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quarta-feira, 29 de maio de 2013

Viver pela evidência




  Viver pela evidência  




Creio que já falei disto. Mas de que é que diabo se não falou já? Se não falámos nós, falaram os outros, que também são gente. E no entanto, de cada vez se fala pela primeira vez, porque o que importa não é o que se sabe mas o que se vê. E ver é ver sempre de outra maneira para aquele que vê. Quantas vezes se falou da morte e da vida e do amor e de mil outras coisas sisudas? Mas volta-se sempre à mesma, porque o saber pela evidência é saber pela primeira vez; e uma dor que nos dói ou uma alegria que nos alegra não doeu nem alegrou senão a nós. De modo que de novo me intriga a extraordinária desproporção entre o complexo de uma vida e a coisa chilra que dela resulta.
Mesmo os grandes homens, que são maiores do que nós, que é que nos deixaram em testamento? Um livro, uma ideia, uma fórmula. E os que nada nos deixaram? Mas uma vida é fantástica pelo que nela aconteceu. Há assim um desperdício extraordinário, uma pura perda do que se amealhou. Relações, sentimentos, projectos, acções correntes que foram desencadear mil efeitos maus ou úteis. E tudo se perdeu. Ninguém vem tomar conta do que numa vida aconteceu. Podemos pensar que os efeitos permanecem ou se justapõem na vida que ficou. Mas isso mesmo que houvesse seria uma realidade anónima e mergulhada finalmente no silêncio, como a de um vento que passou. A Natureza é assim perdulária e só de facto o sabemos quando nos fixamos no centro de nós e damos o balanço da infinidade de realidades que em nós se efectivaram. Viver é assim desenvolver-se numa vida o vazio ignorado do universo que existe e se transforma e se aniquila na inutilidade do ser. Viver é estabelecer o confronto entre um máximo e um mínimo, entre o ser e o não-ser. E no resultado do confronto o que aparece é o falado absurdo. Mas o absurdo é ainda um nome e o resultado efectivo não tem nome. Porque nada há para nomear.


Vergílio Ferreira
 'Conta-Corrente 4'















  TITO COLAÇO  
28.05.2013

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Entender, mais pelo sentir que pela razão





Entender, mais pelo sentir que pela razão


Uma verdade só o é quando sentida - não quando apenas entendida. 
Ficamos gratos a quem no-la demonstra para nos justificarmos como humanos perante os outros homens e entre eles nós mesmos. Mas a força dessa verdade está na força irrecusável com que nos afirmamos quem somos antes de sabermos porquê.
Assim nos é necessário estabelecer a diferença entre o que em nós é centrífugo e o que apenas é centrípeto. Nós somos centrifugamente pela irrupção inexorável de nós com tudo o que reconhecido ou não - e de que serve reconhecê-lo ou não? - como centripetamente provindo de fora, se nos recriou dentro no modo absoluto e original de se ser.
Só assim entenderemos que da «discussão» quase nunca nasça a «luz», porque a luz que nascer é normalmente a de duas pedras que se chocam. Da discussão não nasce a luz, porque a luz a nascer seria a que iluminasse a obscuridade de nós, a profundeza das nossas sombras profundas.
Decerto uma ideia que nos semeiem pode germinar e por isso as ideias é necessário que no-las semeiem. Mas a sua fertilidade não está na nossa mão ou na estrita qualidade da ideia semeada, porque o que somos profundamente só se altera quando isso que somos o quer - e não quando nós o deliberamos. 
Assim nasce um desencontro quantas vezes entre a mecânica dos nossos raciocínios e a verdade que em nós já é morta. No hábito dos gestos, as mãos tecem ainda na exterioridade de nós a plausibilidade do que em nós já não é plausível. Então nos é necessário substituirmos toda a aparelhagem de que nos serviríamos e já não serve. Surpresos olhamos quem fomos porque já nos não reconhecemos.
Atónitos perguntamos como foi possível?, quando, onde, porquê?, ao espanto da nossa transfiguração, ao incrível da cilada que nós próprios nos armámos, mesmo quando foi a vida que a armou; porque tudo quanto é da vida, e dos outros, e dos mil acontecimentos que quisermos, só existe eficaz e real quando abre em evidência na profundidade de nós. Como aceitar assim a força da razão, se a força dela está onde ela não está?


