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sábado, 30 de outubro de 2010

NOÇÕES Elementares de Ciência Política

NOÇÕES Elementares de Ciência Política

Regimes Políticos

Classificação Aristotélica:
  • Monarquia – poder de um só.
  • Aristocracia – poder de um grupo/ classe/ elite.
  • República/ Democracia – poder distribuído por todos.

Þ Esta classificação utiliza o CRITÉRIO DO NÚMERO, ou seja, analisa a forma como  o poder é distribuído de acordo com o número de pessoas que o detêm.
Þ Para Aristóteles, qualquer um destes regimes é bom, no sentido em que aqueles que exercem o poder podem orientar as suas políticas no sentido do bem comum.
Þ No entanto, caso os defensores do poder não procurem o bem comum e antes procurem satisfazer interesses particulares, estes regimes tomam formas perversas:
·         Monarquia Þ Tirania.
·         Aristocracia Þ Oligarquia.
·         Democracia Þ demagogia (regime de viciação da democracia).

Classificação dos regimes segundo Montesquieu:
  • Monarquias.
  • Repúblicas:
    • Democracias.
    • Aristocracia.
  • Despotismo (tirania). 

Þ Ao contrário de Aristóteles, Montesquieu faz a classificação dos regimes com base em factores sociológicos e institucionais.

Monarquias:
·         O poder pertence ao rei e é exercido de acordo com a Lei.
·         O princípio do governo (aquilo que faz o governo agir) consiste na honra.
Repúblicas:
  • O poder soberano pertence ao povo. (se estivermos perante uma república democrática).
  • O princípio do governo consiste na virtude cívica dos cidadãos.
Despotismo:
  • O poder pertence ao tirano que não tem qualquer respeito pela lei.
  • O princípio do governo consiste no medo.
  • Nota: nestes regimes o clero limita o poder absoluto “o mal limita o mal”. Como tal pode-se considerar que há sempre formas de contaminação dos regimes que impedem o poder absoluto.





O regime político ideal para Montesquieu (POLITEIA)
  • Tem em conta o paradigma da CONSTITUIÇÃO MISTA – o regime ideal é um regime moderado onde a esfera de liberdades do indivíduo é respeitada.
  • Montesquieu defende uma Monarquia (mas não absoluta) limitada por:
    • Direito.
    • Poderes intermédios (baseado na constituição cristã) Þ defende-se uma transferência de poderes para as instituições intermédias (através de autonomias municipais, ordens, reunião de Estados-gerais).
    • Princípio da separação dos poderes:
      • Parte da ideia basilar de que é necessário garantir a todos os homens a liberdade individual. Ora, segundo Montesquieu, há uma tendência natural para o abuso de poder que só pode ser contornada caso os poderes estejam divididos.
      • Cada poder do Estado deve ter 2 poderes: tomar decisões sobre a esfera própria e a possibilidade de travar certas decisões se outros poderes do Estado (Sistema de checks and balances).

A Democracia

Þ Após as revoluções atlânticas, começou a entender-se que o melhor regime era o modelo da democracia.
Þ Assim passou a fazer-se uma distinção dicotómica dos regimes: regimes democráticos e regimes não democráticos (autocracias).

NOTA: Lei de Bronze das Oligarquias Þ tendência para criar uma classe política relativamente fechada. Para combater esta tendência é necessário: formar a comunidade, descentralizar o poder, abrir os partidos à comunidade e às bases.

Raízes filosóficas do modelo democrático: matriz greco-latina e judaico-cristã.

Experiência democráticas anteriores às revoluções atlânticas: Cidades-estado gregas, Experiência da República Romana, Liga Hanseática (associação entre cidades comerciais do norte da Alemanha sécs. XIII e XIV entre as quais não existiam taxas aduaneiras). 

Teoria da Democracia

Axioma antropológico Þ Igual dignidade da pessoa humana (valor absoluto).

Trilogia (étimos da democracia) Þ Liberdade, Igualdade, Fraternidade. (Só há democracia sustentável se existir um equilíbrio entre os valores desta trilogia).
                                                    Þ Esta trilogia surge num contexto histórico de falta de liberdade, desigualdade social e tempo de grande miséria. (é o contexto da revolução francesa).




Olhando para as democracias actuais, observa-se:
  • Existência de sociedade plurais/ fragmentadas/ diversificadas.
  • Relativização do Estado – o Estado perde poder (deixa de ter controlo fronteiriço, privatizações...).

Ulrich Beck
Þ Defende que houve uma mudança de paradigma no 11 de Setembro. Vivemos hoje numa sociedade de risco, há uma sensação de incerteza e de insegurança em parte causada por o grande desequilíbrio na ordem económica mundial.

Assim, a democracia necessita de novos valores para fazer face aos novos desafios (Denninger):
  • DIVERSIDADE/ RECONHECIMENTO DO DIREITO À DIFERENÇA:
    • Vivemos num mundo multicultural. Temos que aceitar a coexistência entre estilos de vida completamente diferentes. É necessário o respeito (não tolerância) pelas outras culturas. 
    • A igualdade é, portanto, substituída pelo valor do Direito à diferença.
    • A liberdade está presente no princípio da diversidade.
  • SOLIDARIEDADE:
    • Percebeu-se que o ideal de fraternidade levou à existência de ideologias que favoreciam o igualitarismo, aplicando o princípio da rectificação. Estes processos revelaram-se muito ineficazes, tendo, em última análise feito um “nivelamento por baixo”, ou seja, levaram ao empobrecimento generalizado.
    • Assim, compreendeu-se que o Estado não é capaz de atender a todos. É preciso caminhar para um modelo pragmático dos direitos sociais. O Estado tem que atender QUEM precisa, NA MEDIDA em que precisa, no TEMPO em que necessita (A solidariedade tem que ser mais objectiva).
  • SEGURANÇA:
    • É um elemento fundamental para que haja liberdade. Há riscos na sociedade técnica que são exponenciais. Por outro lado, os processos de globalização e de desenvolvimento tecnológico permitem que um só indivíduo tenha muito poder o que se torna perigoso na medida em que este poder poderá ser utilizados para maus fins. Existem também riscos ambientais, crime organizado... 

Actualmente, existem 2 concepções de democracia:
  • Concepção material ou substantiva:
    • A democracia tem determinados valores que têm que ser respeitados independentemente dos factores conjunturais. (o Estado democrático é o Estado do governo da lei “rule of law”)
    • A democracia visa a realização de direitos fundamentais como a liberdade de circulação, a liberdade religiosa...
    • Associada à ideia de Estado de Direito Þ a democracia é uma ordem de direitos.
  • Concepção processual ou deliberativa:
    • É o povo que a cada momento escolhe os valores. A democracia é um processo, um método de deliberação.
    • Apenas algumas liberdades “básicas” são asseguradas (expressão, imprensa, comunicação) e é conservado o Direito da protecção das minorias.
    • Apenas as regras de apuramento dos valores são fixas (regras eleitorais).
    • É uma concepção que une elementos processuais e elementos substantivos:
      • Elementos processuais Þ a regra da maioria, o princípio da representação política (sistemas eleitorais e sistemas de partidos).
      • Elementos deliberativos Þ Separação dos poderes, independência dos tribunais, direitos fundamentais.

Regra da maioria:
  • Está historicamente ligada às ordens religiosas. (Por exemplo a eleição dos abades ou o critério da escolha dos chefes na ordem de S. Bento). Tal pode explicar-se porque métodos como a sucessão hereditária ou a tomada do poder pela força não eram possíveis nestas ordens, pelo que foi necessário apurar a vontade individual. 

A validade da regra da maioria

Þ Para Rousseau, a vontade geral era uma entidade racional, se os indivíduos são racionais, então a vontade da maioria é a expressão máxima da racionalidade – Racionalidade absoluta.
Þ Mas o pensamento de Rousseau é ambíguo e falível pois nem sempre a vontade da maioria é racional.

NOTA: O problema é que para Rousseau a vontade geral podia anular as vontades individuais; no fundo, ele defendia uma uniformização dos objectivos dos indivíduos e uma homogeneização da sociedade que são pouco compatíveis com o liberdade…


Fundamentos éticos/ deontológicos que justificam a regra da maioria:

Princípio da igualdade Þ  Se todos são iguais, necessariamente, para que se cumpra o direito de igualdade é necessário respeitar a vontade da maioria.

Princípio da liberdade Þ é necessário respeitar a liberdade de escolha das maiorias.

NOTA: A vontade da maioria NÃO É um critério de verdade é um critério de escolha.

Limitações à regra da maioria:
  • Limitações de ordem jurídica Þ as maiorias exercem-se num certo contexto organizatório. Ou seja, o espectro de acção das maiorias está juridicamente limitado pelas funções e poderes que o quadro organizatório a priori lhe atribui. Assim, as maiorias estão limitadas às competências que os quadros organizatórios lhes atribuem.
  • Limitações de ordem política Þ uma maioria tem de actuar em prol do interesse geral, ou seja, as maiorias não podem ser exercidas apenas em nome daqueles que votaram nelas.

Assim, pode concluir-se que a decisão de uma maioria só é legítima se estiver enquadrada dentro das suas competências e se procurar o interesse global. Pelo que, uma decisão que não respeite os étimos da democracia (liberdade e igualdade) não é legítima. Como tal, a regra da maioria não pode servir para aniquilar as minorias (é necessário proteger as minorias).

(Nota: aquilo que permite analisar a democraticidade de um regime político é a capacidade de haver a possibilidade das minorias se virem a tornar maiorias. Do ponto de vista jurídico-político, o estatuto da oposição é indispensável para proteger as minorias). 


Princípio da representação política

Þ No quadro estadual moderno não é viável o modelo de democracia directa (modelo no qual o conjunto do povo participa directamente no exercício da governação).

Þ Assim, é necessário introduzir um modelo de democracia representativa. Ou seja, um modelo em que o exercício do poder é feito por representantes em que o povo delegou directa ou indirectamente o poder.

Existem dois processos de delegação do poder pelo povo:
  • Sorteio:
    • Vantagem: respeito do princípio da igualdade, pois todos têm oportunidade de ser escolhidos.
    • Desvantagem: põe em causa a liberdade de escolha, não respeita as preferências dos cidadãos, nem tem em atenção a capacidade efectiva dos escolhidos.
    • Exemplos: utilizado na selecção dos jurados (para avaliar situações de facto em tribunal).
  • Eleição.

A estes processos de designação contrapõem-se outros como:
  • Mecanismos de cooptação Þ escolha dos governantes pelos governantes (ex.: escolha dos juízes do tribunal constitucional, a escolha do primeiro-ministro, a escolha dos ministros do governo).
  • Hereditariedade dinástica.

NOTA: a representação política não significa uma transferência definitiva do poder para os representantes, esta tem um carácter limitado, sendo necessário proceder a eleições/ sorteios periódicos. Esta periodicidade permite a existência de um sintonia entre a orientação e a vontade políticas prevalecentes na comunidade e programa dos governantes.

