Myself...
Myself...
"Porquê
o pensamento criou o EU?"
Numa das
palestras de Krishnamurti, um dos participantes pergunta:
"Qual
a razão para se construir a estrutura chamada do "eu"?
Porque o
pensamento fez isso?
Krishnamurti:
Eis uma
questão de extraordinária importância, porque se trata da nossa vida.
Precisamos levar isso muito a sério. Porque o pensamento criou o
"eu"?
Percebe
o facto de que o pensamento construiu o "eu" ou acha que o
"eu" é algo Divino, algo que já existia antes de o tempo existir?
É
preciso investigar isso também.
Porque
o pensamento criou o "eu"?
Porquê?
Eu não
sei, vou descobrir.
Porque
acha que o pensamento criou o "eu"?
Há duas
coisas a serem consideradas. A primeira é que o pensamento requer estabilidade,
porque o cérebro só pode ficar satisfeito onde há segurança.
Ou
seja, onde há segurança o cérebro opera maravilhosamente, seja de forma
neurótica ou racional.
Então,
uma das razões é que o pensamento, sendo inseguro, fragmentado, quebrado por
natureza, criou o "eu" como algo permanente, o "eu" que se
tornou independente do pensamento; e, dessa forma, o pensamento o reconhece
como algo permanente. E a permanência é identificada através do apego: a minha
casa, o meu carácter, o meu desejo, a minha vontade - tudo isso confere um
senso de completa segurança e continuidade ao "eu". Não é assim? Esta
é uma das razões.
E há
também a ideia de que o "eu" é algo anterior ao pensamento - será
mesmo?
Quem
pode afirmar que existia antes do pensamento?
Se fizer
essa afirmação - como muitos fazem – a sua afirmação estará baseada em que
raciocínio, em quais fundamentos?
Será
essa afirmação baseada na tradição e na crença?
Ou
talvez ela se baseie no desejo de não reconhecer que o "eu" é produto
do pensamento, mas algo maravilhoso e Divino, o que, mais uma vez, é uma projecção
da ideia de que o "eu" é permanente.
Tendo
observado tudo isso, deixa-se de lado a ideia de que o "eu" é eterno
e Divino, eternamente atemporal, etc. - isto também é absurdo.
Percebe-se
com muita clareza que o pensamento construiu o "eu" - e o
"eu" tornou-se independente, adquiriu conhecimento; o "eu"
é o observador, o "eu" é o passado.
O
"eu", que é o passado, flui ao longo do presente e se modifica como o
futuro; ele é ainda o "eu" que é fruto do pensamento, e este
"eu" tornou-se independente do pensamento. Certo? Podemos prosseguir
a partir daqui?
Por
favor, não aceitem a descrição, as palavras, mas vejam a verdade disso. Assim
como vêem o microfone como um facto, vejam também isso.
O
"eu" tem nome, tem forma. O "eu" tem rótulo, chama-se K ou
João, e tem forma, identifica-se com o corpo, com o rosto, e com tudo o mais.
Existe, então, a identificação do "eu" com o nome e a forma, que é a
estrutura, e com o ideal que ele quer perseguir, ou com o desejo de transformar
o "eu" noutra forma de "eu", com outro nome. Então, esse é
o "eu". O "eu" é produto do tempo e, portanto, do
pensamento. O "eu" é a palavra. Remova-se a palavra, e o que sobra? O
que é o "eu"?
Esse
"eu", portanto, sofre. O "eu", assim como o "você",
sofre. Então o "eu", ao sofrer, é "você". O "eu",
na sua grande ansiedade, é a grande ansiedade do "você" - portanto,
eu e você somos iguais. Eis a essência básica. Embora você seja maior, ou
menor, mais esperto, tenha temperamento diferente, carácter diferente - tudo
isso é o movimento periférico da cultura, mas bem lá no fundo, basicamente
somos o mesmo.
Então o
"eu" é levado pela correnteza da cobiça, do egoísmo, pela correnteza
do medo, da ansiedade, etc., que é o mesmo que você estar na correnteza. Ou
seja: você é egoísta e um potro é egoísta; você sente medo e um outro sente
medo. Resumindo: você está ferido, sofrendo, com lágrimas, cobiça, inveja -
este é o destino comum de todos os seres humanos. Este é o curso normal de
nossas existências no presente. Vivemos - todos nós - presos a esse fluxo.
Vamos apresentar isso de outra forma: nós vivemos nessa correnteza, nesse fluxo
de egoísmo. Essa palavra engloba todas as descrições do "eu" dadas
até agora. E quando morremos, o organismo morre, mas o fluxo de egoísmo
prossegue.