Vergílio Ferreira
'Invocação ao Meu Corpo'














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Sugestão musical:  

 Lindsey Stirling - "Crystallize" 
 (Dubstep Violin Original Song)




TITO COLAÇO
15.03.2013

domingo, 12 de maio de 2013

Está aí alguma entidade?





Está aí alguma entidade???






Os mortos não escrevem nem falam por sussurro

Serão reais as vozes e os sons espectrais que se pensa ouvir nas psicofonias? Ou somos, apenas, facilmente sugestionáveis e o espiritismo não passa de uma simples montagem?

"Isto está a ir muito mal”, afirma, com voz trémula, Ana, que participa numa sessão de Ouija, juntamente com outros três voluntários, nas instalações de uma antiga fábrica de chocolate. O encontro teve início às onze da noite e cumpre todos os cânones do espiritismo: primeiro, os quatro deram as mãos durante um minuto; depois, colocaram os dedos sobre um copo virado de boca para baixo em redor do qual estão dispostas as letras do alfabeto. A ideia é esperar que alguma “entidade” responda às perguntas que o grupo coloca em voz alta, como “Está alguém aí?”, “Conhece-nos?” ou “Quem é?”.

Após 20 minutos de quietude, quando os ânimos já esmorecem, o copo começa a deslizar pelo tabuleiro. O susto é monumental. “Juro que quase não tinha o meu dedo lá em cima!”, exclama outra participante. Pouco a pouco, o suposto “espírito” começa a responder a algumas perguntas. Chamava-se Laura e tinha trabalhado naquele local. Embora não tivesse falecido ali, estava ligada à fábrica por alguma razão obscura. Por essa altura, já ninguém tinha dúvidas: tinham conseguido contactar com o espírito de um morto. Na realidade, porém, estavam completamente enganados.

Foi em 31 de Março de 1848 que as irmãs Kate e Maggie Fox fundaram o espiritismo moderno. O ser humano sempre acreditou que a morte não é o fim, que algo nos aguarda após o último suspiro. Todavia, o que supostamente conseguiram essas meninas de 12 e 15 anos de idade foi quebrar a barreira intransponível que nos separa do Além e, literalmente, falar com os mortos. As irmãs Fox anunciaram a boa nova ao mundo na sua modesta quinta em Hydesville, no norte do estado de Nova Iorque, e, posteriormente, na vizinha cidade de Rochester: existe vida depois da morte e podemos comunicar com os nossos entes queridos que já faleceram.
aliar ciência e religião

A notícia espalhou-se como pólvora e, em apenas quatro anos, cinco por cento da população norte-americana convertera-se ao espiritismo. As manas Fox percorreram povoações e cidades e, por onde passavam, surgiam pessoas que também se diziam capazes de operar o prodígio. A idade de ouro do espiritismo prolongou-se até ao início da Segunda Guerra Mundial. Era um verdadeiro espectáculo de massas, com exibições públicas, centenas de milhares de médiuns a oferecerem os seus serviços em troca de alguma compensação monetária, amigos que se reuniam em casa para invocarem os seus mortos

Em França, um pedagogo chamado Hippolyte Léon Denizard Rivail encontrou no fenómeno uma possível via para concretizar o que considerava ser o principal objectivo da educação: a aliança entre ciência e religião. A 30 de Abril de 1856, os espíritos revelaram-lhe a transcendental missão de salvamento de que fora incumbido. Reunidos em conclave, tinham-no escolhido como porta-voz para dar a conhecer ao mundo uma nova doutrina, e disseram-lhe que, numa vida anterior, tinha sido um druida, o chefe de uma comunidade, chamado Allan Kardec. Foi assim que escreveu, ditado por aqueles seres, o Livro dos Espíritos, pedra angular do movimento, que surgiu nas livrarias de Paris em 18 de Abril de 1857 e conheceu três edições em menos de um ano.

