005) of this great band SILVER
SILVER - SETTING IT UP

TITO COLAÇO
18.04.2013

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Onde Nasceu a Ciência e o Juízo?


Onde Nasceu a Ciência e o Juízo?




MOTE

— Onde nasceu a ciência?...
— Onde nasceu o juízo?...
Calculo que ninguém tem
Tudo quanto lhe é preciso!

GLOSAS

Onde nasceu o autor
Com forças p'ra trabalhar
E fazer a terra dar
As plantas de toda a cor?
Onde nasceu tal valor?...
Seria uma força imensa
E há muita gente que pensa
Que o poder nos vem de Cristo;
Mas antes de tudo isto,
Onde nasceu a ciência?...

De onde nasceu o saber?...
Do homem, naturalmente.
Mas quem gerou tal vivente
Sem no mundo nada haver?
Gostava de conhecer
Quem é que formou o piso
Que a todos nós é preciso
Até o mundo ter fim...
Não há quem me diga a mim
Onde nasceu o juízo?...

Sei que há homens educados
Que tiveram muito estudo.
Mas esses não sabem tudo,
Também vivem enganados;
Depois dos dias contados
Morrem quando a morte vem.
Há muito quem se entretém
A ler um bom dicionário...
Mas tudo o que é necessário
Calculo que ninguém tem.

Ao primeiro homem sabido,
Quem foi que lhe deu lições
P'ra ter habilitações
E ser assim instruído?...
Quem não estiver convencido
Concorde com este aviso:
— Eu nunca desvalorizo
Aquel' que saber não tem,
Porque não nasceu ninguém
Com tudo quanto é preciso! 

António Aleixo
 "Este Livro que Vos Deixo..."


TITO COLAÇO
17.04.2013

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Conselhos de Vida

Conselhos de Vida

1 - Faça o menos possível de confidências. Melhor não as fazer, mas, se fizer alguma, faça com que sejam falsas ou vagas. 

2 - Sonhe tão pouco quanto possível, excepto quando o objectivo directo do sonho seja um poema ou produto literário. Estude e trabalhe. 

3 - Tente e seja tão sóbrio quanto possível, antecipando a sobriedade do corpo com a sobriedade do espírito. 

4 - Seja agradável apenas para agradar, e não para abrir a sua mente ou discutir abertamente com aqueles que estão presos à vida interior do espírito. 

5 - Cultive a concentração, tempere a vontade, torne-se uma força ao pensar de forma tão pessoal quanto possível, que na realidade você é uma força. 

6 - Considere quão poucos são os amigos reais que tem, porque poucas pessoas estão aptas a serem amigas de alguém. Tente seduzir pelo conteúdo do seu silêncio. 

7 - Aprenda a ser expedito nas pequenas coisas, nas coisas usuais da vida mundana, da vida em casa, de maneira que elas não o afastem de você. 

8 - Organize a sua vida como um trabalho literário, tornando-a tão única quanto possível.

Fernando Pessoa
" Anotações de Fernando Pessoa, em inglês (sem data)"



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Faço minhas as palavras deste Grande Senhor,  que tão bem soube captar as singularidades do ser-humano, em todas as suas obras.
Apesar de se dizer e muito bem, que não se deve dar conselhos...


TITO COLAÇO
12.04.213

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Definição de "filhos"


Definição de "filhos"
de José de Sousa Saramago

                                        




"Filho é um ser que nos emprestaram para um curso intensivo de como amar alguém além de nós mesmos, e como mudar os nossos piores defeitos para darmos os melhores exemplos e de aprendermos a ter coragem.
Isto mesmo !
Ser pai ou mãe é o maior acto de coragem que alguém pode ter, porque é se expôr a todo tipo de dôr, principalmente da incerteza de estar agindo correctamente e do medo de perder algo tão amado.
Perder? Como?
Não é nosso, recordam-se
Foi apenas um empréstimo".

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Ao meu querido filho Tito Tomás, pelos seus oito anos de vida que hoje comemora, tendo sido esse dia, o mais feliz da minha vida.
Trago  à colação  José Saramago, na sua excelente definição de "filhos" por ser a mais realista e assertiva noção da nossa condição de pais em relação aos filhos, na minha óptica.
No entanto, pode-se extrapolar para as restantes relações humanas, visto afinal de contas, sermos de ninguém, se não de nós próprios, com laços emotivos imbuídos na nossa existência.
Muitos anos de vida com muita saúde, é o desejo do pai, para ti filho!