Þ O facto de se utilizar um modelo de democracia representativa, não implica que, em algumas circunstâncias não se utilize mecanismos próximos da democracia directa (mecanismos de democracia semi-directa):
  • Referendo Þ realiza-se no âmbito do quadro democrático, sujeitando a tomada de uma determinada decisão ao voto popular.
  • Plebiscito Þ é um referendo que se realiza fora dos quadros democráticos, ou seja, não há garantias democráticas, o que leva à redução do debate político e, consequentemente, à demagogia.








A representatividade e os mass-media

Ao analisarmos actualmente, a vida política nacional e internacional, podemos concluir que a ideia de representação na sua concepção vai sofrer grandes alterações.  Ao contrário do que acontecia anteriormente, em que os parlamentos eram os “palcos” por excelência do debate político, hoje, assistimos à mediatização deste mesmo debate, sendo os mass-media os veículos de participação política. Por outro lado, assistimos à perda de ideologia dos próprios partidos (transformação em partidos do tipo “catch-all” que tentam, através da perda de bagagem ideológica, atingir todos os sectores da sociedade). Tudo isto leva a um enfraquecimento dos partidos (e dos sindicatos) e a uma sobrevalorização da imagem e da opinião pública em detrimento de um debate político sério e profundo. Cria-se a ilusão de que todos estamos informados sobre as mais variadas matérias, mas, na realidade, essa informação é muito superficial.

A evolução do modelo político democrático ao nível da representação

Democracia oitocentista ou representativa:
  • O público político era restrito.
  • Regra do sufrágio restrito:
    • Sufrágio censitário Þ aponta para ideia de que só podem votar aqueles que gozem de uma certa fortuna ou rendimento (só quem tem condições para pagar o censo eleitoral)
    • Sufrágio capacitário[1]. Þ está associado ao grau de ilustração, conhecimento. Só podiam votar as pessoas que fossem alfabetizadas.
  • A ideia da regra do sufrágio restrito tem a sua origem no ancient regime. Neste considerava-se que o poder deveria pertencer ao Princípe uma vez que este era independente (não era pressionável) e, portanto, podia tomar racionalmente as suas decisões rodeando-se, para tal, dos melhores filósofos e cientistas. Com o novo regime, a burguesia vem aplicar a mesma regra, por um lado goza de independência financeira e, por outro, tem agora acesso ao conhecimento. Consequentemente, o sufrágio restrito vai ser justificado pela necessidade de tomar decisões racionais.
  • Do ponto de vista sociológico, o sufrágio restrito foi uma forma de perpetuar no poder a classe que instaurou o novo regime.

Þ A justificação teórica da doutrina do eleitorado restrito só é aceitável à luz da soberania nacional:
·         Nesta época, a Nação tinha uma dimensão transcendente ao indivíduo. Existia a visão romântica da nação como algo sagrado. Assim, aceitava-se a ideia de que a nação tinha que escolher apenas os mais aptos. Como tal, votar não é entendido como um direito mas como um dever. (Doutrina da soberania nacional + eleitorado função). 
Eleitorado restrito Þ soberania nacional Þ eleitorado-função (representa toda a nação não os seus eleitores)Þcentralidade no parlamento (centro do debate político).

Nota: não cabe aos eleitores definir em que sentido devem actuar os seus representantes, este só actuam em prol da nação em representação de toda a nação (e não dos seus eleitores). O parlamento é o local de debate de ideias onde se deve chegar a solução ideal.
O alargamento progressivo do sufrágio até ao sufrágio universal
·         Ao longo dos anos, o sufrágio foi alargando-se a várias camadas sociais. Para tal, contribuíram:
o   Processos de industrialização.
o   Movimentos sufragistas (principalmente movimentos feministas).
o   Recuo da maioridade eleitoral.

Alteração da concepção da soberania popular/ concepção fraccionada da soberania popular:
·         A soberania pertence ao povo. Cada elemento do povo é titular de soberania Þ um conceito introduzido por Emmanuel Sieyès, num panfleto dedicado à Revolução Francesa e chamado Qu’est-ce que le Tiers Etat? (O que é o Terceiro Estado?)
·         Passa a existir não um eleitorado-função mas um ELEITORADO-DIREITO (votar é um direito que resulta da tutela de soberania).
Estas alterações provocam modificações nos mandatos dos deputados. Os deputados passam a gozar de um mandato Imperativo Þ o deputado tem que actuar de acordo com os interesses dos seus eleitores (vincula-se previamente a um conjunto de acções que tem que honrar). Consequentemente, há também a alteração da natureza do parlamento.

NOTA: em certos Estados como a Califórnia ou a Venezuela, existe um instituto “recall” que permite revogar o mandato de um governante que não esteja a proceder de acordo com o interesse da maioria.

NOTA2: com o alongamento do eleitorado, passa a ser necessário formar partidos que correspondam a uma determinada linha ideológica, pois só assim será possível chegar ao poder. Esta actuação em bloco dos deputados acaba por desvalorizar o parlamento.













Sistemas eleitorais:
  • Sistemas maioritário.
  • Sistemas de representação proporcional. 

Sistema eleitoral maioritário:
  • A uma volta Þ é eleita a lista que tiver mais votos (“the first past the post”).
  • A duas voltas Þ para se ser eleito à 1ª volta é necessária maioria absoluta. Caso contrário, concorrem novamente os dois candidatos mais votados (ganhando uma por maioria absoluta) ou concorrem todos os candidatos (ganhando o primeiro com maioria relativa).
  • VANTAGENS:
    • Simplicidade.
    • Menor influência partidária na escolha dos deputados.
    • Permite maior governabilidade.
    • Fortalece a oposição. Embora seja mais fácil obter maiorias absolutas, este sistema favorece o bipartidarismo, tornando a oposição coesa e, portanto, mais forte.
  • DESVANTAGENS:
    • É um sistema menos adequado à democracia de partidos.
    • Favorece a sobre-representação das maiorias e a sub-representação das minorias.
    • Em teoria pode acontecer que apenas um partido tenha representação no parlamento (caso ganhe em todos os círculos eleitorais, tendo na realidade, metade dos votos do eleitorado).
Sistema de representação proporcional:
  • Atribui mandatos a cada uma das candidaturas na exacta proporção dos votos de cada uma delas.
  • É um sistema que surge da necessidade de representação das minorias, fundamenta-se na ideia de que o parlamento deve ser um espelho da sociedade (reforço do princípio da igualdade).
  • VANTAGENS:
    • É um sistema mais representativo.
    • É mais adequado à lógica partidária dos nossos dias.
    • Realiza melhor o princípio da igualdade.
  • DESVANTAGENS:
    • Maior fragmentação do espectro político.
    • Dificulta a formação de maiorias (sendo que isto pode ser corrigido).
    • Afasta os eleitores dos eleitos (principalmente num sistema de listas fechadas).
  • TEM 2 FASES:
    • Distribuição dos mandatos base.
    • Repartição dos restos. 

Distribuição dos mandatos base:
  • Critério do quociente eleitoral  Þ nº de votos expressos/ nº de mandatos a atribuir = nº de votos para obter um deputado.
  • Critério do número uniforme Þ a lei estabelece o número de votos que elege um deputado.
  • Critério do quociente nacional Þ nº de votos nacional/ nº de mandatos = nº de votos para obter um deputado (aplica-se esse número em todos os círculos eleitorais).

Distribuição dos restos:
  • Critério do maior resto Þ é um critério que leva à pulverização partidária, dificultando a estabilidade política e a governabilidade.
  • Critério da maior média Þ um mandato em causa é sucessivamente atribuído àquela lista que com essa precisa atribuição fica com maior média de votos por deputado. É um critério que favorece as maiorias dando maior estabilidade governativa.

A dimensão dos círculos eleitorais
Þ Os círculos eleitorais podem ser NACIONAIS, GRANDES, PEQUENOS, UNINOMINAIS.
Þ Em Portugal os círculos eleitorais têm uma dimensão variada (Porto elege 38 deputados, Portalegre elege 3).

Escrutínio uninominal ou de lista:
  • Escrutínio uninominal Þ vota-se num candidato. Só pode ser utilizado no sistema eleitoral maioritário.
  • Escrutínio de lista Þ Pode ser utilizado no SM ou no SRP.
    • As listas podem ser:
      • Abertas Þ são situações em que nos boletins aparecem os nomes de todos os deputados de todos os partidos e os eleitores escolhem a ordem de entrada.
      • Fechadas Þ apresenta-se a lista de candidatos do partido aos eleitores, podendo estes escolher a ordem de entrada dos mesmos.
      • Bloqueadas Þ a lista é escolhida pelo partido e a ordem de entrada também, o eleitor limita-se a votar num partido, tendo um comportamento passivo quanto ao resto.
NOTA: as listas abertas ou fechadas tendem a aproximar os eleitores da classe política.

O método de Hondt:
Þ Alia o critério do quociente eleitoral ao critério da maior média, facilitando a formação de maiorias e, consequentemente, a governabilidade e estabilidade política.

(ver quadros do caderno).













Os partidos políticos em especial

Þ Os partidos políticos constituem uma instituição essencial nos regimes liberais.
Þ Os partidos nasceram e desenvolveram-se ao mesmo tempo que as eleições e que a representação.
Þ Nascem com a necessidade de obter o patrocínio de determinados candidatos e de reunir fundos para a campanha.
Þ Nascem dentro dos parlamentos, verifica-se uma tendência para a formação de grupos parlamentares de acordo com as suas ideologias, tendo em vista  uma acção comum.

Os dois tipos de partidos:
  • Os partidos podem ser distinguidos em dois grandes grupos: partidos de quadros e partidos de massas.

Partidos de quadros:
  • Partidos de quadros tradicionais:
    • Foram os primeiros partidos a surgir. Foi a estrutura adoptada pelos partidos conservadores e liberais da Europa do séc. XIX e pelos partidos dos Estados Unidos.
    • Nascem dentro dos parlamentos, verifica-se uma tendência para a formação de grupos parlamentares de acordo com as suas ideologias, tendo em vista  uma acção comum. 
    • São partidos que têm em vista reunir notáveis: importa-lhes mais a qualidade do que a quantidade (prestígio, influência moral, fortuna).
    • A autonomia dos seus membros é muito grande.
    • São partidos que assentam na lógica do sufrágio restrito às elites.
    • Correspondem ao conflito entra aristocracia e burgueses (conservadores – liberais).
  • Novos tipos de partidos de quadros/ partidos de quadros mais modernos:
    • Desenvolvem-se no séc.XX.
    • Caso Americano: foram profundamente modificados pelo sistema de eleições primárias em que o os eleitores são chamados a designar os candidatos dos partidos. Este sistema vem destrui o quadro restrito dos comités de notáveis. Isto cria mecanismos de adesão dos eleitores diferentes dos dos partidos de massas mas igualmente mobilizadores.
    • Caso do partido trabalhista: os comités do partido eram formados por sindicatos, mútuos, cooperativas, associações de intelectuais, que no domínio público aceitam agir em comum. São estes comités que designam os candidatos às eleições e que são responsáveis pelos mecanismos de propaganda.