De facto, foi Kardec que criou o termo “espiritismo”. Até essa altura, apenas se falava em “espiritualismo”, nos meios anglo-saxões. Contudo, havia profundas diferenças entre ambos. Aparentemente, as almas que contactavam britânicos e norte-americanos não tinham a mesma opinião que as suas colegas gaulesas sobre alguns temas, como a reencarnação. Por sua vez, entre os mortais, os estudiosos ingleses consideravam Kardec “muito pouco científico”, por muito que insistisse que o espiritismo não era uma religião, mas uma ciência, uma filosofia e um sistema moral.

Anteriormente, no verão de 1853, Michael Faraday, um dos físicos mais importantes da história, dedicara-se ao estudo da parte mais espectacular das sessões espíritas. Nelas, parecia que os mortos se deslocavam e chegavam a erguer pesadas mesas de madeira. O fenómeno era conhecido por “mesas giratórias”, e tornou-se a diversão mais aplaudida no Ocidente, chegando a ser praticada pela família real da Prússia.

Contra a credulidade

Faraday era um homem profundamente religioso e perito em conceber experiências. Criou uma série de inteligentes testes para determinar a veracidade do fenómeno e a sua origem. Contactou com “pessoas honradas e bem-sucedidas deslocadoras de mesas”, que estavam convencidas de nunca as terem empurrado. Para provar a sua tese, Faraday inventou um par de dispositivos engenhosos. O primeiro consistia em vários pedaços de cartão que podiam deslizar e eram colocados, um sobre o outro, em cima da mesa. Por baixo, fora desenhado um traço com lápis para marcar a sua posição relativa. Qualquer movimento involuntário das mãos seria delatado por uma interrupção na linha. Foi o que aconteceu.

Na outra experiência, Faraday fixou uma agulha a duas pequenas tábuas na mesa, de modo que, se ela fosse empurrada pela médium, o indicador deslocar-se-ia para a esquerda e, se a puxasse, inclinar-se-ia para a direita. O resultado foi conclusivo: a agulha revelou, sem margem para erro, que o móvel estava a ser empurrado. Todavia, o mais interessante acontecia quando a médium podia ver o indicador, de modo a conseguir perceber os seus próprios movimentos musculares inconscientes. Quando a agulha assinalava o esforço, o indivíduo reagia descontraindo os músculos e a mesa não se mexia.

Definitivamente, os espíritos não eram para ali chamados. Faraday concluiu: “Embora acredite que os presentes não têm a intenção de fazer deslocar a mesa, obtêm esse resultado por uma acção praticamente voluntária. Continuam sem duvidar da influência da esperança nas suas mentes, e é nisso que reside o êxito ou o fracasso dos seus esforços.”



Não sabe o que faz...

Os estudos de Faraday foram publicados no jornal The Times em 30 de Junho de 1853 e, passado dois dias, com mais pormenor, na revista Athenaeum. Embora fossem sumamente minuciosos, não convenceram os espíritas. Tanto na altura como hoje, afirmam que observam e anotam tudo cuidadosamente nas suas sessões, mas esquecem que o mais importante é saber para onde olhar, e isso não se aprende por ciência infusa.

Um dos golpes mais fortes desferidos contra a linha de flutuação do espiritismo francês surgiu da parte de Michel-Eugène Chevreul, director do Museu de História Natural de Paris. Mundialmente conhecido como químico e inventor da margarina, explicava da mesma forma, no livro Da Varinha Divinatória e das Mesas Giratórias (1854), o funcionamento da varinha de vedor e das mesas espíritas. Segundo Chevreul, os movimentos produziam-se porque a mente inconsciente obrigava os músculos a movimentarem o objeto para obter uma resposta adequada às perguntas feitas pela mente consciente. O mérito da explicação reside no facto de resolver o problema do motivo pelo qual os indivíduos não têm consciência de estarem a empurrar a mesa ou um pêndulo, e pensarem que os responsáveis são os espíritos ou forças desconhecidas.

Faraday e Chevreul demonstraram a existência de um fenómeno conhecido em psicologia pelo termo “acção psicomotora”. É suficiente pensarmos em efectuar uma acção para o nosso corpo se preparar para concretizá-la, sem termos consciência disso. Além disso, basta colocarmos a hipótese de não fazer algo para o cérebro lançar mãos à obra: por exemplo, se nos disserem “não pense em ursos brancos”, a imagem de um daqueles animais surgirá na nossa mente sem podermos evitá-lo.