TITO COLAÇO
11.04.2013

Cinquentenário de AQUILINO RIBEIRO Aquilino Ribeiro : A árvore da vida


Cinquentenário de 

AQUILINO RIBEIRO


Aquilino Ribeiro : A árvore da vida




No ano em que se assinalam o cinquentenário da morte do grande Aquilino Ribeiro (1885-1963) e os 100 anos da publicação do primeiro livro, a VISÃO traça-lhe uma geografia sentimental, pela obra ou pela vida. Ou por ambas, que em Aquilino as duas sempre se lhe ensarilharam na ponta do aparo...



Foi o escritor de todos os superlativos. Chamaram-lhe mestre, "o poderoso Aquilino", "um dos maiores prosadores da língua portuguesa", "dos mais bem situados nas nossas estantes, de Gil Vicente e Fernão Lopes a Vieira e Camilo", "figura de encruzilhada cultural, entre o primitivismo rural e o amor gratuito da erudição livresca", "de estilo assente na miúda reticulação das fibras que conjuga um mundo recôndito de coisas vindas das retinas, dos tímpanos, das papilas sensitivas à flor da pele e das mucosas"... e toda a adjectivação se torna penosamente frouxa e pleonástica perante o autor de setenta títulos, que viu na sua vida ( sinuosa como no título do seu romance) um inesgotável alforge para as suas aventuras literárias - e que o trazia sempre preso à ilharga, cheio de campo e seiva e o bichedo das serranias beirãs lá dentro, mesmo quando se viu citadino, "emigrado" em Lisboa, enjaulado em calabouços (por duas vezes), cosmopolita, exilado em Paris (também por duas vezes), e na Alemanha... Era um cidadão do mundo, mas as raízes da terra nunca lhe largaram os tornozelos. Na sua obra cabe quase um século inteiro, com as suas vezes e revezes. Na vida coube um romantismo aventuroso à Victor Hugo, que sempre mostrava peito feito às tiranias e aos despotismos vários. Não se vergava nem às sotainas da sua adolescência, nem aos ferrolhos das prisões, nem a juízes, monarcas ou ditadores. E quantas vezes, nas suas lamúrias maternais, ele escutara: "É um homem perdido!" E afinal... eis a maestria de um escritor que talhava as frases num apuro de técnica e perfeição, que trouxe o campo e os cumes mais ariscos à cidade, e em cada linha destampou os cofres fortes das palavras, não as deixou lá ficar, embalsamadas, no bafio do esquecimento. E resgatou-as, reinventou-as, completou-as, ressuscitou-as, "com uma veracidade verónica , graças à perfeição de escrita alcançada nos últimos livros, em que o seu barroquismo visceral se tornara num fio de luz de simplicidade riquíssima - guia seguro por labirintos em que a treva adquiria o depuramento de cristal"( José Gomes Ferreira). A acompanhar as cerimónias oficiais (debates, conferências em Portugal e Paris - 19 de Março, 22 de Maio - , visitas guiadas pelos lugares marcantes da sua vida, por Henrique Monteiro Henrique Monteiro, na Beira, e Mário Cláudio, no Minho - 20 e 21 de Abril-, segue-se um outro itinerário pela seiva que também corria na circulação sanguínea de Aquilino, e suas hastes, nódulos, troncos e ramificações.



BEIRA ALTA

Aquilino Ribeiros nasceu, a 13 de Setembro de 1885, no Carregal da Tabosa, concelho de Sernancelhe, no ano da morte de Victor Hugo e em que se constrói o primeiro carro. Passa uma infância rústica e bucólica, primeiro no Carregal e depois em Soutosa (concelho de Moimenta da Beira). Foi o escritor que melhor desenhou com palavras a beira, suas paisagens, seus bichedos, suas gentes, esses seres rudes que se arrastam na sombra pesada de pedras negras, e seus modos de falar, lendas e costumes.

