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sábado, 14 de março de 2015

The free-will defence...











The free-will
defence

















The free-will 
defence...






The free-will defence is a defence of theism against the argument from moral evil.
The argument from moral evil is the argument that the existence of moral evil is inconsistent with, and so disproves, the existence of God. (Moral evil is simply evil resulting from the free actions of moral agents)

The argument from moral evil has the following form:
 (1) If God exists then he is omnipotent, omniscient, and benevolent.
(2) If God were omnipotent, omniscient, and benevolent then the world would not contain moral evil.
(3) The world contains moral evil.
Therefore:
(4) It is not the case that God exists.

Like all forms of the argument from evil, the key premise of the argument from moral evil is the second.
Is it the case that if God were omnipotent, omniscient and benevolent then the world would not contain moral evil?
 If so, then the argument from moral evil appears to be sound; there is little else in the argument that admits of dispute.
In order to refute the argument from moral evil, then, the theist must show that it is not necessarily the case that if God were omnipotent, omniscient, and benevolent then the world would not contain moral evil.
Under what circumstances, though, for what reason, might such a God allow such evil?
Theists almost invariably meet this question with the free-will defence. Moral evil is caused by the free choices of moral agents, they argue. 
Free agency, though, is a good thing; a world containing free agents is far better than either a world containing only automata or a world containing no conscious beings at all.
An omniscient, omnipotent and benevolent God would therefore create a world containing free agents, and in doing so would run the risk of allowing moral evil to enter into the world.
The first way in which the free-will defence works, then, is by distancing God from the moral evil in the world. 
Moral evil is not brought about by God, the free-will defence argues, but by free agents. God is therefore not the author of moral evil, and so is not responsible for it.
This conclusion might be criticised, however, in the following way: Even if it is the free agents that perpetrate moral evils that are directly responsible for them, God does seem to bear at least some indirect responsibility for them.
After all, God created the free agents, knowing full well the risk that he was running in doing so, and is therefore at least partly to blame for their abuses of their freedom.
God it can be argued, is guilty of negligence in creating free agents, even if not of actually perpetrating any moral crimes himself.
The second way in which the free-will defence works is in justifying the existence of moral evil by justifying God’s creation of free agents.
The existence of moral evil, the free-will defence argues, is a consequence of the existence of a greater good: free will. Without free will there could be no moral goodness; a world without free agents would be morally void. 
The good that is the existence of free moral agents, it is suggested, therefore outweighs the bad that is the existence of moral evil, and God therefore did well in creating free agents even though he knew that some of them would commit moral evils.
Some have criticised this line of defence by arguing that the good that is the existence of free moral agents does not outweigh the bad that is the existence of moral evil.
Consider the scale on which moral evil has occurred even in recent history; this is a high price to pay for freedom; is it too high a price?
Others have thought that the free-will defence fails because God could have created free agents without risking bringing moral evil into the world. 
There is nothing logically inconsistent about a free agent that always chooses the good.
There are, then, among all of the possible free agents that God might have created, some free agents that would always have chosen the good. 
Why, it is sometimes asked, did God not create those free agents, leaving the others uncreated?
A further criticism of the free-will defence imagines a human being using it to justify his failure to intervene to prevent a crime from being committed.
If one of us were able to prevent a brutal murder, but instead allowed it to take place, then we could not justify our inaction using the free-will defence.
If we were to say that although we could have prevented the murder, we thought it best to protect the free-will of the murderer by allowing him to carry out his plan, then we would be judged to have made a moral error. 
Why, if this argument would be unacceptable coming from a human being, should we think it any more acceptable coming from God?




























Livro de Job




O livro de Job insere-se no conjunto dos Livros Sapienciais ou Livros da Sabedoria.
O termo sabedoria é aplicado a um conhecimento baseado na experiência humana acumulada ao longo da vida e enriquecida através de gerações e que se fixou em pequenas frases como os provérbios.