Os partidos de massas:
  • Foi uma estrutura criada pelos partidos socialistas no início do Séc.XX.
  • Foi transportado de forma diferente para os partidos comunistas e fascistas.
  • O tipo socialista:
    • A sua estrutura está relacionada com dois factores:
      •  Financeiros/ necessidade de militância em massa para pagamento de cotas Þ para fazer aos custos que uma campanha eleitoral e as acções de propaganda implicam, eram necessários apoios financeiros que não seriam atribuídos pelas empresas privadas ou por pessoas abastadas. A solução encontrada era inscrever directamente no partido a maior massa possível de aderentes, que de modo permanente, pagasse uma cota regular que alimentasse a caixa eleitoral.
      • Necessidade de educação cívica das massas populares de modo a permitir-lhes o exercício pleno dos seus direitos.
    • São partidos que correspondem ao alargamento do sufrágio, que se estende quase à totalidade da população. Esta só pode exercer realmente os seus direitos se participar permanentemente na gestão do Estado (pode agora fazê-lo através dos partidos).
    • O partido está organizado em comités regionais/ locais onde se agrupam as pessoas dessa mesma região.
    • Em suma: recrutamento sistemático de aderentes, a sua doutrinação rigorosa, organização rígida com dirigentes emanados da base (subordinação dos eleitos ao directório partidário e a subordinação dos eleitores à vanguarda esclarecida dos militantes).
  • O tipo comunista:
    • São partidos de massas, mas os aderentes não estão repartidos do mesmo modo. Encontram-se repartidos por “células de empresa”:
      • Vantagens das células de empresa:
        • O contacto entre os membros é mais estreito e regular, podendo todos os dias receber directivas do partido e estabelecer combinações entre si.
        • As solidariedades do trabalho unem mais fortemente os membros de um grupo que nela se baseiam (há mais elementos de discussão que são relacionados com a política geral).
        • (As células têm poucos elementos, sendo que a solidariedade é mais forte no interior de um pequeno grupo).
    • São partidos fortemente hierarquizados e centralizados, muito disciplinados e com grande solidez ideológica.
  • O tipo fascista:
    • São partidos que se desenvolvem entre as GM.
    • Organizam-se de acordo com uma estrutura militar (que se explica pela natureza do combate em que estes partidos estão empenhados). Formam-se pequenas milícias (uma dezena de homens)/ unidades de acção militar.
    • Funciona como um exército privado, através do qual se procura tomar o poder pela força e conservá-lo do mesmo modo.
    • São partidos que se desenvolvem em contextos de democracia liberais e que, portanto, paralelamente ao recurso à violência usam meios de propaganda muito eficazes (fazem também uso dos mecanismos democráticos).

O papel dos partidos na representação
Þ os partidos desempenham um duplo papel na representação política:
  • Enquadram os eleitores (os representados).
  • Enquadram os eleitos (os representantes).
  • (são mediadores entre os eleitos e os eleitores). 

O enquadramento dos eleitores é feito segundo dois pontos de vista:
  • Enquadramento ideológico dos eleitores Þ os partidos asseguram que os eleitores possam conhecer de um modo relativamente claro a política que desejam e que define o mandato que eles confiam aos seus representantes. Os partidos ajudam à tomada de consciência política dos cidadãos.
  • Selecção dos candidatos Þ a maior parte dos candidatos eleitos são apresentados pelo partidos políticos (a este respeito, utilizam-se vários processos dependendo da estrutura do partido (eleições directas do militantes, congressos, decisão do comité central...). [podem existir candidatos independentes].
O enquadramento dos eleitos:
  • Contacto permanente entre os eleitos e os eleitores -  os eleitos têm todo o interesse em manter o contacto com os cidadãos a fim de assegurarem a sua reeleição. Tende-se a passar de uma concepção individualista em que cada eleitor dá um mandato pessoal ao seu eleito, para uma concepção comunitária, em que o conjunto dos eleitores que se identificam com o partido que os enquadra, mandata o seu candidato para os representar em bloco.
  • Enquadramento parlamentar dos eleitos Þ formação de grupos parlamentares, que asseguram principalmente a concentração entre os eleitos do partido. Isto levanta o problema da DISCIPLINA DE VOTO, que origina dois tipos/ distinção entre partidos:
    • Partidos flexíveis Þ cada um dos membros parlamentares vota da maneira que entende.
    • Partidos rígidos Þ partidos cujos eleitos devem votar do mesmo modo nos escrutínios essenciais.
    • (A disciplina de voto coincide com a concepção comunitária da representação: o conjunto dos eleitores que vota num partido confere o mandato ao conjunto dos deputados deste partido).

Os partidos “catch-all”
Þ são partidos de integração social, porventura mais adequados às exigências de uma sociedade pós-industrial.
Þ São partidos populares, interclassistas, adaptados às exigências funcionais de uma mediocracia.
Þ são partidos que têm tendência a perder bagagem ideológica, tentando alcançar todas as camadas das sociedade.
Þ são partidos extrovertidos cujo o principal objectivo é ganhar eleições.
Þ privilegiam os eleitores em detrimento dos militantes. Apoiam-se na ideia de que o eleitorado não pode ser sacrificado à “democracia interna dos congressos e comités omnipotentes”. 

Sistemas eleitorais e sistemas de partidos:
O sistema de partidos:
  • São um elemento essencial das instituições políticas de um país.
  • Regimes liberais/ democráticos Þ sistemas pluralistas.
  • Regimes autoritários Þ sistemas unipartidários.
  • Os sistemas pluralistas dividem-se em duas categorias:
    • Bipartidarismo – existem só dois partidos.
    • Multipartidarismo – existem mais do que dois partidos.

Bipartidarismo (sistema dualista):
  • O partido vencedor assegura a maioria do parlamento. Formação de governos apoiados numa maioria estável.
  • A existência ou não da disciplina de voto dos parlamentares introduz dois tipos de bipartidarismo:
    • Bipartidarismo puro Þ é o caso do Reino Unido, em que o primeiro-ministro está seguro que a sua maioria o apoiará durante toda a legislatura (há uma democracia “directa” porque os eleitores escolhem claramente uma maioria).
    • Bipartidarismo flexível/ aparente Þ é o caso dos EUA em que cada representante vota de acordo com a sua vontade, o que leva a que a linha que separe a maioria da oposição não é a mesma que separa os partidos (democracia “mediatizada”).

Multipartidarismo:
  • É um sistema em que existem vários partidos e em que, regra geral, é necessário recorrer a alianças para que se obtenha uma maioria parlamentar que permita a existência de um governo estável.
  • Existem três tipos de multipartidarismo:
    • Multipartidarismo puro Þ (Bélgica, Holanda) é necessário criar alianças entre os diferentes partidos para se formar governo.
    • Multipartidarismo de partido dominante Þ (Portugal, Suécia) um dos partidos tem um número de votos suficientes para formar governo sozinho.
    • Multipartidarismo bipolarizado (SISTEMA DUALISTA) Þ são situações em que se formam duas grandes coligações permanentes que apresentam aos eleitores um programa comum. (Ex. França PCF/PSF e UDF/RPR)

A influencia dos sistemas eleitorais de partidos (regras de Duverger):
  1. O escrutínio maioritário a uma só volta favorece o bipartidarismo.
  2. A representação proporcional tende para um sistema de partidos múltiplos e independentes uns dos outros.
  3. O escrutínio maioritário de 2 voltas tende para um multipartidarismo temperado por alianças.

Nota: estas regras esta hoje desactualizadas, pelo que se devem considerar como “tendências” e não com regra. 
A separação dos poderes em sentido político

Þ Não há democracia se não existir a separação dos poderes, ou seja, a distribuição dos poderes do Estado por diferentes órgãos. (ver art. 16ºCRP)

A separação dos poderes em Montesquieu (separação política) – os mitos
Þ A doutrina da separação dos poderes está formulada num capítulo do “Do espírito das leis”.
Þ É uma descrição um pouco romanceada da constituição.
Þ A teoria de Montesquieu foi, consciente ou inconscientemente, mal interpretada e compreendida:
  • 1º mito / Total independência dos poderes Þ a ideia de que Montesquieu teria concebido uma rigorosa, rígida e absoluta separação dos poderes, no sentido da quase total independência recíproca é falsa. Montesquieu queria fazer a descrição da constituição inglesa que não impunha de forma alguma esta independência absoluta.
  • 2º mito / Organização acética Þ o objectivo da separação dos poderes era tornar o Estado mais eficiente, baseando-se na ideia da divisão do trabalho. Isto é falso, o que Montesquieu pretendia alcançar objectivos políticos com a separação dos poderes. O objectivo da separação dos poderes era travar o despotismo, contribuindo para um maior equilíbrio entre classes.

Divisão clássica dos poderes do Estado (Montesquieu):
  • Poder legislativo  Þ fazer as leis e corrigir ou revogar as que estão feitas.
  • Poder executivo Þ prosseguir as diferentes finalidades públicas em execução das leis.
  • Poder judicial Þ resolução de litígios por aplicação da lei.
Nota: há quem considere a existência do poder político/governamental que tem a função de “direccionamento”; actividade directiva suprema do Estado (ex.: convocação de eleições, nomeação do 1ºM, está associado a actos previstos na constituição).

Interacção entre poder legislativo e poder executivo (Montesquieu)
Þ o poder legislativo e executivo foram arquitectados em profunda interacção:
  • Poder legislativo:
    • Foi distribuído por duas câmaras (a Câmara dos Nobres e o Corpo dos Representantes) que têm poderes de veto mútuo.
    • Cada uma tem as suas assembleias e as suas deliberações à parte visto que têm interesses diferentes.
    • Estas câmaras produzem as leis e controlam a sua aplicação por parte do executivo. Podem julgar os crimes políticos dos membros do executivo.
    • Compete-lhes ainda a função orçamental, criação de impostos, estabelecimento da força armada que deve caber ao Rei.
  • Poder executivo:
    • Direcção política do Estado (inclui função federativa: relações diplomáticas e defesa nacional e função administrativa: aplicação das leis).
    • Poder de veto às estatuições legislativas, poder de convocar o parlamento e determinar as durações das suas assembleias.
Þ Assim, percebe-se que Montesquieu pensou os poderes como poderes separados mas interdependentes, reciprocamente interferentes e controlados.
A realização da constituição mista através da separação dos poderes
  • Separação dos poderes em sentido político Þ quando Montesquieu teoriza a separação dos poderes, fá-lo com base numa distribuição/co-titularidade dos poderes das diferentes classes sociais (rei/ aristocracia/povo) recuperando o paradigma clássico da constituição mista (o regime ideal é aquele que consegue reunir características da monarquia, aristocracia e república).
  • A ideia essencial de Montesquieu não e a separação dos poderes no sentido jurídico do termo, mas o que poderíamos chamar o “equilíbrio das forças sociais”, condição da liberdade política [objectivo político].