"Quando se passa à vista dessas serranias, perfiladas no horizonte, que têm o seu quê das monticulações dos formigueiros, cheias de povos, de passaredo, de bichesa humana e montesinha, toma-nos, da projecção da nossa pequenez sobre a imensidade e o mistério da distância, um sentimento que tanto pode ser de exaltar como de deprimir"

In Geografia Sentimental



"Pelo braço de estrada fora rompiam ranchos em algazarra, bestas rinchonas caracolando e maltas de varapaus leva que leva. Lá adiante, ao morrer da baixa, o melhor duma aldeia, harmónio fungando, cores a bezerrar, avançava em animado passo de dança. Sozinhos, chegados um ao outro, lá passavam dois casadinhos de fresco; bem se lhes via nos olhos muito mexidos o regalo de se mostrar. Tropicavam azeméis com velhos de capote e chapéu braguês para a nuca, e éguas de alabarda com matronas de lenço de seda, peito coberto de oiro e tamanquinha de Viseu no bico do pé. Para aguentar o passo, outras mulheres tinham tirado as chinelas e com elas na mão, a par do sombreiro, ou à cabeça sobre o xaile, desinhavam-se todas, tep, tep. E lá seguia tudo a catrapós, no frenesi de meter com sol à festa que o mês de Agosto c'os seus santos ao pescoço não tinha melhor que a Senhora da Lapa, a rica Senhora da Lapinha. "

In Terras do Demo




SEMINÁRIO DE BEJA

Aos 17, anos, acabado o liceu em Lamego, os pais fizeram-lhe uma guerra muda: queriam vê-lo no seminário, deixaram de lhe falar, não lhe chocalhou mais no bolso um vintém, enviavam-lhe "uma batalhão estudado de razões e bons conselhos", as pessoas bem-pensantes da terra, o alfaiate Albino e outros "intermezzos de encomenda". Mas água mole, já se sabe, acabou por pisar o coração, largar a namorada, e abalar para Viseu, estudar filosofia, "sem sequer pedir a bênção da mãe". No seminário de Beja a "disciplina era branda e não se esfolava os joelhos a rezar". Não lhe suportava o sinistro badalo que o acordava entre quatro paredes frias. Nem os seminaristas a zumbirem como colmeia na oração. Nem a sotaina ou o barrete. Nem aquele degredo numa cidade "moirisca degenerada", cheia de "nuvens de moscas zumbentes" que "cravejavam as mãos com seu herpes gordo e movediço"... "Foi-se efetuando em mim o degelo da neve pura que era ao tempo em matéria de fé". "Mas que andas tu aqui a fazer? - perguntava dentro de mim D. Quixote; E para onde hás-de ir?, contrapunha Sancho". Despediu-se para nunca mais, por completa ausência de vocação.

"A sineta, enforcada em dois braços de ferro quase em frente do meu quarto, ladrou a bom ladrar às seis e meia da manhã. Para mim que não estava habituado àquela voz imperativa - a sineta toda paternal do Colégio de Lamego há que mundos deixara de regular os meus hábitos- foi-me desagradável como deve ser a do padre capelão que chega À cela do condenado à morte e lhe diz: Meu Caro Amigo, o recurso foi denegado. Prepare-se para morrer."

In Um escritor Confessa-se



ANTIGA BIBLIOTECA NACIONAL

Arredado e com gáudio da vida eclesiástica, desiludido do jornalismo, excluída a pretensão a amanuense dos Caminhos de Ferro (ficou de fora num concurso com mais de duzentos candidatos)- "pela primeira vez reconheci o que significa no plano da vida prática mudar de rumo à procura dum ofício longe daquele para que se vinha batendo sola"-, o jovem desiste do panorama das mangas de alpaca, "recurvos sobre a banca de concurso a versar os pontos mais metafísicos" e encontra refúgio entre os livros.

"Refugiei-me na literatura como num convento do Monte Atos. Desde os primeiros anos do Colégio que tivera pronunciada tendência para a especulação literária. Por agora volvia à leitura (...). Entrava para a Biblioteca Nacional com o abrir do portão e era o último a largar. Nunca me aconteceu adormecer sobre os livros como convidava aquela sala em abóboda, firmada em aduelas de tijolo, verdadeira adega do espírito fradesco, com o salitre tomístico colado aos muros, no ar a boiar ainda a mofeta inextinta dos silogismos. Mas havia muitos que dormiam e ressonavam, sem escândalo para ninguém, louvados sejam os leitores da Morgadinha dos Canaviais. Tão encharcado andava eu de leituras que, involuntariamente, cheguei a falar como os heróis de Camilo, prestando-se o facto um dia a franca chuchadeira dos amigos. Curei-me do vernáculo nas relações com os meus patrícios sarcasticamente triviais, mas não deixei de prosseguir na formação autodidáctica".