Para comprovar o efeito psicomotor que governa estes fenómenos, organizámos a já referida sessão de Ouija na antiga fábrica de chocolates. Preparámos, para a experiência, um tabuleiro especial em que as letras do alfabeto estavam dispostas em círculo, depois de terem sido impressas em cartões de visita (um por cada letra). Quando o copo começou a deslocar-se, os nossos quatro voluntários estavam absolutamente convencidos de que tinham conseguido contactar um espírito.

Contudo, era a segunda parte da experiência que se tornava verdadeiramente interessante. No reverso de cada cartão, fora impresso um número. Tínhamos atribuído um a cada letra, de forma aleatória. Por exemplo, ao A correspondia o 14; ao B, o 21... Misturámos os cartões como se baralham as cartas, antes de os dispormos para formar outra tábua de Ouija. Se fosse mesmo um espírito a comunicar, os participantes não teriam necessidade de saber onde se encontrava cada letra. Nesta segunda experiência, o copo também se deslocou sobre o tabuleiro, mas as respostas foram uma série de letras sem sentido. A conclusão, como já tinham explicado Faraday e Chevreul, é que são as pessoas que o fazem deslizar através do mecanismo das acções psicomotoras.

As vozes dos mortos

A procura de uma demonstração experimental de que podemos contactar com os mortos conheceu uma verdadeira revolução no verão de 1959. Nesse ano, Friedrich Jürgenson, um pintor de origem ucraniana adepto da ornitologia, descobriu, depois de ter gravado o canto do melro e do tentilhão, que se podia escutar nos intervalos o que parecia ser vozes humanas. Era estranho: quando registara os sons, não havia gente nas redondezas. O fenómeno continuou a verificar-se, chegando a sobrepor-se, por vezes, aos cantos das aves. Um dia, a voz de uma mulher chamou-o pelo seu nome; parecia a da sua mãe, já falecida, que lhe dizia: “Friedrich, estás a ser observado. Friedel, meu pequeno Friedel, consegues ouvir-me?” Acabava de captar as suas primeiras psicofonias.

É esta, pelo menos, a versão dos defensores dos fenómenos paranormais. Contudo, uma coisa é o mito e outra a realidade. Narrado assim, parece uma descoberta completamente fortuita, mas a história não é tão “inocente” como parece à primeira vista. O próprio Jürgenson revelou que, no inverno de 1958, já levara a cabo algumas experiências “preliminares”, motivado por um “intenso desejo de estabelecer um contacto electrónico com algo ou alguém desconhecido”. Além das gravações, Jürgenson desenvolveu um novo método de comunicação espírita: movia lentamente os botões do rádio até sintonizar a frequência em que os espíritos “transmitiam”. Claro que havia um truque, pois não o fazia intuitivamente: contava com a ajuda de uma “guia espectral”, uma tal Lena que lhe murmurava “agora”, do Além, quando o ponteiro passava pelo ponto adequado.

O problema é que as supostas gravações de vozes do Além não eram nítidas e cristalinas. As “mensagens”, quase inaudíveis, mal se faziam ouvir acima do nível de ruído, de modo que era necessário escutá-las várias vezes para tentar perceber o que diziam. De facto, as psicofonias não convenciam os espíritas. Em algumas publicações associadas ao movimento, como a Light, chegou a dizer-se que, se essas vozes provinham de espíritos desencarnados, deviam ser de “baixo nível”, pois “muitas são frases curtas, triviais, inconsequentes e sem sentido”.

Mais do que fé

A machadada final nas gravações de Jürgenson, assim como nas que faria, posteriormente, o grande divulgador das vozes, o alemão Konstantin Raudive, foi desferida, em 1972, por David Ellis. Depois de estudar e analisar as gravações em bruto das melhores psicofonias disponíveis, este investigador da Universidade de Cambridge concluiu que “não há razão para postular outra coisa que não sejam causas naturais: fragmentos de emisssões radiofónicas, ruídos mecânicos, frases de pessoas ao longe; tudo isso, associado a uma imaginação delirante e ao desejo de escutar o que se quer ouvir”. O que Ellis descobriu é que as supostas vozes de espíritos não passavam de um exemplo do que é conhecido por “pareidolia”. Já todos experimentámos o fenómeno ao distinguir formas de animais nas nuvens. Houve mesmo quem acreditasse ter visto a alegada face de Jesus numa sandes.

