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sábado, 9 de março de 2013

POEMAS extraídos de WHY NOT de TITO COLAÇO & THOMAS ELIASSON - Parte III



POEMAS extraídos de WHY NOT de TITO COLAÇO & THOMAS ELIASSON - Parte III




 Poema sobre a Vida


A coisa mais injusta sobre a vida é a maneira como ela termina.
Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida está todo de trás para a frente.
Nós deveríamos morrer primeiro, livrar-nos logo disso.
Daí viver num asilo, até ser chutado para fora de lá por estar muito novo.
Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar.
Então ia trabalhar 40 anos até ficar novo, o bastante para poder aproveitar a sua reforma.
Então curte tudo: bebe bastante álcool, faz festas e prepara-se para a faculdade.
Vai para colégio, tem várias namoradas, torna-se criança, não tem nenhuma responsabilidade, torna-se um bébézinho de colo, volta para o útero da mãe, passa os seus últimos nove meses de vida flutuando.
E termina tudo com um óptimo orgasmo!
Não seria perfeito???

Charles Chaplin



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‎Desencontro


Só quem procura sabe como há dias
de imensa paz deserta; pelas ruas
a luz perpassa dividida em duas:
a luz que pousa nas paredes frias,
outra que oscila desenhando estrias
nos corpos ascendentes como luas
suspensas, vagas, deslizantes, nuas,
alheias, recortadas e sombrias.
E nada coexiste. Nenhum gesto
a um gesto corresponde; olhar nenhum
perfura a placidez, como de incesto,
de procurar em vão; em vão desponta
a solidão sem fim, sem nome algum -
- que mesmo o que se encontra não se encontra.

Jorge de Sena
 'Post-Scriptum'


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O Passado é o Presente na Lembrança


Se recordo quem fui, outrem me vejo,
E o passado é o presente na lembrança.
Quem fui é alguém que amo
Porém somente em sonho.
E a saudade que me aflige a mente
Não é de mim nem do passado visto,
Senão de quem habito
Por trás dos olhos cegos.
Nada, senão o instante, me conhece.
Minha mesma lembrança é nada, e sinto
Que quem sou e quem fui
São sonhos diferentes.

Ricardo Reis 
"Odes"


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‎Quem Sonha Mais?


Quem sonha mais, vais-me dizer —
Aquele que vê o mundo acertado
Ou o que em sonhos se foi perder?

O que é verdadeiro? O que mais será —
A mentira que há na realidade
Ou a mentira que em sonhos está?

Quem está da verdade mais distanciado —
Aquele que em sombra vê a verdade
Ou o que vê o sonho iluminado?

A pessoa que é um bom conviva, ou esta?
A que se sente um estranho na festa?

Alexander Search
 "Poesia"


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Eu adoro voar!


Já escondi um AMOR com medo de perdê-lo, já perdi um AMOR por escondê-lo.
Já segurei nas mãos de alguém por medo, já tive tanto medo, ao ponto de nem sentir minhas mãos.
Já expulsei pessoas que amava de minha vida, já me arrependi por isso.
Já passei noites chorando até pegar no sono, já fui dormir tão feliz, ao ponto de nem conseguir fechar os olhos.
Já acreditei em amores perfeitos, já descobri que eles não existem.
Já amei pessoas que me decepcionaram, já decepcionei pessoas que me amaram.
Já passei horas na frente do espelho tentando descobrir quem sou, já tive tanta certeza de mim, ao ponto de querer sumir.
Já menti e me arrependi depois, já falei a verdade e também me arrependi.
Já fingi não dar importância às pessoas que amava, para mais tarde chorar quieta em meu canto.
Já sorri chorando lágrimas de tristeza, já chorei de tanto rir.
Já acreditei em pessoas que não valiam a pena, já deixei de acreditar nas que realmente valiam.
Já tive crises de riso quando não podia.
Já quebrei pratos, copos e vasos, de raiva.
Já senti muita falta de alguém, mas nunca lhe disse.
Já gritei quando deveria calar, já calei quando deveria gritar.
Muitas vezes deixei de falar o que penso para agradar uns, outras vezes falei o que não pensava para magoar outros.
Já fingi ser o que não sou para agradar uns, já fingi ser o que não sou para desagradar outros.
Já contei piadas e mais piadas sem graça, apenas para ver um amigo feliz.
Já inventei histórias com final feliz para dar esperança a quem precisava.
Já sonhei demais, ao ponto de confundir com a realidade... Já tive medo do escuro, hoje no escuro "me acho, me agacho, fico ali".
Já cai inúmeras vezes achando que não iria me reerguer, já me reergui inúmeras vezes achando que não cairia mais.
Já liguei para quem não queria apenas para não ligar para quem realmente queria.
Já corri atrás de um carro, por ele levar embora, quem eu amava.
Já chamei pela mamãe no meio da noite fugindo de um pesadelo. Mas ela não apareceu e foi um pesadelo maior ainda.
Já chamei pessoas próximas de "amigo" e descobri que não eram... Algumas pessoas nunca precisei chamar de nada e sempre foram e serão especiais para mim.
Não me dêem fórmulas certas, porque eu não espero acertar sempre.
Não me mostre o que esperam de mim, porque vou seguir meu coração!
Não me façam ser o que não sou, não me convidem a ser igual, porque sinceramente sou diferente!
Não sei amar pela metade, não sei viver de mentiras, não sei voar com os pés no chão.
Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra SEMPRE!
Gosto dos venenos mais lentos, das bebidas mais amargas, das drogas mais poderosas, das idéias mais insanas, dos pensamentos mais complexos, dos sentimentos mais fortes.
Tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar de um penhasco q eu vou dizer:
- E daí? EU ADORO VOAR!

