Supra summus...
Muito discutiu a antiguidade em torno do supremo bem.
O que é o supremo bem?
Seria o mesmo que perguntar o que é o supremo azul, o supremo acepipe, o supremo andar, o ler supremo, etc.
Cada um põe a felicidade onde pode, e quanto pode ao seu gosto.
(...)
Sumo bem é o bem que vos deleita a ponto de nos polarizar toda a sensibilidade, assim como mal supremo é aquele que vos torna completamente insensível.
Eis os dois pólos da natureza humana.
Esses dois momentos são curtos. Não existem deleites extremos nem extremos tormentos capazes de durar a vida inteira.
Supremo bem e supremo mal são quimeras.
Conhecemos a bela fábula de Crântor, que fez comparecer aos jogos olímpicos a Fortuna, a Volúpia, a Saúde e a Virtude.
Fortuna: - O sumo bem sou eu, pois comigo tudo se obtém.
Volúpia: - O meu é o pomo, porquanto não se aspira à riqueza senão para ter-me a mim.
Saúde: - Sem mim não há volúpia e a riqueza seria inútil.
Virtude: - Acima da riqueza, da volúpia e da saúde estou eu, que embora com ouro, prazeres e saúde pode haver infelicidade, se não há virtude.
Teve o pomo a Virtude.
A fábula é engenhosa, mas não resolve o problema absurdo do supremo bem.
Virtude não é bem, senão dever. Pertence a um plano superior.
Nada tem que ver com as sensações dolorosas ou agradáveis.
Com cálculos e gota, sem arrimo, sem amigos, privado do necessário, perseguido, agrilhoado por um tirano voluptuoso aboletado no fausto, o homem virtuoso é infelicíssimo, e o perseguidor insolente que acaricia uma nova amante no seu leito de púrpura, felicíssimo.
Podeis dizer ser preferível o sábio perseguido ao perseguidor impertinente.
Podeis dizer amar a um e detestar o outro.
Mas esquece-vos que le sage dans les fers enrage. Se não concordar o sábio, engana-vos: é um charlatão.
Voltaire
"Dicionário filosófico"
TITO COLAÇO
XIV___III___MMXIV
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