Quisemos comprovar até que ponto a pareidolia pode ser responsável pelo que se pensa escutar nos fenómenos de “voz electrónica”. Utilizámos, para a experiência, gravações de duas psicofonias reconhecidas como tais pelos defensores do paranormal. É importante assinalar que não se tratava das gravações em bruto, mas de versões que já tinham sido manipuladas para fazer “sobressair” as vozes captadas. A experiência consistia em fazer três pares de pessoas ouvi-las. Ao primeiro, indicou-se previamente que as psicofonias eram, em geral, ruídos que se confundem com vozes; ao segundo, foi dito que se tratava de frases autênticas proferidas por espíritos; ao terceiro, que deviam apenas tentar identificar o que se ouvia nas psicofonias.

Terminado o estudo, descobrimos que a pareidolia explica o fenómeno na perfeição. Nenhum par deu uma versão coincidente com as dos outros no que se refere ao conteúdo das supostas mensagens. Isso demonstra que as gravações, apesar de terem sido manipuladas informaticamente para tornar audíveis as “frases”, eram absolutamente ininteligíveis. Por outras palavras, a inteligência que cria as supostas vozes não está na gravação, mas em quem a escuta.

O mais curioso foi descobrir como é fácil induzir uma pessoa a ouvir o que queremos que oiça. Uma das psicofonias utilizadas fora gravada por defensores do sobrenatural numa povoação emblemática do misterioso mundo oculto. O par a quem fora dito que se tratava apenas de ruídos não identificou vozes humanas na gravação, mas apenas o som do vento. Pelo contrário, os outros grupos afirmaram escutar palavras, embora incompreensíveis.

A segunda psicofonia fora gravada num ambiente universitário. Ao par a quem fora dito que era verdadeira, foi proporcionada uma informação adicional: asseguraram-lhes que havia, nesse sítio, uma presença que não desejava que alguém se encontrasse naquele local. Ambos os elementos do par disseram ter ouvido as palavras “ide-vos daqui”, a mesma mensagem que os adeptos do paranormal tinham afirmado que se escutava. Os outros dois pares, porém, não ouviram tal frase.

A conclusão da investigação é simples: nem a tábua Ouija nem as psicofonias representam qualquer prova da existência de vida após a morte, nem de que possamos comunicar com “o outro lado”. Em que ficamos, então? Deixemos falar a fundadora do espiritismo, Margaret Fox. Em 24 de Setembro de 1888, afirmou numa entrevista ao New York Herald: “O espiritismo é, do princípio ao fim, uma fraude, a maior fraude do século.” Um mês depois, na Academia de Música de Nova Iorque, perante centenas de testemunhas e repórteres de todos os jornais da cidade, as irmãs Fox reproduziram as pancadas supostamente dadas pelos espíritos, fazendo estalar o dedo grande do pé! Os famosos seres espectrais não passavam de estalidos de ossos.

M.A.S.
SUPER INTERESSANTE 178 - Fevereiro 2013





TITO COLAÇO
12.05.2013

sábado, 11 de maio de 2013

A arte da retórica floresce nas sociedades decadentes...


  A arte da retórica   floresce nas sociedades    decadentes...  