Autoria e estrutura



Uma análise cuidadosa do seu estilo literário permite afirmar que o Livro de Job não foi composto de uma só vez. 
Além disso, existem algumas incoerências no seu conteúdo o que confirma a opinião de que este conjunto literário tenha sofrido diversas alterações e acrescentos ao longo da história. É provável, no entanto, que o autor principal desta obra tenha sido um israelita conhecedor do pensamento hebraico tradicional e das grandes preocupações humanistas existentes nos países vizinhos.
O conto tradicional de Job deverá ter a sua origem em data indeterminada, mas bastante antiga, na região a sul de Israel. 
O nome de Job não é um nome tradicional hebraico, aparecendo apenas neste livro, no livro de Ezequiel e na Carta de Tiago onde Job é apresentado como uma figura lendária dos tempos patriarcais dotada de grande sabedoria. 
Apesar da história ter como base um conto bastante antigo, a maioria dos estudiosos situa este livro no período pós-exílio (cerca de 400 a.C.).
O Livro de Job impôs-se como uma marco fundamental na Bíblia porque, por um lado, apresenta a experiência religiosa pessoal como um objecto de reflexão (e fá-lo com notável profundidade humana) e, por outro lado, apresenta a tomada de consciência dos sofrimentos e dramas da vida humana, procurando a sua interpretação à luz da vontade divina.
O Livro reflecte as repercussões do sofrimento, quer directamente na experiência de quem sofre, quer indirectamente nos conceitos religiosos e morais existentes na época.
Por outras palavras, no Livro de Job analisa-se o problema de saber se existe alguma correlação justa ou lógica entre a maneira honesta como se vive e a maneira como a vida nos corre.






Tema e mensagem



A popular história de Job é a de um homem justo, íntegro, piedoso e rico que é subitamente posto à prova.
Job vai perdendo todos os seus bens, os seus filhos e a sua saúde.
A sua reacção não é de revolta mas de aceitação e de paciência: “Nu saí do ventre de minha mãe, e nu para ele voltarei. Javé tudo me deu e Javé tudo me tirou. Bendito seja o nome de Javé!”. 
Por isso, Job é apresentado como modelo do sofredor paciente. A sua fidelidade a Deus leva a que, no fim, Job seja recompensado por Deus recuperando a saúde, os bens e até numerosos filhos. 
No entanto, não é nesta pequena história contada em prosa que se encontra a maior riqueza deste livro.
A verdadeira originalidade do Livro de Job está escrita em verso na sua parte central.
Aqui encontramos um Job completamente diferente, um Job inconformado, repleto de perguntas, que não aceita a sua desgraça nem a explicação tradicional e que interroga e pede contas a Deus pelo que lhe aconteceu.
Temos, portanto duas partes no Livro de Job: a primeira, idealista e utópica, apresenta-nos um modelo de paciência, aceitação, conformismo; e a segunda parte, que está mais relacionada com a realidade, o ser humano é-nos apresentado com dúvidas, dilemas e perguntas sobre a vontade de Deus.
O sofrimento é a força motriz que impele Job (e nos impele a nós) para a dúvida, para as interrogações, em última análise, o sofrimento leva-o ao encontro com Deus, pois obriga-o a descer ao profundo do humano para procurar o sentido para esse sofrimento. 
Durante esta reflexão poética central, o Livro de Job apresenta-nos vários amigos com diversas argumentações acusando muitas vezes Job de ser o responsável pelo sofrimento em que se encontra. No entanto, Job nunca desfalece até que Deus intervém respondendo a todas as discussões anteriores.
O Livro de Job é uma obra de reflexão e meditação e, ao mesmo tempo, um espaço para levantar questões ainda hoje dramáticas.
Em termos teológicos, o Livro de Job não apresenta uma catequese tradicional mas antes analisa um conjunto de problemas cuja solução reflecte a concepção que se tem sobre Deus.
Em Job, rejeita-se um sistema de pensamento religioso: as posições moralistas e tradicionais da equivalência entre o sofrimento de uma pessoa e algum pecado por ela cometido. É o pensamento maioritariamente defendido pelos seus amigos (de Job). 
Por outro lado, o pensamento religioso do livro parece aproximar-se da nova consciência de Job, de onde emergem verdades já bastante evidentes para ele, mas que o deixam ainda muito inseguro e mesmo escandalizado. 
Mas nem todas as suas ideias são confirmadas, após a contemplação da sabedoria, o discurso de Eliú e a intervenção final de Deus. Se as teses da religiosidade tradicional e popular sofrem uma forte contestação, também as novas sensações iniciais de Job chegam ao fim algo esbatidas.
Ao longo do livro, Job empreende uma reflexão amadurecida e profunda.
Em suma, neste livro recusa-se que a causalidade de todo o sofrimento deva ser atribuída, seja ao homem, seja a Deus.
A ética e o ciclo da vida, com os seus percursos naturais de sofrimento e morte, são dois processos coexistentes, mas autónomos.
A justiça e a acção de Deus não se podem medir com as regras de equivalência que são normais na justiça terrena.
E este é um dos mais marcantes contributos do Livro de Job para a importante questão do humanismo e da experiência religiosa. 
A sua atitude básica perante o sofrimento não é de moral legalista, é, antes, uma atitude de corajoso acolhimento do real; é contemplativa e verificadora; é um caminho de sabedoria.
É, por conseguinte, um espaço de transformação de si mesmo e dos factos que levam ao conhecimento.
Mostra também de forma clara que o Deus retributivo defendido pelos amigos de Job era um Deus artificial.
É uma crítica à religiosidade que inventa deuses vingativos e um alerta para não cairmos, nós próprios, na tentação de olhar para um Deus no modelo retributivo e fugirmos do verdadeiro Deus, aquele que não  nos é exterior e nem criado por nós...






