Clarice Lispector


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‎Lembra-te!


Lembra-te
que todos os momentos
que nos coroaram
todas as estradas
radiosas que abrimos
irão achando sem fim
seu ansioso lugar
seu botão de florir
o horizonte
e que dessa procura
extenuante e precisa
não teremos sinal
senão o de saber
que irá por onde fomos
um para o outro
vividos

Mário Cesariny
"Pena Capital"



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‎Fala Também Tu!


Fala também tu,
fala em último lugar,
diz a tua sentença.

Fala —
Mas não separes o Não do Sim.
Dá à tua sentença igualmente o sentido:
dá-lhe a sombra.

Dá-lhe sombra bastante,
dá-lhe tanta
quanta exista à tua volta repartida entre
a meia-noite e o meio-dia e a meia-noite.

Olha em redor:
como tudo revive à tua volta! —
Pela morte! Revive!
Fala verdade quem diz sombra.

Mas agora reduz o lugar onde te encontras:
Para onde agora, oh despido de sombra, para onde?

Sobe. Tacteia no ar.
Tornas-te cada vez mais delgado, irreconhecível, subtil!
Mais subtil: um fio,
por onde a estrela quer descer:
para em baixo nadar, em baixo,
onde pode ver-se a cintilar: na ondulação
das palavras errantes.

Paul Celan
"De Limiar em Limiar"



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Assim, Sem Nada Feito e o Por Fazer


Assim, sem nada feito e o por fazer
Mal pensado, ou sonhado sem pensar,
Vejo os meus dias nulos decorrer,
E o cansaço de nada me aumentar.

Perdura, sim, como uma mocidade
Que a si mesma se sobrevive, a esperança,
Mas a mesma esperança o tédio invade,
E a mesma falsa mocidade cansa.

Tênue passar das horas sem proveito,
Leve correr dos dias sem acção,
Como a quem com saúde jaz no leito
Ou quem sempre se atrasa sem razão.

Vadio sem andar, meu ser inerte
Contempla-me, que esqueço de querer,
E a tarde exterior seu tédio verte
Sobre quem nada fez e nada quer.

Inútil vida, posta a um canto e ida
Sem que alguém nela fosse, nau sem mar,
Obra solentemente por ser lida,
Ah, deixem-se sonhar sem esperar!

Fernando Pessoa
 'Cancioneiro'


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‎Sol Poente


Tardinha... "Ave-Maria, Mãe de Deus..."
E reza a voz dos sinos e das noras...
O sol que morre tem clarões d'auroras,
Águia que bate as asas pelo céu!

Horas que têm a cor dos olhos teus...
Horas evocadoras doutras horas...
Lembranças de fantásticos outroras,
De sonhos que não tenho e que eram meus!

Horas em que as saudades, p'las estradas,
Inclinam as cabeças mart'rizadas
E ficam pensativas... meditando...

Morrem verbenas silenciosamente...
E o rubro sol da tua boca ardente
Vai-me a pálida boca desfolhando...

Florbela Espanca
 "Livro de Sóror Saudade"



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‎O Mesmo


O mesmo Teucro duce et auspice Teucro
É sempre cras — amanhã — que nos faremos ao mar.

Sossega, coração inútil, sossega!
Sossega, porque nada há que esperar,
E por isso nada que desesperar também...
Sossega... Por cima do muro da quinta
Sobe longínquo o olival alheio.
Assim na infância vi outro que não era este:
Não sei se foram os mesmos olhos da mesma alma que o viram.
Adiamos tudo, até que a morte chegue.
Adiamos tudo e o entendimento de tudo,
Com um cansaço antecipado de tudo,
Com uma saudade prognóstica e vazia.

Álvaro de Campos
 "Poemas"



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‎Foi um Momento


Foi um momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço,
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não ?

Não sei. Mas lembro
E sinto ainda
Qualquer memória
Fixa e corpórea
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido.
Mas tão de leve!...

Tudo isto é nada,
Mas numa estrada
Como é a vida
Há muita coisa Incompreendida...

Sei eu se quando
A tua mão
Senti pousando
‘Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço?
Como se tu,
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.

Assim a brisa
Nos ramos diz
Sem o saber
Uma imprecisa
Coisa feliz.

Fernando Pessoa
"Cancioneiro"

 
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‎Os Grandes Forjam-se na Adversidade!