O sentido político da independência do poder jurisdicional:
  • Montesquieu defende uma rígida separação entre o poder judicial e o poder político.
  • O poder jurisdicional é titulado por 2 organismos:
    • Tribunais (populares) Þ julgam o povo.
    • Câmara dos nobres Þ julga os nobres.
  • Nenhuma das potências sociais interfere na administração da justiça das outras.
  • Dois modelos diferentes de poder judicial: um assente radicalidade democrática e outro aristocrático e corporativista.
  • Nota: o rei é imune, não poder ser julgado e também não pode julgar.

Regras dos tribunais populares: 
  • Rigoroso cumprimento da lei.
  • Regra da não permanência do tribunal Þ o poder de julgar não deve ser atribuído a um corpo permanente, devem ser escolhidas pessoas com base em critérios definidos por lei sendo que o tribunal não deve durar mais do que o requerido pela necessidade.
  • Regra da extracção popular dos juízes Þ os juízes são emanados do corpo do povo.
  • Faculdade do acusado para poder escolher/ vetar os juízes.
  • A composição dos tribunais converge na não condenação do poder judicial a um certo estado ou uma certa profissão, o que denota uma certa preocupação do autor face à tentação corporativa.
  • Modo de actuação estritamente executivo (subordinação às leis).
  • A legitimidade dos juízes está, não no facto de aplicarem a lei, mas na origem plebeia dos mesmos, no escrutínio popular e na possibilidade de veto/escolha do juiz.
Tribunais da Câmara dos Nobres:
  • Ao invés do cumprimento rigoroso da lei, recorre-se mais à equidade. Não se verifica um modo de actuação estritamente executivo.
  • Corpo estático (câmara dos nobres), ou seja, não existe só para o julgamento em concreto.
  • A legitimidade do juiz está a montante, assentando numa lógica corporativa.








A teoria da separação dos poderes segundo Locke
Þ O Estado existe para proteger a “property” (direitos fundamentais).

Poderes do Estado:
  • Poder executivo Þ abrange simultaneamente a execução administrativa e judicial.
  • Poder legislativo Þ produzir regras gerais e abstractas no sentido de conservar a “property”,
  • Poder federativo Þ poder diplomático ligado às relações.
  • Prerrogativa real Þ “poder de obrar segundo a discrição para o bem público sem a prescrição da lei e alguma vez até, contra ela”.

O conceito Lockeano de acto legislativo:
  • O acto de legislar é reservado ao parlamento.
  • É absolutamente necessário, para ser lei, o consentimento da sociedade.
  • A lei tem que ter as seguintes características:
    • Generalidade Þ aplicar-se a todos (dimensão liberal da justiça).
    • Estabilidade/ Durabilidade.
    • Determinação (clareza).
    • Publicidade.

Direitos fundamentais:
  • São direitos que integram o “estatuto jurídico-material básico do homem e do cidadão.”
  • Direitos básicos do Homem enquanto pessoa (ex. Igual dignidade pessoa humana).
  • São direitos que todos têm que respeitar, inclusive o Estado.
  • São direito que constam de um catálogo constitucional ou de documento com igual dignidade e valor. Ex “petition of rights”, “bill of rights”, “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”.

As 4 gerações de direitos fundamentais:
  1. (séc. XVIII):
    1. Direitos civis associados às liberdades individuais, às esferas de autonomia dos indivíduos em face do poder do Estado.
    2.  Apelam à abstenção do Estado.
    3. Direitos fundamentais: liberdade, segurança, propriedade. 
  2. (Séc. XIX):
    1. Processo de democratização (direitos políticos).
    2. Transformações sociais e económicas decorrentes dos processos de industrialização.
    3. Poderes políticos: alargamento do sufrágio e direito de participação eleitoral (activa e passiva); direito de participação na vida política.
    4. Tem um papel importante no âmbito dos direitos de defesa (liberdade religiosa, liberdades das minorias, liberdade de imprensa).
    5. Vêm permitir que as liberdades da 1ª geração possa ser exercidas de uma forma objectiva.
    6. A democracia torna-se condição e garantia dos direitos fundamentais: estes vão até onde e são exercidos na medida em que contribuem para o fortalecimento das instituições democráticas.
    7. Direitos protegidos: liberdade de expressão, de imprensa, de informação, de associação, de manifestação.
  3. (Séc. XX):
    1. Socialização, os direitos fundamentais passam a ter uma função social.
    2. Contexto: grandes injustiças sociais, grande desigualdade, condições de trabalho precárias...
    3. A importância do bem-estar social ganha peso. Começa a exigir-se do Estado um sistema de prestações nas várias áreas da vida social.
    4. Direitos sociais:
                                                              i.       Mais equilíbrio na distribuição da riqueza.
                                                            ii.      Os direitos perdem um carácter individualista e passam a estar dependentes de um enquadramento social imperativo.
                                                          iii.      São direitos sob reserva de possibilidade social (dependem dos recursos financeiros disponíveis).
                                                          iv.      Tende a abandonar-se o conceito de liberdades abstractas para se falar em liberdades concretas. Assim, a consagração de um direito tende a ser acompanhada de uma imposição ao Estado.
  1. (Séc. XXI):
    1.  Þ são direitos que surgem no contexto da sociedade tecnológica, globalizada, de informação. É também uma sociedade de risco: perigos ecológicos, genéticos.
    2. Surgem direitos de solidariedade: protecção da natureza, do sistema ecológico, património cultural, direitos dos consumidores.
    3. São direitos circulares: envolvem todos os direitos e todas as pessoas e o Estado, inclusivamente as gerações futuras.
    4. Exemplos: direito à privacidade, à identidade genética, à imagem, à palavra, direitos de informação perante a administração pública.
    5. Protecção da dignidade humana contra os perigos que resultam das estruturas de poder.
















O caso português

Separação dos poderes:
  • Sentido organizatório:
    • AR (poder legislativo).
    • Governo + administração pública + autarquias (poder executivo).
    • Tribunais (poder judicial).
    • A função política surge dividida pelos 3 órgãos estando mais concentrada no PR.
  • Sentido formal:
    • [função Þ órgão Þ forma]
    • legislativa Þ AR Þ Leis (leis + decretos leis (governo) + decretos legislativos regionais (assembleia regional)).
    • Executiva Þ governo/ administração Þ acções administrativas (actos administrativos, regulamentos, contrato administrativo).
    • Judicial Þ tribunais Þ sentença (singular ou acórdãos dos tribunais colectivos).

A independência dos tribunais – estatuto dos juízes
  • O juiz hoje não está totalmente subordinado à lei. Se uma lei for inconstitucional, o juiz pode desaplicá-la. Por outro lado, se uma lei não respeitar os princípios fundamentais de Direito, ela não tem validade. Por outro lado, há técnicas legislativas como os conceitos indeterminados e as cláusulas gerais que necessitam de valoração por parte do juiz. Assim, em cada julgamento o juiz constrói direito; o juiz não está totalmente subordinado à lei. [Nota: o juiz tem é que aplicar o Direito].
  • O juiz tem que ser independente, não pode ser susceptível a pressões externas. Para tal, o estatuto do juiz consagra:
    • Princípio do Juiz natural / princípio da inamovibilidade do juiz – à partida o juiz fica “dono” de uma causa, esta não lhe pode ser retirada.
      • Possibilidade de recusa e levantamento da suspeição do juiz (quando o juiz não reúne os requisitos de idoneidade e independência para ser detentor de uma determinada causa).
    • Princípio da circulação do juiz Þ para que não crie raízes, conhecimentos.
    • Princípio da irresponsabilidade do juiz Þ o juiz não pode ser responsabilizado pelas suas sentenças.
    • Tudo o que está relacionado com a carreira dos juízes é feito não por órgão de governo mas por conselhos autónomos (CSMG, CSTAF). 

A legitimidade democrática dos juízes
  • Poder-se-ia dizer que o facto do poder de julgar não advir do povo é um princípio contrário à democracia. No entanto, a legitimidade dos juízes prende-se com a ideia de Estado de Direito onde é vital a existência de um julgamento imparcial e independente, feito por indivíduo com competência técnico-científicas e formação profissional. [de todo o modo, não deixa de se reconhecer a conveniência de fazer participar juízes leigos ao lado de juízes profissionais em certo tipo de causas. É o caso dos jurados].
  • A legitimidade é ainda fundada na vinculação às leis (ainda que não total) e no respeito dos deveres estatutários do cargo. 

Os sistemas de governo

O parlamentarismo – raízes históricas dos parlamentarismo britânico

Þ Magna Carta – consistiu numa reivindicação de direitos e franquias tradicionais que se exigia ao rei. Reivindicação de um governo segundo as leis e os usos estabelecidos, contra o arbítrio e a mera vontade do monarca.

Þ Petition of rights (1628) – assinada por Carlos I (que sucede a Jaime I) em que se reivindicam os poderes do parlamento.

Þ Commonwealth, é proclamada a República mas esta acaba por cais (1658). É assinado o “instrument of government”(primeira constituição escrita).

Þ Em 1660, é restaurada a monarquia (Carlos II).

Þ Jaime II, católico, tendência absolutista. É exilado.

Þ Guilherme de Orange e Maria, sucedem a Jaime II – “Glorious revolution” (1688), mas o parlamento obriga-os a assinar a “Bill of rights(1689):
  • Reconhecimento dos direitos dos cidadãos, do parlamento e dos tribunais.
  • Início definitivo e irreversível da parlamentação e democratização de Inglaterra.

Þ Em 1714, acaba a dinastia Stuart, e ascende ao trono o Princípe Eleitor de Hannover, que acaba por nomear o Lord Walpole como 1º ministro.

Þ Em Inglaterra passam a vigorar 2 princípios no que respeita à delegação do poder:
  • The king can do no wrong – o rei não pode ser responsabilizado porque não pode actuar sozinho (Necessita de REFERENDA MINISTERIAL – assinatura dos ministros que validam os actos do rei).
  • The king cannot act alone – qualquer acto do chefe de Estado tem que ser assinado por um dos ministros.

Þ Numa 1ª fase, os ministros do rei iam ao parlamento quando queriam. Mas, começa a exigir-se que os ministros venham ao parlamento explicar as medidas. Os ministros defendiam-se argumentando que não eram eleitos democraticamente e que, portanto, não tinham responsabilidades perante o parlamente. Dá-se então a instrumentalização política do instituto do “impeachment”, ou seja, o parlamento ameaça utilizar um instituto penal para obter fins políticos, pressionando desta forma, a ida dos ministros ao parlamento. Nota: o impeachment dá origem às moções de censura.

Þ Em 1911, a câmara dos Lordes perde poder, passando a ser uma câmara secundária e, mais tarde, apenas um corpo consultivo de debate.



A monarquia constitucional inglesa, no seu caminho para o parlamentarismo passou por 3 fases:
  1. Monarquia limitada.
  2. Monarquia orleanista Þ situação em que por força da instrumentalização política do “impeachment” o gabinete do rei já responde perante o parlamento.
  3. Monarquia parlamentar (Séc. XVIII) Þ o rei passa a ser uma figura simbólica ou protocolar, sendo que o governo passa a ser responsável apenas perante o parlamento.