A responsabilidade de Deus 
pela sua criação






À questão acerca da responsabilidade de Deus pela sua criação teremos de regressar na conclusão desta reflexão. No entanto, não se pode deixar de vincar já que Deus é responsável pelo que fez aquando da criação. Mas apenas por isso. Tudo o que Deus cria ao criar o mundo é obra sua, acto seu. De mais ninguém. Deus é imediatamente responsável pelo que criou. Mas o que criou não foi uma realidade estática, dada no que é para sempre e sempre imutável.
Não. Deus criou uma realidade que é essencial e substantivamente possibilidade de ser. É por esta realidade como possibilidade, em seu puro absoluto de possibilidade, que Deus é responsável. Não é e não pode ser responsável por mais coisa alguma, sem o que a possibilidade deixaria imediatamente de o ser e passaria a ser uma necessidade. Então, se assim fosse, Deus seria responsável pois a necessidade decorreria dele e apenas dele. Mas a possibilidade só conhece uma forma de necessidade, que é a de ser necessariamente na forma do possível, isto é – e sem jogo de palavras –, de ser necessariamente possível.
Posta a possibilidade, e posta como possibilidade de bem, é o que surge desta possibilidade que termina a criação, que a prossegue até que termine, quer dizer, que se esgote toda a possibilidade. Mas, esta, no que tem de marca de presença do bem em si, isto é de absoluto de positividade ontológica como possibilidade de positividade ontológica nova, não tem limite. Ou, se se quiser, o limite desta possibilidade como possibilidade de bem é o próprio Deus.
É na realização da possibilidade de bem como negação de bem possível
– definição do próprio mal – que se vai esgotando o tesouro de positividade fundador do possível e, assim, se elimina este.
É precisamente esta a situação em que Job vai ser experimentalmente situado: criado como absoluto de possibilidade de bem, pode, em cada acto, ou seguir na fidelidade a esta possibilidade, realizando o bem, o que sempre fizera antes da provação, ou não. A provação destina-se a diminuir até ao limite mínimo a possibilidade de bem, reduzindo-a ao absoluto sem o que nem Job haveria, para poder perceber se ainda assim é possível manter-se a dinâmica e a cinética de bem. Tal é demonstrado por Job, cuja acção mostra que o mínimo da possibilidade de bem coincide com o seu mesmo máximo, dado que se trata de um absoluto que é o absoluto que institui cada ente precisamente como possibilidade de bem. Não esqueçamos que esta mesma possibilidade de bem é, em cada possível iteração de actualidade, possibilidade de não bem, apenas assim podendo ser possibilidade e não necessidade.
Ora, é por esta parte da acção que Deus não é responsável, sem o que se anularia toda a dimensão de possibilidade da criatura – Job ou outra qualquer nele paradigmatizada –, eliminado assim a própria criatura em sua mesma essência.