In Um Escritor Confessa-se


LISBOA

"Da Costa do Castelo e Graça sentia-se como que a rajada sísmica no acto de varrer para a Baixa as agulhas estroncadas e os arcaboiços rotos das igrejas e palácios. Raro esta e aquela silhueta - as torres da Sé, as volutas brancas do Carmo, o corpanzil verde de D. José em cima do cavalo (...), e os seus palacetes empoleirados nos altos do Torel - quebravam a impressão de assombro que se recebia na varanda ante a floresta de pedra das duas colinas. Se porém se dilatavam olhos até os planos remotos, para lá da laguna dourada que orla o Terreiro do Paço, quer demorando-os mais longe na seda azul, levemente crespa, das águas fluviais, quer no tracto de terra de Outra Banda salpicado dos grandes malmequeres, Alfeite, Cacilhas, Barreiro, com a Arrábida às espaldas, tão roxa que nem pintada, a vista repousava bêbada de luz na confiança das confianças".

In Mónica



"O Café era a Universidade e a antecâmara permanente da revolução. Cada um tinha os seus clientes, agrupados perla cor das ideias e da gravata: republicanos, aficionados, poetas, batoteiros, e seria milagre que acampasse por ali um só que não acusasse estigma. Desconhecido que aparecesse era tal um moiro na costa. De mesa para mesa voava a palavra de passe: Cuidado que pode ser bufo!"

In um Escritor Confessa-se




PARQUE EDUARDO VII

Um escritor que nunca perdeu as graças do campo, nem traiu as suas origens e exultava, recebia, de braços e pulmões, abertos a sua aldeia de infância, o seu fiel Argos, mastim coelheiro, ou então tinha de se contentar com um retalho verde, simulacro de serra empacotada, encravada na cidade. "Eu reintegrava-me no meio que derivara, e nessa operação sentia a delícia das delícias. Era como o lagarto que depois de hibernar, se espreguiça ao sol".

"Nas belas manhãs eu gostava de ir sozinho Avenida Fora, trepar ao bocado de sertão que era o Parque pouco antes baptizado de Eduardo VII, onde via coelhos a correr, Pássaros de tanguinho no bico em vias de construir o ninho. Ali a natureza era a autêntica madre, no seu plano primitivo, ou quase. Lá estava no alto uma casa de granja, quadrada e com telha moura, ares de "monte" alentejano, desdobrada em abegoaria e alpendres, o Casal Ventoso, onde se vendia um copo de leite, se nos apetecia este mimo rural. E eu voltava aos meus romancistas, arejado dos pulmões, os olhos recreados de todos os belos painéis da geórgica que se oferecia naquele bocado de serra e frágua, inacessível porém então às gâmbias alfacinhas".

"Que regalo não é mudar de pele como as cobras, estes inofensivos répteis dos campos que concitam a aversão atávica do homem, e despir o que se traz da cidade, traje, engravatamento, leituras, presunções de civilizado, e entregar-se o filho pródigo ao seio da natureza como um mamoto aos úberes da vaca mãe, ou chapinhar, açoutar a água de pés e mãos num dos poços da ribeira, adormecidos ao coaxar das rãs?!"

In Um autor Confessa-se



Rua do Carrião

Em 1907, Aquilino adere à Carbonária. Durante a manipulação de cargas de TNT "dois caixotitos", dá-se uma violenta explosão no quarto que habita. Sai fisicamente incólume, ao contrário de dois companheiros, mas foi preso na sequência de tão indiscreta algazarra. Viu-se diante do célebre juiz Veiga, "o grande papão dos republicanos, o terror dos anarquistas, o alcoviteiro do rei, a divindade colérica e tutelar que pairava sobre a Monarquia e as instituições, armada de trindente e coriscos". Afinal, em vez de um Javert eriçado à Victor Hugo, saiu-lhe um avozinho, "um bom velhote, o seu tanto surdo, que punha a mão por detrás do pavilhão da orelha para ouvir melhor e me pedia o favor de falar mais alto, como um avô ao neto, falas brandas edulcoradas de piedade e mansetude".

