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terça-feira, 10 de maio de 2011

Disparam gastos na segurança mas sem travar aumento do crime


A despesa do Estado com Segurança e Ordem Pública aumentou para mais do dobro em 15 anos. Mas o maior investimento não se traduziu numa diminuição dos crimes. Foram os Governos socialistas que mais aumentaram a despesa com a segurança e que admitiram mais polícias.


A despesa do Estado com segurança e ordem pública aumentou para mais do dobro nos últimos 15 anos. Em 1995, os gastos com as policias foram de 1278,4 milhões de euros e, em 2009, essa verba tinha disparado para 3185,7 milhões. De acordo os dados disponíveis em matéria de despesa pública, na base da Pordata, há 15 anos a segurança de cada português custava ao Estado 127 euros.
Agora, essa despesa aumentou para quase 300 euros por cidadão.
Mas, quando se cruza a linha de evolução desta despesa com a cur: va da criminalidade, segundo os valores publicados pela Direcção-Geral da Política de Justiça, concluiu-se que o maior investimento não se traduziu numa diminuição dos crimes e da insegurança. Pelo contrário. Neste mesmo período, o País registou um aumento de 30% de crimes, sendo que, nos últimos dez anos, os crimes contra o Estado foram os que mais cresceram (mais 72%).
Na verdade, a falta de eficiência, no sentido de produzir resultados com menos despesa, é mais notória nos Governos socialistas. António Guterres, que chega a S. Bento em 1995, parte de um orçamento para a segurança e ordem pública, deixado por Cavaco Silva, de 1278.4 milhões de euros. Mas, quando deixa a liderança do País, em 2002, tinha aumentado a despesa nesta rubrica em 85%. A criminalidade, no seu período de liderança (1995 a2002), teve a maior subida de sempre, mais 19%.
Com José Sócrates, o cenário é semelhante. Mais 22% de despesa com a segurança (passou de 2591.5 milhões, em 2005, para 3185,7 em 2009) e mais 7,4% de criminalidade registada no mesmo período. Nos anos de Governo PSD/CDS, juntando Durão Barroso e Santana Lopes, a despesa com as polícias também foi aumentada, mas menos (cresceu 9,4%). Em contrapartida, o investimento feito contribuiu, pelo menos, para estabilizar a criminalidade, com um ligeiro aumento de apenas 0,7%.
Idêntica lógica prevalece com as admissões de polícias (ver texto ao lado). Apesar de Portugal estar abaixo da média europeia em taxa de crime per capita -405 crimes por cada dez mil habitantes - posicionando-se em 18.° lugar na UE, o Estado entende que deve reforçar o efectivo policial. Principalmente os responsáveis socialistas.
Enquanto com Barroso/Santana houve menos 943 polícias contratados, contabilizando a Polícia Judiciária, a PSP, a GNR e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, com Sócrates, dados actualizados de 2010 apontam para quase 50 mil elementos nas forças e serviços de segurança. Mais 3096 polícias.
Mas, tal como com o investimento, o período em que se contratam mais polícias não corresponde a uma diminuição da criminalidade. Entre 2005 e 2010, os crimes subiram 7,4%.
Na opinião de Nelson Lourenço, catedrático da Universidade Nova, “as forças e serviços de segurança têm de conquistar a sua eficácia e eficiência, mas isso não acontece com o aumento do número de elementos, mas sim reforçando as capacidades tecnológicas e, obviamente, tirando os inúmeros polícias do exercício de funções civis”.
Do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), André Inácio nota que, “efectivamente, tem-se investido em equipamentos, nem sempre os mais adequados, atendendo a necessidades individuais de cada polícia, sem uma perspectiva global de racionalização de meios”. O inspector da PJ, em funções no Instituto Nacional de Aviação Civil, dá como exemplo o recente caso dos blindados para a PSP “para ‘concorrer’
Apostar em tecnologias e coordenação estudo O professor Nelson Lourenço, um dos autores de um estudo sobre a reforma do modelo de segurança interna, Nelson defende que a Lourenço despesa com a segurança deve ser canalizada para “dotar as polícias de mais tecnologia”. Este catedrático não vê o aumento de polícias como solução para melhorar a “eficiência e eficácia” do sistema. “Há muitos polícias a desempenhar funções civis, e o que é preciso é acabar com as redundâncias que existem no sistema, com duplicações de competências e demasiados actores. Deve haver ainda uma maior integração e coordenação entre os diversos actores”. Este investigador sublinha que há “muitas duplicações de competências, como na investigação criminal”. Em conclusão, Nelson Lourenço sustenta que “não é admitindo mais polícias que a eficiência do sistema melhora, mas sim dotando-o de mais tecnologias e mais ciência”.

Carências na investigação criminal
OSCOT - André Inácio, membro do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), atribui os fracos resultados à “falta de coordenação entre as diversas forças de segurança e órgãos de polícia criminal, ao parco investimento em formação de actualização, aliado a um sistema de justiça lento, descredibilizado, em que se esquece que um dos fins das penas deverá ser o de servir de elemento desincentivador à prática de ilícitos criminais”.
Por outro lado, “a criação de competências de investigação criminal nas polícias sem as dotar de formação adequada traduz-se em significativas carências no domínio processual penal e de estratégia de investigação criminal, que vão sendo supridas com as experiências no terreno, numa lógica de tentativa e erro que tem como consequência o arquivamento de muitos processos-crime”.
Estas são “algumas das razões que explicam que Portugal seja o quarto país da Europa com maior número de polícias e onde a população não se sente segura”.
Portugal é o quarto país com mais polícias ‘per capita’
As principais forças e serviços de segurança (PSP, GNR, PJ e SEF) tinham, em 2010, um efectivo de 49 943 elementos Portugal é o quatro país da União Europeia (UE) com o número mais elevado de polícias por habitante. Com uma taxa de quase 49 polícias por dez mil habitantes, Portugal fica muito acima da média europeia, que se situa nos 33,7 e só é ultrapassado por Chipre, Itália e Espanha.
Países com problemas muito maiores de segurança, como é o caso de Turquia, Grécia, Irlanda ou Reino Unido, têm muito menos polícias para a totalidade da população residente.
Apesar deste paradoxo, nos últimos anos, principalmente com os dois Governos de José Sócrates, a opção para responder ao aumento de criminalidade que se tem verificado tem sido o recrutamento de mais polícias. Mas a tendência de subida dos crimes que se vem verificando nos últimos 15 anos não foi travada.
Quando foi ministro da Administração Interna de Sócrates, António Costa constatou que este cenário era insustentável - cerca de 94% das despesas com as forças de segurança são com o pessoal - e propôs um conjunto de medidas para racionalizar recursos humanos e materiais, congelando as admissões.
Mas, quando saiu, a reforma ficou na gaveta. E, como presidente da Câmara de Lisboa, deixou de defender ideias que tinha apoiado antes, como a de encerrar metade das esquadras em Lisboa libertando mais de mil agentes da PSP para policiamento de proximidade.
O seu sucessor, Rui Pereira, lançou a mais repetida “palavra de ordem” do seu mandato: “Vamos admitir mais dois mil elementos, mil para a PSP, mil para a GNR!” Contas feitas, conseguiu fazê-lo na PSP, mas fracassou no reforço da GNR, em que as pré-aposentações não permitiram o saldo positivo das admissões. A GNR é a única força de segurança que perdeu elementos nos últimos dez anos. Eram 25 817 em 2001 e, em 2010, o efectivo ficava-se pelos 23 209.

Valentina Marcelino | Diário de Notícias | 09.05.2011

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