Características estruturais do sistema de governo parlamentar:

Embora haja uma grande variedade de sistemas parlamentaristas, há 3 características que são transversais a todos eles:
  • Poder executivo dualista:
    • Chefe de Estado:
      • Monarca hereditário ou presidente da república eleito por um colégio eleitoral.
      • Detém pouco poder executivo – poder simbólico/ representativo: tem de cumprir as decisões dos restantes órgãos de soberania.
      • Representa o Estado no estrangeiro.
    • Governo (Gabinete):
      • É constituído por um conjunto de ministros e por um primeiro-ministro (chanceler).
      • Assume a generalidade das funções executivas.
      • As decisões são feitas / tomadas em conselho de ministros Þ o governo funciona como um todo – tem carácter colegial –, pelo que a condenação da actividade de um ministro é encarada como a condenação de todo um gabinete.
  • Responsabilidade do gabinete perante o parlamento: 
    • Investidura parlamentar Þ o gabinete depende do parlamento para a entrada em funções:
      • Investidura expressa Þ apresentação do programa, eleição do chanceler no parlamento, aprovação da composição do governo.
      • Investidura tácita Þ o governo apresenta o seu programa mas este não é sujeito a votação. Facilita a entrada no poder dos governos maioritários.
    • O parlamento pode demitir o governo (caso este perca uma moção de censura apresentada pelo parlamento).
    • Em certas circunstâncias o governo é obrigado a pedir ao parlamento uma moção de confiança (e se não a obtiver também tem de se demitir)
    • A sobrevivência do executivo e dos projectos do executivo dependem do parlamento.
  • O gabinete tem o poder de dissolver o parlamento: esse poder estende-se exclusivamente à parte eleita do Parlamento e destina-se a impedir a supremacia absoluta do poder legislativo sobre o executivo. TRATA-SE DE UM PODER MATERIAL, formalmente, o poder de dissolução do parlamento pertence ao chefe de Estado mas este depende de referenda ministerial, pelo que, na prática é o governo que pede ao chefe de Estado a dissolução do parlamento ( “Checks and Balances”).


Nota: sistemas presidenciais Þ executivo dualista, governo responsável perante o parlamento, parlamento formalmente responsável perante o chefe de Estado e materialmente responsável perante o governo.


Relação entre os poderes
            O sistema parlamentarista estabelece uma separação dos poderes que exige a colaboração institucional e harmonizada dos diversos órgãos de soberania (não há uma separação tão rígida como nos sistemas presidencialistas). Essa exigência pressupõe a existência de mecanismos de “checks and balances” que FORCEM uma colaboração institucional harmoniosa: por um lado, o parlamento pode dissolver o governo, por outro, o governo pode (através do Chefe de Estado) dissolver o parlamento caso se crie uma situação de bloqueio à governação. 



Sistemas parlamentares bipartidários e pluripartidários

Sistemas parlamentares bipartidários (de gabinete) [UK]
  • Caracterizam-se pela existência de dois grandes partidos que concorrem no acto eleitoral.
  • O partido que tem a maioria é o partido que forma o governo (e o seu presidente ou secretário-geral é o 1.º ministro)
  • Vantagens:    
    • Homogeneidade do executivo Þ os seus membros são recrutados num único partido.
    • Estabilidade do gabinete Þ o governo pode aplicar todo o seu programa porque é apoiado pela maioria do parlamento.
    • “Democracia directa” Þ no acto eleitoral, ao votar num partido, o eleitor está também a votar um governo, com um determinado programa, ao qual irá exigir o cumprimento das promessas.
  • Desvantagens:
    • Para além do executivo, o gabinete acaba por controlar as iniciativas legislativas, pois é apoiado pelo partido da maioria (a menos que haja uma grande crise), o que contraria a atenuação dos poderes do governo que o parlamento deveria fazer num sistema parlamentar. 
Nota: ao contrário do que se esperaria, o instituto da dissolução do parlamento continua a ser usado, mas este torna-se num instrumento de calendarização eleitoral (é politicamente manipulado de modo a garantir a continuidade em funções do governo ou do partido do governo).

Sistema parlamentar multipartidário (de assembleia) [Bélgica, Holanda,. Alemanha]
  • Executivo instável Þ os acordos partidários necessários para formar um governo, são frágeis, podendo romper-se com facilidade.
  • Executivo heterogéneo Þ inclui membros de diferentes correntes ideológicas.
  • Campanhas eleitorais tendencialmente demagógicas Þ as promessas eleitorais são feitas num quadro em que o partido tem maioria, mas tal é claramente improvável, o que permite uma certa desresponsabilização do poder político face ao modo de condução do país, pois este desculpa-se com o facto de não ter uma maioria e de terem sido os parceiros de governo os responsáveis por eventuais maus resultados. 
  • “Democracia mediatizada” Þ ao contrário do que acontece nos parlamentarismos bipartidários, a democracia não assume um carácter directo. Caso o eleitor vote num partido que não obtém uma maioria, ele não sabe quem serão os parceiros governamentais.

Exemplos de “derrapagens” de sistemas parlamentares multipartidários:
  • III República Francesa (1875-1940) Þ “Vichy” foi uma constituição provisória que ficou a vigorar. A dissolução nunca foi usada (embora fosse possível), mas houve uma instabilidade governativa permanente, uma instabilidade crónica.
  • I República Italiana (1947 – 1990/92) Þ é outro caso de uma instabilidade crónica.

Multipartidarismo racionalizado (Alemanha e Espanha)
  • São países onde existe multipartidarismo mas em que há um conjunto de regras que permitem maior estabilidade política:
    • Moção de censura construtiva Þ o parlamento só pode aprovar uma moção de censura ao governo se apresentar uma alternativa.
    • Clausulas constitucionais:
      • Clausula barreira (caso alemão) Þ partidos com menos de 5% não entram no parlamento.
      • Partidos não democráticos não podem concorrer a eleições.

Conclusão: A estabilidade dos sistemas parlamentaristas depende do número de partidos com “expressão” que vão a eleições. No caso de um sistema bipartidário, assiste-se a uma grande estabilidade governativa mas os sistemas de “checks and balances” são menos eficazes, pondo em causa o pluralismo democrático. Por outro lado, se vários partidos vão a eleições, “fragmentando-se” o parlamento, a estabilidade governativa é muito menor porque são necessárias alianças entre diferentes correntes políticas, com ideais diferentes e, portanto, com perspectivas diferentes acerca dos modelos de governação (é necessária uma grande disciplina de voto nos partidos e que as direcções dos partidos aliados não tenham desentendimentos para que o governo “aguente” até ao fim da legislatura). Aliás, um outro problema que é frequente nestes tipos de governos é o da paralisia (indecisão) a que os governos ficam “condenados” quando as forças políticas que os sustentam lhes retiram apoio. Nesta situação, podem fazer novas alianças, mas ficam sempre sujeitos às pressões que frequentemente são exercidas por grupos ou facções.

O sistema directorial suíço:
  • Há um parlamento federal (Confederação Helvética), constituído por 2 câmaras:
    • Uma câmara que representa os cidadãos.
    • Uma câmara que representa os 25 Cantões.
  • O parlamento elege o directório (7 elementos) mas depois este não pode mais ser destituído.
  • É um sistema que permite grande estabilidade, no entanto, é importante sublinhar que a Suíça é uma democracia referendária e que, portanto, depende muito da participação directa dos cidadãos.

A experiência semi-parlamentar israelita
  • Existem eleições para o parlamento e para o primeiro-ministro (eleito uninominalmente).
  • O problema é que muitas vezes o partido do 1º ministro não tinha maioria, logo ele era uma espécie de “general sem tropas”.
  • Ambos eram eleitos, mas como não havia maioria absoluta, havia tendência para o primeiro-ministro dissolver o parlamento, ou o parlamento demitir o Primeiro-ministro, caindo todos.
  • Foi um sistema que gerou a ingovernabilidade total e que acabou por ser abandonado.

Sistema de governo presidencial

Þ Tem o seu paradigma no regime político dos Estados Unidos e veio influenciar a experiência constitucional democrática do continente americano.

Características:
  • Não existe distinção orgânica entre chefe de Estado e Chefe de governo Þ o presidente é o chefe de governo e tem o poder de direcção política. (os membros do gabinete – secretários – são concebidos como colaboradores do presidente e executores da política por ele definida e pela qual é responsável, não têm autoridade política própria sendo dirigentes administrativos dos seus departamentos ministeriais e os conselheiros e colaboradores do Presidente a nível governamental). 
  • O presidente é eleito por sufrágio universal Þ o presidente é eleito directamente ou através de um colégio eleitoral com legitimidade democrática. Assim, o presidente tem legitimidade democrática.
  • Separação rígida entre o presidente e o parlamento:
    • O presidente não é responsável perante o parlamento.
    • O presidente não pode dissolver o parlamento.
    • Em casos extremos, em que o presidente tenha praticado actos ilícitos, pode recorrer-se ao “impeachment” [este instituto é até aplicado a qualquer titular de cargo político].
    • (A autonomia do presidente face ao órgão legislativo é limitada pelo princípio da separação dos poderes, existindo matérias onde o presidente necessita do apoio do parlamento).
  • Necessidade de consertação entre legislativo e executivo.

A origem do sistema presidencial – o constitucionalismo americano

Þ A animosidade das colónias americanas contra a mãe-pátria, inicia-se com o fim das guerras com os franceses e holandeses. Inglaterra decide pôr em prática uma serie de reformas destinadas a obter os gastos que até aí haviam pesado sobre a metrópole.

Þ A medida que mais problemas suscitou foi o STAMP ACT votado pelo Parlamento em 1765, que impunha nas treze colónias o uso de papel selado inclusivamente nos anúncios, cartas de jogar, almanaques e jornais.

Þ Neste contexto, é convocada uma assembleia – CONGRESSO DA LEI DO PAPEL SELADO – que votou uma declaração na qual se considerava inaceitável a imposição de impostos sem que os colonos fossem ouvidos, reclamando-se assim, a falta de representatividade dos colonos.

Þ O parlamento acaba por revogar a lei, mas reafirma o poder de legislar sobre as colónias. Nos anos seguintes faz uso deste poder que volta a ser contestado pelos colonos, mas desta vez, a resposta é severa, publicando-se, em 1774, 5 leis com intenção punitiva (INTOLERABLE ACTS).

Þ Consequentemente, e após dois congressos continentais e o inicio de uma guerra com a Grã-Bretanha, a 4 de Julho de 1776 é declarada a independências das colónias americanas (13 Estados independentes).   

1781 Þ confederação de Estados – aceitam que a defesa e a política externa possas consertar políticas comuns.

1782 Þ termina a guerra com Inglaterra.

1787 Þ Começa a Convenção (é um parlamento sem convocação régia) para a feitura de uma constituição única para os Estados. É assinada a Constituição.

1789 Þ é eleito o primeiro presidente.

Características da constituição:
  • Introduz um sistema presidencial.
  • A lei não serve apenas para defender o cidadão mas também serva para o oprimir.
  • A razão pela qual os tribunais vão poder controlar a constitucionalidade das leis, está relacionada com a ideia de que estas podem agredir os direitos do cidadão.
  • Adopção de um regime presidencial (2 motivações: desconfia-se da omnipotência do parlamento; substituto da coroa).
  • Estabelece-se um regime de fiscalidade das leis.