"A parte culta do País, na maioria, estava ganha à ideia republicana. Os propagandistas tinham feito obra sobretudo de demolição, e frutuosa como fora, só os censuravam os despeitados. Para se fazer um edifício novo onde só há ruínas e pardeiros, antes de mais nada está indicado que se deite abaixo e se removam os escombros. A casa lusitana estava velha e carcomida, e os mais culpados eram os reis. Primeiro os absolutos, em tanto que senhores de corpos e almas, depois os constitucionais (...) Os monarcas portugueses, todo esse fastidioso chorrilho de paranóicos, epilépticos e comições de orelha e tromba de cerdo, a cada um dos quais, uma vez defunto, o mais travadinho dos historiadores acorria a pôr o chinó dum cognome banaboia, afectos a ver a sua inútil pessoa divinizada e indiscutida à testa do rebanho, supondo por hipótese que eram transferidos para a vida civil, tenha-se por garantido que não davam uma para a caixa no que quer que fosse".

In Um escritor confessa-se



Esquadra de Caminho Novo

Foi parar a um chilindró subterrâneo, com bruta fechadura e um estrado de pinho, se não queria alongar o corpo no frio do pavimento. "Os cães tinham melhor!". Deu-lhe a angustiosa impressão "das terríveis idades bárbaras": casamatas, Bastilha, Torre de Nesle, S. Julião da Barra, Junqueira, em que apodreceu muito filho de boa mãe". E um bruto ferrolho que não se cansava de estudar e inspeccionar - "aquela bisarma era de facto para causar calafrios". Ao fim de um mês, com a ajuda da gravata de seda, de varetas improvisadas, muito engenho e arte, conseguiu desconjuntar a fechadura, parafuso a parafuso. Gorada a primeira tentativa de evasão, não falharia a segunda. E da outra vez que o meteram dentro de grades, em 1928, também não se ficou à espera que lhe abrissem a porta.

"A suprema aspiração do cativo, que não sabe o que o espera e ama a liberdade acima de tudo é evadir-se. Os pássaros metem a cabeça, alucinadamente, pelas grades, segundo o instinto que lhe é mais imperioso. Fá-lo a galinha, que é um animal aviltrado, quando a mudam de capoeira. Compreende-se que me ocipasse desde logo com o plano de fuga, desenvolvendo a minúcia eporfia que um charadista põe a solucionar o seu logogrifo".

In Um escritor Confessa-se



Universidade de SOBORNNE, PARIS

Depois de se evadir, ficou algum tempo em Lisboa a cometer imprudências, nas barbas da polícia. O pai veio em seu auxílio, a reunir migalhas. Partiu para o exílio, na manhã de 1 de Junho de 1908, apanhou o Sud-Express, no Entrocamento, de valise na mão: "Ao Diabo a sisudez e o medo da vida!". Em Paris residiu seis anos, em convivência com artistas e escritores. Regressou com a proclamação da República mas retornou à Sorbonne, cursando letras e filosofia. Aí conhece a primeira mulher, a alemã Grete Tiedermann. Passa por Berlim e Parchin, instala-se em Paris, onde em 1913 escreve o seu primeiro livro de contos, Jardim das Tormentas.

"O certo é que Paris, o Paris dos rapins, das porteiras, do beijo à boca farta, da lâmpada de álcool para aquecer a refeição pronta da charcuterie, do modelo pindérico e desnalgado, do cocuage dos amigos e pelos amigos, do Bal Bullier e do Bal des Quat'z Arts, dum dia de fartura e de seis de lazeira, da tasca na fraterna comensalidade de galdérias, rufiões, sábios, niilistas e poetas, tornara-se-lhe imprescindível como a casca do caracol".

In Por obra e Graça


Romarigães, Minho

Aquela que é considerada, incontestavelmente, a obra-prima do mestre Aquilino (A casa Grande de Romarigães), tem este incipid assombroso, de um pinhão que cai e dele se faz àrvore e à sombra desta se construirá a casa que albergará três séculos de história portuguesa e gerações de personagens; uma prosa muito aquiliana, erudita mas eivada de regionalismo e construções desusadas que o escritor em boa hora não deixou embalsamar. Publicada em 1957, o escritor chamou-lhe crónica romanceada, a esta sucessão de paixões, desamores, invasões, insanidades e outros desvarios das gentes, debaixo do mesmo tecto, ao abrigo da mesma árvore. E à floresta hão de acorrer insetos, plantas, pássaros, lobos, javalis... A casa, ou o que dela resta, ainda lá está, em Paredes de Coura, no Minho e foi morada de Bernardino Machado (3º e 8ª presidente da República) e também do próprio escritor que casara com a filha de Bernardino, em 1929, quando ambos se encontravam em Paris, no exílio.