Um retórico do passado dizia que o seu ofício era fazer que as coisas pequenas parecessem grandes e como tais fossem julgadas. Dir-se-ia um sapateiro que, para calçar pés pequenos, sabe fazer sapatos grandes. Em Esparta ter-lhe-iam dado a experimentar o azorrague por professar uma arte trapaceira e mentirosa. E creio que Arquidamo, que foi seu rei, não terá ouvido sem espanto a resposta de Tucídides, ao qual perguntara quem era mais forte na luta, se Péricles, se ele: «Isso será difícil de verificar, pois quando o deito por terra, ele convence os espectadores que não caiu, e ganha». Os que, com cosméticos, caracterizam e pintam as mulheres fazem menos mal, pois é coisa de pouca perda não as ver ao natural, ao passo que estoutros fazem tenção de enganar, não já os olhos, mas o nosso juízo, e de abastardar e corromper a essência das coisas. Os Estados que longamente se mantiveram em boa ordem e bem governados, como o cretense e o lacedemónio, não tinham em grande conta os oradores.
Aríston definiu sabiamente a retórica como a ciência de persuadir o povo; Sócrates e Platão, como a arte de enganar e lisonjear; e aqueles que isto negam na sua definição genérica, confirmam-no por toda a parte nos seus preceitos. Os Maometanos proíbem-na de ser ensinada às crianças por causa da sua inutilidade. E os Atenienses, ao tomarem consciência de que a sua prática, a qual gozava de todo o crédito na sua cidade, era perniciosa, ordenaram que a sua parte principal, que consiste em mover as paixões, dela fosse retirada juntamente com os exórdios e as perorações.
É um instrumento inventado para manipular e agitar turbas e multidões desordenadas, e que, à maneira da medicina, só se emprega nos Estados doentes. Naqueles onde o vulgo, onde os ignorantes, onde todos, tudo puderam, como os de Atenas, Rodes e Roma, e onde as coisas estavam em perpétua tempestade, abundavam os oradores. E, na verdade, nesses Estados viam-se poucas personagens atingir grande reputação sem o socorro da eloquência: Pompeu, César, Crasso, Lúculo, Lentulo, Metelo apoiaram-se sobretudo nela para se alçarem à grandeza de autoridade aonde por fim chegaram, mais dela se valendo que das armas, e contrariando o que se pensava em melhores tempos. De feito, Lúcio Volúmnio, ao falar em público a favor da eleição ao consulado do Quinto Fábio e Públio Décio, dizia: «São pessoas nascidas para a guerra, grandes na acção, rudes nas pugnas verbais: espíritos verdadeiramente consulares. Os subtis, os eloquentes e os eruditos são bons para ficarem na cidade como pretores a ministrar a justiça.
A eloquência floresceu mais em Roma quando os negócios públicos se achavam no seu pior estado e a tormenta das guerras civis os agitava, tal como um campo desocupado e incultivado produz as ervas daninhas mais viçosas. Assim, parece que os governos dependentes de um monarca têm dela menos necessidade que os outros, pois a estupidez e a ductilidade que se encontram na plebe e que a tornam sujeita a ser manipulada e meneada pelas orelhas ao doce som dessa harmonia, sem que chegue a sopesar e a conhecer a verdade das coisas pela força da razão, essa ductilidade, digo, não é tão fácil de se achar num só indivíduo, sendo este mais facilmente salvaguardado dos efeitos de tal veneno por uma boa educação e por bons conselhos. Não se viu sair da Macedónia nem da Pérsia nenhum orador de renome. 



Michel de Montaigne 
'Ensaios - Da Vaidade das Palavras'









TITO COLAÇO
11.05.2013

terça-feira, 7 de maio de 2013

Here and there...



   Here and there  





Here is the same as there, my friend,
All places in this world are like.
If doomed thy life in grief to spend,
What change can then thy fate amend,
What from thy sou! the pain can strike?

When pain doth wound the tired heart
And grief doth tire the fevered eye,
Some joy indeed the world's great art
May to thy pained soul impart-
What's this if joy in thee not lie?

When on my restless couch I lie
And count the throbbing of my breath,
I see the joy of earth and sky
Yet hate it alI; why should not I
So keep my coward mind from death?

True joy comes not from outward show
But in our deepest soul doth rest.
What matter if the sun can glow
And stars at night look sweetly so
When hearts are by their grief opprest?

For when the darkness weighs thy thought,
And night doth fall upon thy soul,
Are not again thy sorrows brought?
Is not thy mind in shadows caught?
Do fears not back upon thee roll?

I cannot do but hope; as mine
Thy mind I see to hopes doth bend;
I in my land and thou in thine
We suffer both - our griefs entwine.
Here is the same as there, my friend. 



Alexander Search
Poesia
Edição e tradução - Luísa Freire
Assírio & Alvim
Obras de Fernando Pessoa
1999




  Here
 is the same as there, my friend... 
 