Princípios fundamentais do Direito Político norte-americano:
  • Nenhum estado poderá pôr em vigor leis que restrinjam os privilégios e imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos.
  • Ninguém pode ser privado da vida, liberdade ou propriedade sem observância do devido processo legal.
  • Todos têm direito à igualdade de protecção jurídica.
  • (= garantia das liberdades e dos direitos dos cidadãos, garantia de igualdade perante a lei, garantia de processo adequado e justo, garantia de equiponderação dos encargos e sacrifícios individualmente exigidos a cada cidadão e dos direitos e vantagens que lhe são concedidos). 




Diferenças entre regime presidencialista e regime parlamentar

  1. O executivo não está dividido em dois elementos separados.
  2. O presidente é eleito por sufrágio universal (directo ou indirecto) o que o coloca, em termos de legitimidade democrática ao nível do parlamento. Mas no primeiro, a representação está concentrada no presidente enquanto que no segundo caso ela se encontra pelos membros do parlamento.
  3. No sistema presidencial, Presidente e Parlamento são independentes um do outro, o que conduz a um governo estável.
    1. No entanto, o facto do regime presidencial conduzir a um governo estável não significa necessariamente que conduza a um governo forte. Embora o presidente goze de ampla liberdade, este está limitado pelos quadros da lei e do orçamento (necessitando para tal do apoio do congresso e do senado, o que poderá ser mais difícil do que, por exemplo, para o PM Britânico conseguir o apoio maioritário do parlamento uma vez que tem grande influência no partido dos deputados que sustentam o governo).

O presidencialismo – deformação do sistema presidencial

  • Enfraquecimento dos poderes do parlamento e hipertrofia dos poderes do presidente.
  • Aplica-se sobretudo a determinados regimes latino-americanos que adoptaram aparentemente as instituições constitucionais americanas mas que ao serem transpostas para uma sociedade culturalmente diferente semi-colonizadas pela economia vizinha, o que torna inviável uma democracia liberal. 
  • A maior parte das nações latino-americanas conhecem ditaduras puras e simples camufladas pelas instituições presidenciais.























Sistema de governo semi-presidencial

Características:
  • Trata-se de um modelo surgido mais tardiamente na evolução das instituições políticas democráticas, como resposta às dificuldades do sistema parlamentar, experimentadas intensamente em alguns países europeus. Uma sua prefiguração pode encontrar-se na “monarquia orleanista” vigente num período do séc XIX.
  • Executivo dualista:
    • Chefe de Estado (presidente) – eleito por sufrágio universal, o presidente dispõe de faculdades próprias não necessitando de referenda do Governo (ex. Direito de dissolver o parlamento).
    • Governo – órgão colegial, chefiado por um primeiro-ministro, cabe-lhe a condução política geral do país (condução da política estadual). É  politicamente responsável perante o presidente. 
  • Governo politicamente responsável perante o parlamento – necessita da aprovação do parlamento dos seus actos legislativos, orçamentos... o parlamento pode ainda demitir o governo caso aprove uma moção de censura ou rejeite uma moção de confiança.
  • Assenta numa dupla legitimidade democrática directa:
    • Legitimidade do Presidente Þ o poder do presidente não é propriamente o de condução política mas mais de MODERADOR (promotor e garante da operacionalidade e eficácia da função governativa e da sua fidelidade).
    • Legitimidade do Parlamento. 
    • (Esta dupla legitimidade política do governo implica uma dupla responsabilidade do governo: perante o presidente e perante a assembleia)
  • O principal problema levantado com este sistema é o da coabitação:
    • Dependência do governo face ao parlamento e face ao presidente.
    • Caso mais particular em que as maiorias eleitorais do parlamento e do presidente são divergentes.
  • É um sistema que tende a oscilar entre uma versão mais presidencial e outra mais parlamentar, consoante o maior ou menor “peso” do presidente. O papel do presidente tende a ser mais visível quando não existe uma maioria parlamentar ou quando ele for o líder natural da maioria parlamentar. 












Raízes históricas do sistema semi-presidencialista

A génese da Constituição de 1958:
  • Veio responder à situação de séria crise institucional em que entrara a IV República Francesa, especialmente agravada pelo problema argelino. Tratava-se, no plano estrutural e institucional, de uma reacção de cerca de 8 décadas de parlamentarismo de assembleia, já herdado da III República, sempre marcado por uma forte instabilidade e por uma falta crescente de credibilidade das instituições políticas, tanto parlamentares como executivas.
  • A revisão constitucional (da constituição de 46) traduziu-se numa verdadeira transferência de competência constituinte. [foi votada em referendo]. Esta decorreu de uma exigência sine qua non do General De Gaulle, para voltar à política.
  • O poder organizatório das instituições foi quase completamente exercido pelo executivo.

Os poderes presidenciais na versão originária:
  • Entre as diferentes forçar que debateram a constituição (De Gaulle, Michel Debré, ministros como Bayeux e Épinal) resultou um compromisso em que ao Presidente da República ficou cometida a função de assegurar o regular funcionamento dos poderes públicos e a continuidade do Estado.
  • Ruptura com a lógica parlamentarista:
    • As normas concernentes ao Presidente da República têm precedência sistemática sobre as restantes normas organizatórias da constituição.
    • Evidência de poderes presidenciais: nomeação do governo, dissolução do parlamento, promulgação das leis e assinatura dos decretos, declaração de estado de excepção, ampla circunscrição da referenda ministerial, assunção de poderes de excepção, envio de mensagens ao presidente, envio de mensagens ao parlamento, convocação de referendos, a nomeação de membros para o Conselho Constitucional, Presidência de reuniões do Conselho de ministros.
    • (Aquilo que retirava alguma legitimidade democrática ao presidente era o facto de ser eleito por colégio eleitoral ad hoc – isto deve –se ao medo eleitoral dos comunistas e dos votantes das colónias. No entanto a sua legitimidade transcendia a simples eleição no e pelo Parlamento típica dos sistemas parlamentares republicanos).

A Revisão constitucional de 1962:
  • Vem iluminar a vertente presidencial do sistema:
    • Eleição directa do chefe de Estado.
    • Possibilidade de convocação de referendos pelo Chefe de Estado acerca de matérias constitucionais (baseando-se no art. 9º da mesma constituição. Esta posição era controversa uma vez que a vontade do legislador era claramente a de que uma revisão constitucional fosse feita nos moldes do art. 89º - a revisão deve ser proposta pelo parlamento ou pelo chefe de Estado (sob proposta do governo) + votação propriamente dita em cada uma das câmaras parlamentares + eventual submissão a referendo do texto.)



A construção do modelo semipresidencial a partir da experiência francesa
  • A Adopção de um modelo semipresidencial visou sempre substituir uma legitimidade particularmente forte do Chefe de Estado anterior à sua instauração:
    • República de Weimar (1919) - Dar legitimidade a Hindenberg.
    • Finlândia (1919) - Torna-se independente da Rússia, surgindo uma constituição claramente semipresidencial.
    • Áustria (1920) – sistema semipresidencial.
  • Possíveis teses acerca do sistema de governo francês:
    • Parlamentarismo – não pode ser aceite em caso nenhum.
    • Ultra-presidencialismo – a ideia de que  o presidente francês dispõe dos poderes do presidente dos EUA quando dispõe de maioria no parlamento. E quando tal não acontece, há uma disputa entre governo e presidência para um deles alcançar a presidência (não existe verdadeiramente coabitação, são interregnos em que se disputam legitimidades). A coabitação longa entre Chirac e Jospin vem desmentir esta tese.
    • Presidencialismo parlamentar – pretende-se veicular a ideia de que o verdadeiro árbitro do sistema é o eleitorado que em conjuntura lhe amplia ou reduz os poderes (de acordo com os resultados das legislativas).
    • Semipresidencial (Duverger e Rangel) – o sistema da V República francesa é o mais presidencialista dos sistemas semipresidenciais e o mais governamentalista dos sistemas parlamentares. Fora dos períodos de coabitação, o chefe do executivo é o chefe de Estado, quando há coabitação há uma diarquia entre governo e presidente (e não parlamento/ presidente). 
    • Volpi propõe 3 tipos de semipresidencialismo:
      • Semipresidencialismo com funcionamento parlamentar (Irlanda, Islândia, Áustria).
      • Semipresidencialismo com diarquia no executivo (Portugal, Finlândia).
      • Semipresidencialismo Francês (Polónia, Roménia, Ucrânia).
      • (Volpi considera que não se pode abandonar o critério estrutural-formal para classificar um sistema de governo, por mais anómalo que seja o seu funcionamento prático).
      • Rejeita a ideia de que o semipresidencialismo é uma espécie de sistema camaleão – ora funciona como sistema parlamentar ora como sistema presidencial.
    • Sartori – recusa expressamente uma teorização que dê prevalência a elementos constitucionais escritos e abstraia do funcionamento real e efectivo dos sistemas.
      • Considera que é o quadro de relações entre chefe de Estado e Chefe de governo que permite a autonomização dos sistemas semipresidenciais (esta relação depende da correlação de forças e da sinalização das maiorias no parlamento).
      • Rejeita que os sistemas vigentes na Irlanda, Áustria, e Islândia não devem ser considerados semipresidenciais. (Tal como Duverger).
      • Considera que o sistema semipresidencial  é o mais praticável.
      • Rejeita a ideia de que o semipresidencialismo é uma espécie de sistema camaleão – ora funciona como sistema parlamentar ora como sistema presidencial.
      • Mesmo numa situação de coabitação,  o presidente mantém poderes relevantíssimos não só relativamente a actos previstos nos quadros político-constitucionais mas inclusivamente em domínios reservados como o da política externa e da defesa.

A aceitação da tese do semipresidencialismo como um sistema camaleão:
  • Numa situação de sintonia de maiorias, o presidente dispõe de mais poder do que o seu homólogo americano (presidencialização do sistema).
  • Numa situação em que há uma sintonia de maiorias, mas o presidente não é o líder “natural” do partido maioritário (Guterres e Sampaio) o sistema perde muito do seu pendor presidencial.
  • No entanto, nunca se chega ao apagamento presidencial do parlamentarismo puro mas pode ultrapassar-se o protagonismo presidencial do sistema norte-americano.