Pensem
nisso. Suponhamos que eu tenha vivido uma vida bastante egoísta, numa
actividade que gira em redor de mim mesmo: dos meus desejos, a importância dos
meus desejos, as ambições, a cobiça, a inveja, o acumular de propriedades, o
acumular de conhecimento, o acumular de uma grande variedade de objectos - a
tudo isso eu dei o nome de egoísmo. E eu vivo dessa maneira. Isto é, o
"eu" e "você" também. Nos nossos relacionamentos dá-se o
mesmo. Assim, enquanto vivermos, continuaremos a seguir juntos o fluxo do
egoísmo.
Isso é
um facto; não se trata da minha opinião ou de um conceito meu.
Se
observar com atenção, verá.
Encontra
o mesmo fenómeno na América, na Índia, por toda a Europa, modificado pelas
pressões ambientais, etc. - mas esse, basicamente, é o movimento. E quando o
corpo morre, o movimento prossegue.
Portanto,
a enorme correnteza de egoísmo, se posso usar esta palavra para englobar tudo o
que implica, é o movimento do tempo; e quando o corpo morre, isso prossegue. Continuamos
na correnteza, dia após dia, até a morte e, quando morremos, o fluxo prossegue.
Esse fluxo é o tempo. Esse movimento do pensamento criou o sofrimento, criou o
"eu", e a partir dele o "eu" se afirmou, agora como ser
independente e separando-se de "você", mas este "eu" é
assim como "você" quando sofre. Então o "eu" é a palavra, o
"eu" é a estrutura imaginada do pensamento. Por si mesmo ele não tem
nenhuma realidade. Ele é aquilo que o pensamento fez dele; devido ao fato de
que o pensamento precisa de segurança e de certeza, ele investiu no
"eu" toda a sua certeza. E nisso há sofrimento. Enquanto vivermos,
seremos carregados nesse movimento, nesse fluxo de egoísmo. E quando morremos,
o fluxo continua a existir.
E será
que é possível fazer cessar esse fluxo?
Eu
morro fisicamente, isso é evidente. A minha mulher pode chorar por causa disso,
mas o facto é que eu morro, o corpo morre. E o movimento do tempo, do qual
todos fazemos parte, prossegue. É por isso que o mundo é eu e eu sou o mundo.
Poderá
esse fluxo ser interrompido?
E essa
interrupção será a manifestação de algo diferente, de algo diferente da
correnteza?
Por
outras palavras, pode o egoísmo, com todos as suas subtilezas, ser totalmente
eliminado?
E essa
eliminação é a eliminação do tempo e, portanto, há uma manifestação
inteiramente diferente - que é a ausência absoluta de egoísmo.
J.Krishnamurti
Saanen, 24 de Julho de 1975
My
susceptibility to some kinds of fright (fear) was great. In the street, a man walking towards
me, that is to say, in a contrary direction, pulled out a handkerchief in front
of me; I started violently, believing, unconsciously, I think, that he was
pulling out an arm or revolver.
My short sight - not one the whole
very short, but excessively short in what relates to features, to gestures in
other people — aided my unbalanced brain.
My
imagination misinterpreted the character of their glances. I distorted, I knew not how, the
value and the gist of their gestures.
My very sense of hearing was weak;
the words I caught I applied, contorting them, to myself.
I
saw in every word a term to slight, in each phrase, badly snatched, the shadow
and the glimpse of an insult.
The people in the street laughed: it
was at me. My weak sight did not allow me to kill the illusion. The eye glasses
I had in my pocket I dared not put on, for I feared to find my suspicion true.
I longed for a great self-esteem,
that I might forget myself in myself. I desired, oh, how I desired! - an
impulse all to benevolence that I might forget me in others. I longed to die,
to drop my personality, to let life drop away. I longed to be freed from
everything, far away, very far. I wished to look no more upon the faces of men.
In these hours of intense pain I
often desired a friend, one that might well comprehend me: my richest dream was
of a dog. I often dreamt of having for companion a little child, one picked up
stray from the streets. But in my greatest agonies, in the acutest trances of
my woe, I desired naught save to forget. Earth, nature, men, ants, beasts,
birds - I longed to be at rest from these. I pined for a sleep that nothing
within life can give.
My
thoughts were of death, of the complete mortality of the soul.
As I walked along the pavements it
seemed that all laughter was of me, that I was the object of all ridicule.
[…]
My
ear, halfway weak, appeare to prove supersensitive to conversations not read
behind me. The
words I caught I misinterpreted for my own pain and suffering.
Fernando Pessoa
“Pessoa por conhecer - Textos para um
novo mapa”