"O vento, que é um pincha-no-crivo devasso e curioso, penetrou na camarata, bufou, deu um abanão. O estarim parecia deserto. Não senhor, alguém dormia meio encurvado, cabeça para fora do seu decúbito, que se agitou molemente. Volveu a soprar. Buliu-lhe a veste, deu mesmo um estalido em sua tela semi-rígida e imobilizou-se. Outro sopro. Desta vezo pinhão, como um pretinho da Guiné de tanga a esvoaçar, libertou-se da cela e pulou no espaço. Que paraquedista!"

In A Casa Grande de Romarigães.


TRIBUNAL DA BOA HORA

Já com um prestígio muito ancorado na sua obra e na sua personalidade (aliás já tornado sócio da Academia de Ciências de Lisboa), o escritor publica o famoso romance Quando os Lobos Uivam, duplamente célebre pelo conteúdo e pelo inacreditável processo salazarento que se lhe moveu. É pronunciado como arguido pelo crime de abuso de liberdade de expressão, sujeito ao vexame dos interrogatórios, à afronta das mesquinhas diligências processuais . Candidato a Nobel e apoiado massivamente por um grupo de intelectuais e figuras públicas indignados, o processo é arquivado, a ver se salvava a face o bolorento regime. No Brasil já saía um livro em defesa de Aquilino: "Quando os Lobos Julgam, a Justiça Uiva". Escritor sem medo é, aos 74 anos, um dos promotores da campanha de outro homem sem medo, o general Humberto Delgado .

"Justo Rodrigues (presidente da Junta) - Já disse, e voltarei a dizê-lo na Câmara segunda-feira: a serra é nossa e muito nossa. Queremo-la assim, estamos no nosso direito. Desta forma é que nos faz arranjo. Os de Lisboa querem-na coberta de pinhal...? Semeiem pinhal nos parques e jardins onde têm empedrado e relva só pra vista.
Nacomba - Vai haver sangue, não haja dúvida - vai, vai! Se o governo teima em meter aqui a pata, temo-la tramada!
Dr. Rigoberto - A nação é de todos. A nação tem de ser igual para todos. Se não é igual para todos, é que os dirigentes, que se chamam Estado, se tornaram quadrilha. Se não presta ouvido ao que eu penso e não me deixa pensar como quero, se não deixa liberdade aos meus actos, desde que não prejudiquem o vizinho, tornou-se cárcere. Não, os serranos, mil, cinco mil, dez mil, têm tanto direito a ser respeitados como os restantes senhores da comunidade. Se os sacrificam, cometem uma acção bárbara, e eles estão no direito de se levantar por todos os meios contra tal política.
Louvadeus- Quando esta aldeia estiver mais adiantada, civilizada, tenha luz eléctrica, telefone, escolas dignas, hospital, água potável, (então) fale o estado em levar por diante este número do programa. Até lá, com fome, tamancos de amieiro e barbárie em toda a linha, deixem-nos o que temos. Não nos queiram ditar a vossa lei pela bala e a baioneta.
(Interrompe) Olhe que Nós também não vamos a Lisboa cobiçar os relvados, que lá há, para pastagem das nossas vacas"

In Quando os Lobos Uivam


Retirado em http://visao.sapo.pt/aquilino-ribeiro--a-arvore-da-vida=f717056
Ana Margarida de Carvalho
 7 de Março de 2013


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TITO COLAÇO
11.04.2013

domingo, 7 de abril de 2013

DEPECHE MODE - ÁLBUM 2013 "DELTA MACHINE"


DEPECHE MODE



Embora não surpreenda como noutros tempos, a máquina dos Depeche Mode ainda vai funcionando. "Delta Machine", o 13º álbum do trio britânico, retoma a fórmula de blues e electrónica e volta a demonstrar que o grupo é a referência nesse campeonato.

Numa conferência de imprensa de apresentação de "Delta Machine", Martin Gore confessou que escreve a mesma canção "vezes sem conta" e é difícil não concordarmos com ele. Na mesma ocasião, Dave Gahan, o vocalista dos Depeche Mode, acrescentou que o compositor o faz "muito bem" e também podemos assinar por baixo, mesmo que consideremos que a escrita do grupo já foi mais inspirada e aventureira.

Retirado em http://musica.sapo.pt/noticias/discos/disco-da-semana-depeche-mode-aquela-maquina



A minha preferida do álbum: Videoclip de "Heaven"




TITO COLAÇO
07-04-2013