As formas de regime semipresidencialista

Nota: a grande diferença entre os sistemas parlamentares e os sistemas semipresidenciais é que, no segundo caso, o presidente é eleito por sufrágio universal ficando com a mesma legitimidade da Assembleia da República e acima da legitimidadade democrática do governo. Como tal, o chefe de Estado passa de uma figura simbólica (dependente de referenda ministerial) para uma figura com reais poderes e autonomia, atribuídos pela constituição e legitimados pela eleição directa do mesmo.
As formas de regime semipresidencialista (Duverger):
  • Regime semipresidencialista coincidente com parlamentarismo maioritário:
    • Existência de uma maioria estável e homogénea, à qual pertence o Presidente da República, que é o seu líder supremo.
    • É o caso da França desde 1962.
    • Neste caso o sistema semipresidencialista orienta para o parlamentarismo maioritário, contribuindo a eleição do presidente para cristalizar os partidos em duas grandes coligações.
    • Neste caso, o sistema funciona bem porque há uma coincidência entre a maioria parlamentar e o presidente e, consequentemente, entre o presidente o chefe de governo.
    • Arrisca-se a ficar paralisado se o primeiro-ministro for sustentado por uma maioria oposta à do chefe de Estado, a menos que haja uma redução do papel do presidente.
  • Regime semipresidencialista com parlamentarismo não maioritário:
    • Neste caso, a estabilidade do presidente não basta para garantir a estabilidade do governo.
    • A solução poderá ser a formação de governos centristas, mas a experiência  da Alemanha de Weimar e da Finlânfia conduzem conclusões opostas:
      • Weimar – limitou-se a desempenhar um papel apagado em tempo normal tendo-se tornado um semi-ditador em tempo de crise.
      • Finlândia – o presidente desempenha regularmente um importante papel dentro do Estado mas não consegue estabelecer ou manter maiorias parlamentares. (governos duram em média uma ano).
Teoria do regime semipresidencialista (Duverger):
  • Está presente em: Portugal, Finlândia, Islândia, Áustria, França, Irlanda.
  • As prerrogativas constitucionais do Presidente (desenham-se claramente três blocos): 
    • França:
      • O chefe de Estado é mais árbitro do que um governante.
      • Pode devolver as leis ao parlamento, dissolver a AN, recorrer a um referendo, Nomeação do primeiro-ministro, nomeação de altos funcionários.
      • Poderes quase ditatoriais em circunstâncias excepcionais.
    • Irlanda:
      • Poderes muito fracos. No entanto as suas prerrogativas excedem as de um chefe de Estado num sistema parlamentar (ex.: verificação da constitucionalidade de uma lei votada pelo parlamento, convocar uma ou ambas as câmaras para uma sessão extraordinária, dirigir uma mensagem aos deputados ou senadores…).
    • Alemanha (1919-1933), Potugal e Áustria:
      • O chefe de Estado pode destituir o primeiro-ministro independentemente de qualquer voto de confiança ou de censura.
      • Dupla responsabilidade do governo: perante o parlamento e perante o presidente.
      • No caso de Portugal e Alemanha, o presidente tem ainda o poder de bloquear as lei por meio dum veto. (não é uma simples devolução).
      • O presidente tem mais um papel de governante do que de árbitro.

Características do regime francês:
  1. Natureza semipresidencialista.
  2. Carácter de parlamentarismo maioritário.
  3. Coincidência entre orientação política parlamentar e orientação política do chefe de Estado.
  4. O Presidente passa a ser o chefe da maioria.


Traços fundamentais do sistema de governo português:

  • Argumentos para a rejeição do sistema português como sistema semipresidencial:
    • Grande reserva quanto à possibilidade científica de autonomização de um terceiro sistema. (argumento taxionómico)
    • Se tal autonomização é possível, estes teriam que ser regimes mistos em que avulta o lado presidencial do sistema, ora no sistema português, a base dominante é a base parlamentar, sendo por conseguinte, incompreensível a denominação de sistema semipresidencial. (argumento substantivo)
    • Finalmente, se se associar o semipresidencialismo à V República francesa, o sistema português nada tem que ver com ele. (argumento terminológico).
  • Há quem caracterize o sistema português como parlamentarismo racionalizado:
    • Os poderes do presidente são claramente superiores ao de um chefe de Estado em regime parlamentar tradicional, mas  não passam de um elemento correctivo da matiz essencialmente parlamentar do regime. (A sua funcionalidade não seria  muito diferente da função da clausula barreira ou da moção de censura construtiva).
  • Paulo Rangel considera que o sistema português é semipresidencial embora com um pendor parlamentar, rejeitando em parte os argumentos de Vital Moreira e Gomes Canotilho:
    • O argumento taxionómico é desvalorizado uma vez que os tanto Vital Moreira como Gomes Canotilho não hesitam em isolar um núcleo de sistemas mistos.
    • A natureza do sistema é um sistema misto.
    • Quanto ao argumento da terminologia, defende-se que aquilo que distingue um sistema parlamentar de um sistema misto é, antes de tudo, a eleição do presidente e a consequente atribuição de verdadeiros poderes políticos ao mesmo. O que o distingue do parlamentarismo ou mesmo do sistema presidencial não é o parlamento (pois todos os sistemas são dotados de um parlamento democraticamente eleito), aquilo que os distingue é a existência de um chefe de Estado que partilha o poder executivo com o governo e que tem capacidade para influenciar o executivo.

Características do sistema de governo português:
  • A eleição popular do chefe de Estado.
  • O governo como órgão autónomo responsável pela política geral.
  • Extensão dos poderes presidenciais.
  • Responsabilidade do governo perante a Assembleia da República.
  • Relação do governo com o PR como uma relação de responsabilidade (a assimetria das relações de responsabilidade do governo).

A eleição popular do Chefe de Estado:
  • O Presidente da República é eleito por sufrágio universal e directo (art. 121º).
  • Trata-se de uma característica directamente proveniente dos sistemas presidenciais.
  • A eleição directa do Chefe de Estado deve-se a duas ordens de razões:
    • Quando durante o Estado Novo, em 1959, Humberto Delgado esteve próximo de ganhar as eleições presidenciais, Salazar impôs que a eleição do presidente passasse a ser feita por um colégio eleitoral. Assim, a eleição directa do presidente por sufrágio universal passou a ser uma bandeira da oposição democrática ao regime que acabou por se reflectir na CRP de 76.
    • Cláusula militar implícita – a CRP de 76 previa a existência de um órgão com amplos poderes – o Conselho da revolução (poderes legislativos em matéria militar, jurisdicional em matéria constitucional e aconselhamento político do presidente). Este órgão era constituído por militares sendo presidido pelo PR. Ora, como era necessário cobrir aquele órgão com um manto de legitimidade democrática houve um acordo entre partidos e MFA no sentido de que o presidente eleito fosse um militar. [necessidade de atribuir legitimidade democrática ao Conselho da Revolução]. 
  • É o representante da República Portuguesa e tem certas competências no âmbito das relações internacionais (art. 120 e 135).
  • Em Portugal foram eleitos 4 PR:
    • Ramalho Eanes (76-86).
    • Mário Soares (86-96).
    • Jorge Sampaio (96-2006).
    • Cavaco Silva (2006 -…).
  • Durante muito tempo, até à primeira eleição de Jorge Sampaio, sustentou-se que vigorava em Portugal a teoria dos ovos e dos cestos, de acordo com a qual, os cidadãos nunca davam a vitória presidencial a um candidato do partido que ocupasse o governo, forçando assim a coabitação. A teoria não se confirmou com a eleição de Jorge Sampaio durante o governo de Guterres. Passou então a falar-se da “lei da vitória inevitável dos candidatos de centro-esquerda” que foi também negada com a vitória de Cavaco (confirmando-se mais uma vez a teoria dos ovos e dos cestos).
  • A vitória de candidatos de centro-esquerda confirma uma leitura mais parlamentarizada dos eleitores do nosso sistema semipresidencial, uma vez que estes candidatos se afirmam mais como moderadores do que tendo uma atitude activa senão mesmo de ruptura constitucional.

O governo como órgão autónomo responsável pela política geral:
  • O governo é um órgão constitucional autónomo distinto e independente do PR. (Existência de um executivo dualista).
  • É um órgão colegial, presidido pelo Primeiro-ministro (goza de primazia em face dos restantes membros: escolhe os ministros, em caso de morte, incapacidade ou demissão, leva à queda de todo o governo, o relacionamento institucional com o PR é efectuado exclusivamente com ele).
  • O PR só pode presidir ao Conselho de Ministros quando o PM o convidar (art. 133º,i). [Um ponto em que o sistema português se afasta do semipresidencialismo francês onde o PR tem competência normal para presidir ao Conselho de ministros).
  • Cabe-lhe a condução política geral do país e a direcção suprema da administração pública (art. 182º).
  • O PM tem o dever de informar o PR acerca da condução da política interna ou externa do país (204º,1, c).

A extensão dos poderes presidenciais:
  • Poder de dissolução da AR, escolha do PM tendo em conta os resultados eleitorais, poder de nomeação dos membros do governo, poder de demissão do governo, decretar referendos nacionais, poder de veto político de diplomas legislativos, poder de requerer a fiscalização (preventiva ou sucessiva) da constitucionalidade das normas junto do TC.
  • Dissolução da AR (art. 172º) – é o poder mais forte do presidente e a sua utilização depende exclusivamente da leitura que faz das circunstâncias políticas. De acordo com o art. 133º, tem apenas de ouvir o Conselho de Estado e os partidos com assento parlamentar, mas os seus pareceres não são vinculativos. Desconhece dois tipos de limites:
    • Limites temporais – a AR não pode ser dissolvida nos seis meses subsequentes à sua eleição ou nos últimos 6 meses do mandato presidencial. Visa evitar uma anómala da dissoluções sucessivas e evita a manipulação presidencial de soluções políticas em termo de mandato.
    • Limites circunstanciais – a AR não pode ser dissolvida na pendência do estado de sítio ou de emergência. Evita a  tentação autoritária do PR.
  • Veto político (art. 136º) – fundamenta-se em razões de conveniência e oportunidade política.
    • Veto dos decretos provenientes do governo (veto absoluto) Þ o decreto do governo não pode ser directamente proposto ao PR. No entanto, este veto pode ser torneado mediante o exercício dos poderes de iniciativa legislativa do Governo junto da AR, transformando o decreto vetado em proposta de lei. Evidentemente, que este procedimento tem custos políticos.
    • Veto dos decreto provenientes da AR (veto relativo) Þ é superável mediante confirmação da AR. (maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções ou então uma maioria duplamente qualificada para matérias constantes no art. 136º,3.
    • Os únicos vetos que o PR não pode recusar é relativo a leis de revisão constitucional.
    • NOTA: a única forma de um veto presidencial não ser torneável é se se tratar de um veto a uma lei de competência exclusiva do governo (art. 286º).
    • O PR tem ainda uma grande margem de manobra no que respeita à ratificação de acordos internacionais (art. 135º, b).
    • A confirmação pela AR de um diploma vetado por inconstitucionalidade não.  determina para o PR a obrigação de promulgar.