Todo o ambiente é favorável ao forte; de um modo ou de outro ele o ajuda a cumprir a missão que se impôs e a conseguir ir porventura mais além das barreiras marcadas. A derrota deve mais atribuir-se à invalidez do impulso interior do que aos obstáculos que lhe ponham diante, mais à alma incapaz de se bater com vigor e tenazmente do que às resistências, às invejas e às dificuldades que o mundo possa levantar perante Hércules que luta.
O mal que se vê é aguilhão para o bem que se deseja; e quanto mais duro, quanto mais agressivo, se bate em peito de aço, tanto mais valioso auxiliar num caminho de progresso; o querer se apura, a visão do futuro nos surge mais intensa a cada golpe novo; o contentamente e a mansa quietude são estufa para homens; por aí se habituaram a ser escravos de outros homens, ou da cega Natureza; e eu quero a terra povoada de rijos corações que seguem os calmos pensamentos e a mais nada se curvam.
Mais custa quebrar rochar do que escavar a terra; mais sólido, porém, o edifício que nela se firmou. A grandeza da obra é quase sempre devida à dificuldade que se encontra nos meios a empregar, à indiferença que cerra os ouvidos do povo, e aos mil braços que logo se levantam para deter o arquitecto. Se cai em batalha, pobre dele, podemos lamentá-lo; não o chamara o Senhor para as grandes empresas; mas se pelo menos a voz se lhe erguer clara, firme, heróica no meio do turbilhão, não foram inúteis as dores e os esforços: algum dia um novo mundo se erguerá das brumas e o terá como profeta.
Quem ia a perturbar ficará perturbado, quem ia a matar ficará morto. Não é com os mesquinhos artifícios, nem com o desprezo, nem com a mentira, nem pelo cansaço, nem pela opressão, nem pela miséria que se vencem os que pensaram num futuro e, amorosamente, com cuidados de artista, continuamente, com firmeza de atleta, o vão erguendo pedra a pedra. É necessário que se resista enquanto houver um fôlego de vida, mas que essa resistência seja sobretudo o contacto com a realidade da força criadora; é esta que afinal tudo leva de vencida e reduz oposições a pó inútil e ligeiro. 

Agostinho da Silva
 'Textos e Ensaios Filosóficos'  


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‎Ao Longe, ao Luar


Ao longe, ao luar,
No rio uma vela,
Serena a passar,
Que é que me revela?

Não sei, mas meu ser
Tornou-se-me estranho,
E eu sonho sem ver
Os sonhos que tenho.

Que angústia me enlaça?
Que amor não se explica?
É a vela que passa
Na noite que fica.

Fernando Pessoa
 'Cancioneiro'  



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‎Ser Diferente


A única salvação do que é diferente é ser diferente até o fim, com todo o valor, todo o vigor e toda a rija impassibilidade; tomar as atitudes que ninguém toma e usar os meios de que ninguém usa; não ceder a pressões, nem aos afagos, nem às ternuras, nem aos rancores; ser ele; não quebrar as leis eternas, as não-escritas, ante a lei passageira ou os caprichos do momento; no fim de todas as batalhas — batalhas para os outros, não para ele, que as percebe — há-de provocar o respeito e dominar as lembranças; teve a coragem de ser cão entre as ovelhas; nunca baliu; e elas um dia hão-de reconhecer que foi ele o mais forte e as soube em qualquer tempo defender dos ataques dos lobos. 

Agostinho da Silva
 'Diário de Alcestes' 



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‎Não há Nada que Resista ao Tempo


Não há nada que resista ao tempo. Como uma grande duna que se vai formando grão a grão, o esquecimento cobre tudo. Ainda há dias pensava nisto a propósito de não sei que afecto. Nisto de duas pessoas julgarem que se amam tresloucadamente, de não terem mutuamente no corpo e no pensamento senão a imagem do outro, e daí a meia dúzia de anos não se lembrarem sequer de que tal amor existiu, cruzarem-se numa rua sem qualquer estremecimento, como dois desconhecidos.
Essa certeza, hoje então, radicou-se ainda mais em mim.
Fui ver a casa onde passei um dos anos cruciais da minha vida de menino. E nem as portas, nem as janelas, nem o panorama em frente me disseram nada. Tinha cá dentro, é certo, uma nebulosa sentimental de tudo aquilo. Mas o concreto, o real, o número de degraus da escada, a cara da senhoria, a significação terrena de tudo aquilo, desaparecera.

Miguel Torga
"Diário (1940)" 



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‎Não Penses


Não penses. Que raio de mania essa de estares sempre a querer pensar. Pensar é trocar uma flor por um silogismo, um vivo por um morto. Pensar é não ver. Olha apenas, vê.
Está um dia enorme de sol. Talvez que de noite, acabou-se, como diz o filósofo da ave de Minerva. Mas não agora. Há alegria bastante para se não pensar, que é coisa sempre triste. Olha, escuta.
Nas passagens de nível, havia um aviso de «pare, escute, olhe» com vistas ao atropelo dos comboios. É o aviso que devia haver nestes dias magníficos de sol. Olha a luz. Escuta a alegria dos pássaros. Não penses, que é sacrilégio.

Vergílio Ferreira
"Conta-corrente - nova série - 2" 


TITO COLAÇO
GRUPO WHY NOT?
09.03.2013

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