                                     TITO COLAÇO                          
                                      07.05.2013                                  

       
    

segunda-feira, 6 de maio de 2013

É o fim que confere o significado às palavras...



É o fim que confere o significado às palavras...











Apenas as palavras quebram o silêncio, todos os outros sons cessaram. 
Se eu estivesse silencioso, não ouviria nada. 
Mas se eu me mantivesse silencioso, os outros sons recomeçariam, aqueles a que as palavras me tornaram surdo, ou que realmente cessaram. 
Mas estou silencioso, por vezes acontece, não, nunca, nem um segundo. Também choro sem interrupção. É um fluxo incessante de palavras e lágrimas. 
Sem pausa para reflexão. 
Mas falo mais baixo, cada ano um pouco mais baixo. 
Talvez. 
Também mais lentamente, cada ano um pouco mais lentamente. 
Talvez. 
É-me difícil avaliar. Se assim fosse, as pausas seriam mais longas, entre as palavras, as frases, as sílabas, as lágrimas, confundo-as, palavras e lágrimas, as minhas palavras são as minhas lágrimas, os meus olhos a minha boca. E eu deveria ouvir, em cada pequena pausa, se é o silêncio que eu digo quando digo que apenas as palavras o quebram. 
Mas nada disso, não é assim que acontece, é sempre o mesmo murmúrio, fluindo ininterruptamente, como uma única palavra infindável e, por isso, sem significado, porque é o fim que confere o significado às palavras.


Samuel Beckett
"Textos para Nada"






06.05.2013
TITO COLAÇO

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Agradecimento! Grandes Homens forjam-se a si próprios...

Grandes Homens forjam-se a si próprios 




Para conhecer a realidade do mundo, único fim sério da ciência, é preciso entrar no combate da vida como entravam na liça os paladinos bastardos - sem pai e sem padrinho. Os príncipes não constituem excepção a esta lei geral da formação dos homens. Da educação de gabinete, do bafo enervante dos mestres, dos camareiros e das aias, nunca saíram senão doentes e pedantes.
Na sagração dos czares há uma cerimónia de alta significação simbólica: o imperador não se confirma enquanto por três vezes não haja descido do trono e penetrado sozinho na multidão; e isto quer dizer que na convivência do povo a autoridade e o valor dos monarcas recebe uma tão sagrada unção como a da santa crisma. 
Todos os reis fortes se fizeram e se educaram a si mesmos nos mais rudes e mais hostis contactos da natureza e da sociedade humana.
Veja vossa alteza Carlos Magno, que só aos quarenta anos é que mandou chamar um mestre para aprender a ler. Veja Pedro o Grande, do qual a educação de câmara começou por fazer um poltrão. Aos quinze anos não se atrevia a atravessar um ribeiro. Reagiu enfim sobre si mesmo pela sua única força pessoal. Para perder o medo aos regatos, um dia, da borda de um navio, arrojou-se ao mar. Para se fazer marinheiro começou por aprender a manobrar, servindo como grumete. Para se fazer militar começou por tambor na célebre companhia dos jovens boiardos. E para reconstituir a nacionalidade russa começou por construir navios, a machado, como oficial de carpinteiro e de calafate, nos estaleiros de Sardam. Também não teve mestres, e foi consigo mesmo que ele aprendeu a lingua alemã e a lingua holandesa. 
Veja vossa alteza, enfim, todos aqueles que no governo dos homens tiveram uma acção eficaz, e reconhecerá se é na lição dos mestres ou se é no livre exercicio da força e da vontade individual que se criam os carácteres verdadeiramente dominadores, como o de Cromwell, como o de Bonaparte, como o de Santo Inácio, como o de Lutero, como o de Calvino, como o de Guilherme o Taciturno, como o de Washington, como o de Lincoln.


Ramalho Ortigão
'As Farpas (1883)'



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Agradeço a todos os que fizeram votos de mais anos de vida, neste meu dia de aniversário.
Trinta e nove anos. 
Espero que continuemos todos por cá, com a melhor saúde possível e tudo o resto...


Bem hajam,


TITO COLAÇO
02 de Maio de 2013