Responsabilidade do Governo perante a AR
  • A nomeação do governo depende dos resultados eleitorais nas eleições legislativas. Embora seja o PR a nomear o governo ele tem que ter em conta os resultados eleitorais e ouvir os partidos com acento parlamentar, evidenciando-se a necessidade do PR se pautar por um critério de sustentabilidade parlamentar.
  • Para o governo entrar em plenitude de funções, carece de um acto de investidura parlamentar que se traduz na apresentação e apreciação do programa de governo na AR podendo culminar ou não numa votação. (art.192). (Admite-se as investiduras tácitas como modo de facilitar a entrada em funções dos governos maioritários).
  • A AR pode votar uma moção de censura ou rejeitar uma moção de confiança. No entanto, a maioria requerida para aprovação de uma moção de censura (maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções) é maior do que a maioria requerida para aprovação de uma moção de confiança  (maioria simples).
  • NOTA: só um governo caiu pela recusa de uma moção de confiança (I Governo de Soares) e só um caiu pela aprovação de uma moção de censura (X Governo Const, Cavaco Silva 87).
  • NOTA2: 6 governos foram demitidos por solicitação expressa do PM (ex 2º governo de Guterres).
  • NOTA3: Três gabinetes terminaram efectivamente a legislatura que iniciaram: Cavaco Silva XI e XII Governos Constitucionais, I de Guterres.
  • NOTA4: Governos demitidos por actos presidencial: II Gov Constitucional – Mário Soares, Governo Pintassilgo, Sá Carneiro devido a morte do mesmo, Santana Lopes XVI.




A relação do governo com o Presidente da República como uma relação de responsabilidade (a assimetria das relações de responsabilidade do Governo)
  • A nomeação do PM está bastante condicionada em situações em que haja a maioria absoluta de um partido ou de uma coligação por questões de sustentabilidade parlamentar. No entanto, quando o partido maioritário dispõe apenas de maioria relativa, o presidente não está nunca obrigado a nomear PM o líder do partido mais votado.
  • O PR tem poder para formar governos de iniciativa presidencial, constituídos à margem do quadro parlamentar e partidário, com fundamento no alegado esgotamento dos arranjos partidários possíveis. [ Ex. Presidente Eanes formou 3 governos desta forma: Nobre da Costa, Mota Pinto e Lurdes Pintassilgo, sendo que o único que teve algum sucesso foi o de Mota Pinto].
  • É o PR que nomeia os ministros e os secretários de Estado o que implica que este tenha bastante influência na escolha dos mesmos.
  • A matéria resultante ao modo de organização do governo tem que ser aprovada pelo presidente, e como se trata de uma matéria exclusiva do governo, um veto presidencial não pode ser contornado.
  • (Pode dizer-se que na concepção constitucional, a vertente presidencial se faz sentir mais ao nível da composição e organização governativa, enquanto que a vertente parlamentar se manifesta preferencialmente no domínio do programa e das opções substantivas de governação).
  • O PR tem o poder de demissão do governo, em situações excepcionais quando esteja em causa “o regular funcionamento das instituições democráticas”.
  • Há uma assimetria entre a responsabilidade do governo perante a AR e perante o PR:
    • A AR tem um poder praticamente livre no início e na cessação de funções do governo (aprovação ou rejeição do programa de governo ou votação de uma moção de censura ou de confiança) Þ Relação de responsabilidade política.
    • O PR tem largos poderes no momento de formação do governo mas estes são muito circunscritos em sede de eventual cessação de funções. Relação de responsabilidade político-institucional.

Þ O nosso sistema  é de facto semipresidencial porque o PR tem poderes de grande relevância na formação e na alteração do governo e a Constituição abre a porta a que o PR ganhe grande importância se ele for o nº1 do partido que tem maioria na AR. (rejeição do parlamentarismo racionalizado em comparação com o sistema francês).












O Federalismo

Federalismo como forma de governo, experiência política e ideologia

Distribuição territorial do poder do Estado: a distinção entre Estados federais, Estados unitários e Estados regionais:
  • Estado Unitário Þ aquele tipo de Estado em que o poder respectivo está concentrado nas mãos de um único pólo de governo que exerce todo o poder para o conjunto do território. Existe aqui uma só ordem vertical, uma só fonte de poder legislativo e só ao nível administrativo são admitidas formas de descentralização e desconcentração.
  • Federação Þ tipo de Estado em que tanto o poder central como os poderes federados dispõem de faculdades autenticamente constituintes, pelo que a globalidade das matérias de governo se encontra repartida pelos dois níveis de poder, de tal modo que cada um desses níveis de governo toma decisões finais no campo de acção respectivo. Existem dois estalões de ordens constitucionais, várias sedes de poder legislativo e financeiro e formas de descentralização administrativa. 
    • Muitas vezes, o próprio poder jurisdicional está organizado em razão da estrutura federal do Estado.
  • Estado Regional Þ uma única constituição estabelece a repartição de competências políticas, legislativas e administrativas por dois escalões políticos diferenciados: o poder central e os estados regionais. As regiões gozam de competências de carácter político, legislativo e tributário, não tendo, no entanto, qualquer autonomia constituinte. 
  • Confederação Þ trata-se de uma associação de Estados que, embora tenha órgãos de coordenação política em certos domínios, não põe em crise a soberania internacional dos respectivos membros. É um vínculo, por via de regra, instável, evoluindo para um de dois estádios opostos: federação verdadeira ou dissolução pura e simples.

O carácter radicalmente “polivalente” da forma federal de Estado

Þ O conceito de Federação é um conceito estruturalmente aberto, capaz de, em si mesmo considerado, albergar realidades políticas bem diversas:
  • É compatível com a forma republicana e com a forma monárquica.
  • É compatível com diversos sistemas políticos: Presidencial ou presidencialista (EUA, Brasil) semipresidencial (Áustria) sistema de governo directorial Suíço, sistema de governo parlamentar puro (Austrália, Canadá) ou racionalizado (Alemanha).
  • É compatível com diferentes níveis de desenvolvimento económico e social: EUA e Brasil (primeiro e terceiro mundo).
  • Aparentemente não  exige um modelo de democracia liberal do tipo ocidental: União Soviética, ex-Jugoslávia... (embora seja um tipo de federalismo coercivo uma vez que as suas unidades não se “federam” livremente). No entanto, o federalismo é dificilmente compatível com a autocracia a qual se funda necessariamente num princípio de concentração e hegemonização do poder.
  • NOTA:  a antinomia democracia/federalismo só subsistirá para quem acentue o carácter igualitário da democracia ou para quem tenha dela uma visão essencialmente redutora. Quem entender o papel do pluralismo com trave mestra da democracia considerará que os Estados federais fortalecem as democracias especialmente pelo seu efeito protector das minorias. 

A polissemia das doutrinas federalistas

  • Por um lado, o federalismo nasce com um papel unificador (centralizador) ditado por motivos económicos de criação de um mercado único num sistema inter-estadual (ex. Liberdade de comercio dentro do espaço federal).
  • Por outro lado, no pólo oposto estão as pulsões descentralizadoras.
  • Assim, do ponto de vista ideológico, o federalismo pode ter dois sentidos radicalmente opostos:
    • Descentralizador de competências (UE antes de Maastricht).
    • Concentração de poderes (a posição dentro da UE que apoiava a concentração dos poderes em Bruxelas, defendendo a transferência de parcelas de soberania).

Þ Só o modelo federal é capaz de responder a um grau elevado de pluralismo de todo o tipo, de diversidade de valores e interesses em conflito permanente.

O código genético do federalismo: as características institucionais
  1. Princípio da autonomia constituinte dos estados federados
    1. Cada um dos Estados federados tem poder constituinte próprio e poder legislativo próprio.
    2. A liberdade de elaborar e alterar a sua constituição de cada um dos Estados Federados é limitada pelo facto de se inserirem na federação e porque estão limitados pela própria constituição federal. [Ex.: os Estados federados dos EUA são obrigados a ter uma forma de governo republicana e os Lander na Alemanha são obrigados a respeitarem o princípio do Estado de Direito republicano, democrático e social e a assegurarem o sufrágio universal, directo, livre e secreto].
    3. Há no entanto uma grande semelhança entre as constituições dos estados federados:
                                                              i.      Há uma homogeneidade a priori (uma comunidade, uma história partilhada).
                                                            ii.      Com a entrada na federação, há um certo efeito de imitação das instituições dos outros estados federados e do próprio estado federal (ISOMORFISMO)
1.      EX.: EUA Þ cultura anglo-saxónica de raiz, praticamente todos os estados federados têm um sistema presidencial (governadores), os parlamentos são constituídos por 2 câmaras (à excepção do Nebraska) e um modelo judicial encimado por um tribunal supremo.
                                                          iii.      (No entanto, também há diferenças: há estados que rejeitam o referendo, muitos prevêem a designação electiva de juízes, possibilidade de recall...
  1. A intervenção dos Estados federados no processo de reforma ou revisão da constituição federal:
    1. Têm uma intervenção própria no processo de revisão da constituição federal.
    2. Neste tipo de processo intervêm as instituições da federação e dos estados federados.
    3. É feita por maioria qualificada no parlamento federal mas depois cada estado federado vai ter que aprovar essas alterações.
    4. Exemplos:
                                                              i.      EUA: 2/3 do congresso e do Senado + ¾ dos Estados.
                                                            ii.      Suíça: revisão feita no parlamento + aprovação pela maioria dos cantões e desde que esteja representada mais de metade da população.
                                                          iii.      Alemanha: são necessários 2/3 na câmara alta (onde estão representados os Lander) e 2/3 na câmara baixa.
  1. O parlamento é composto por duas câmaras:
    1. Câmara baixa Þ critério demográfico; existe uma proporção entre o número de eleitores e o nº de eleitos.
    2. Câmara alta Þ Princípio da paridade – vale tanto um estado pequeno como um Estado grande. (Neste caso há uma sobre-representação do estados mais pequenos).
                                                              i.      São câmaras que representam o Estado federado:
1.      Câmaras Senado – eleitos pela população do Estado federado ou pelo parlamento do Estado federado.
2.      Câmaras Conselho – nomeados pelo executivo do Estado federado.
                                                            ii.      Funções:
1.      Câmara parlamentar propriamente dita – poder legislativo normal. Tem que aprovar as leis.
2.      Câmara de 2ª leitura – tem veto suspensivo. A câmara baixa aprova uma lei e a câmara alta apenas trava ou atrasa o processo, mas não pode impedi-lo.
3.      Caso alemão: o Bundsrat funciona de duas maneiras:
a.       Se a matéria diz respeito aos Lander, a câmara alta funciona como câmara parlamentar propriamente dita caso contrário funciona como câmara de 2ª leitura.
b.      (Os ministros que representam o Lander têm que votar em bloco). 
  1. Princípio da especialidade das matérias federais:
    1. A federação trata (Princípio da especialidade das matérias federais):
                                                              i.      Negócios estrangeiros, defesa nacional, mercado único (liberdade de comercio, mesma moeda).
                                                            ii.      Regra geral, todas as matérias que pertencem à federação estão na constituição. (Clausula de competências). [No Canadá é ao contrário].
    1. Tem-se verificado um alargamento das competências da federação:
                                                              i.       Através da alteração da constituição.
                                                            ii.      Teoria das competências implícitas – se a federação dispõe de uma certa competência, dispõe também de todas as competências necessária para executar essa. [Tem sido usada pela UE para alargar as suas competências].
    1. Por via de regra, em matérias onde existem competências concorrentes entre o Estado federal e o Estado federado, o direito federal quebra o direito estadual.











[1] Kant dizia a este respeito que os trabalhadores estavam dependentes e, consequentemente, não tinham discernimento suficiente para poderem votar.

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