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domingo, 9 de janeiro de 2011

As recentes transformações no sistema Penal Português

   A política criminal passa, hoje, pela adequação temporal das leis penais, tendencialmente estruturadas nos códigos, quer às mutações da criminalidade, quer às transformações do Estado e da sociedade, levando, em diferentes países, a modificações conjunturais mais ou menos profundas no sistema penal. Por exemplo, no espaço europeu estão em curso ou foram concluídas recentemente reformas em França, Espanha, Suiça e em Itália, envolvendo, quer o Código Penal e Processual Penal, quer diversa legislação avulsa no domínio do sistema penal.
   Também em Portugal, a necessidade de alterações ao ordenamento jurídico-penal, em especial, aos Códigos Penal e de Processo Penal dominou, nos últimos anos, a agenda política. No lastro deste processo de reforma estão, além da necessária adequação das leis às diferentes transformações societárias e da criminalidade, exigências decorrentes do direito comunitário e da evolução interpretativa da jurisprudência.
   Este processo de reforma, que inclui um vasto conjunto de leis avulsas, teve na publicação da Lei-quadro de Política Criminal e nas alterações aos Códigos Penal e do Processo Penal, o seu principal enfoque. Com a reforma do Código Penal, o legislador procurou, no essencial, adequar as normas substantivas penais a compromissos internacionais assumidos por Portugal, essencialmente no quadro da União Europeia. Uma das principais orientações da reforma centra-se na diversificação das penas, aumentando o leque de penas alternativas ou substitutivas da pena de prisão e alargando a sua aplicação, sendo de salientar o aproveitamento das potencialidades da vigilância electrónica como uma nova pena de execução da substituição da pena de prisão efectiva. No domínio processual, foram alterados alguns institutos, como o segredo de justiça, escutas telefónicas e prisão preventiva, cuja aplicação prática tinha estado, nos últimos anos, sujeitos a intensa exposição e discussão públicas.
   A entrada em vigor da reforma, em 15 de setembro de 2007, foi marcada por forte mediatização com os operadores judiciais a contestarem o curto período de vacatio legis (cerca de 15 dias) e o que alguns designam de “excesso de garantismo”, que consideram colocar causa o necessário equilíbrio entre garantias e eficácia da investigação. Neste contexto, a inversão do princípio do segredo de justiça na fase de investigação para o princípio da publicidade é a alteração que mais criticas tem merecido.
  Todas as alterações estão a ser objecto de um amplo processo de monitorização, cujo programa permite análises globais da realidade judicial, não apenas no seu domínio interno, mas atendendo a outras áreas fundamentais ao bom funcionamento da justiça, identificando os resultados positivos, os problemas, as lacunas e os efeitos perversos que desafiam diariamente o trabalho da justiça. A abrangência das alterações e as suas diversas implicações impõem, por isso, que a monitorização inclua, não só os tribunais e os órgãos de polícia criminal, como também outros serviços auxiliares da justiça.
   O programa de monitorização avalia a reforma considerando o seu impacto para os cidadãos (arguidos, vítimas/assistentes) e para o desempenho funcional dos operadores judiciários (magistrados judiciais e do Ministério Público, advogados, funcionários judiciais) e das organizações (tribunais, incluindo serviços do Ministério Público, órgãos de polícia criminal, sistema prisional, sistema de reinserção social e sistema de perícias médico-legais). As alterações legais são, ainda, avaliadas tendo em conta o seu impacto nas diferentes fases do processo penal (fase de inquérito, fase de instrução, fase de julgamento, fase de recurso e fase de execução).
   O resultado desta monitorização vai permitir um balanço critico da reforma penal no que respeita à relevante dimensão da concretização de uma política criminal integrada que leve em consideração, não só a repressão, mas, sobretudo, a prevenção criminal e qual o seu efeito no necessário equilíbrio entre a concretização prática das garantias constitucionais dos arguidos e das vitimas e a eficácia na prevenção e repressão da criminalidade.

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