É este o drama, necessário como tal, da liberdade como possibilidade de acção. O drama é sempre de quem o vive. Nunca é de um qualquer terceiro, sobretudo não é de Deus. É o preço terrível como possibilidade de se poder ser bom. Poder ser bom é o que torna divino o estofo humano. Tudo o mais é próprio de bestas ou de pedras. Negar tal é situar-se fora do que é propriamente humano.
Se certas formas de representar variantes ou evoluções do Satã o retratam como «a besta», é precisamente porque o Satã é aquele que duvida da bondade da criação, que quer que seja deficiente, imagem sua, não imagem de Deus.
Ora, em comparação, Job pode ser dito «a anti-besta», pois é aquele cuja acção prova que o ser humano pode elevar-se a uma dignidade amada por Deus como coisa perfeita em sua mesma dimensão de finitude capaz de olhar o infinito nos olhos e de não vacilar ao afirmar a sua grandeza em nome do mesmo infinito que sabe que o habita e o sustenta contra tudo e contra todos, mas a favor da grandeza possível de possibilidade infinita de aperfeiçoamento
a caminho do seu máximo possível de perfeição analogamente tão perfeita em
si quanto a Deus é nele. Deus é responsável por esta possibilidade; Job pela sua concretização.




A responsabilidade de Deus para com Job


Sendo esta a relação fundamental, a responsabilidade de Deus para com Job como possibilidade de bem, criada para tal, é total. Desta responsabilidade decorre necessariamente o drama que a obra nos narra. A chamada de atenção para a bondade do seu servo é não apenas uma manifestação de enlevo, semelhante à que Deus manifesta após cada momento criador no Génesis, mas também a indicação do laço de relação que existe entre a criatura em sua bondade e o acto que a pôs como possibilidade de bem, possibilidade que soube transformar em bondade. É como se Deus quisesse dizer que, finalmente, o seu dom de possibilidade de bem tinha dado pleno fruto. “Eu sou responsável pela possibilidade que este homem soube transformar em actualidade concreta de bem”.
Ao que o Satã responde: «mas ele não é responsável por essa actualização:
és tu, que o privilegias». É o Satã quem primeiro acusa Deus da responsabilidade do detalhe das escolhas do possível.
Tal acusação não pode ficar sem resposta. Esta passa necessariamente pelo afastamento total de Deus do possível que criou, a fim de este poder mostrar se é de facto responsável pelas suas escolhas de actualização do possível ou não.
O texto prova que apenas Job, mesmo perante um Deus manifestamente mau e que nega a sua promessa de bondade, isto é, mesmo perante os abismos do sem-sentido e da mais intensa provocação a que abandone o bem,
é responsável pelo bem que escolhe, ainda que aparentemente contra Deus.
Aqui, o texto atinge o máximo de provação a que se pode submeter um ser humano: aqui, se perde a humanidade e Deus ou se ganham ambos. E ambos se ganharam através do detalhe da escolha de Job, através da sua única responsabilidade, fácil de demonstrar neste “topos”, pois mais ninguém nele poderia ser responsabilizado.
De notar que todas as fracas discussões posteriores acerca da responsabilidade humana e divina são por este texto previamente anuladas, pois constitui um paradigma resolutivo para todas elas, a todas dissolvendo. Perante a grandeza deste texto, as discussões modernas acerca de autonomia e heteronomia não só empalidecem como ganham estatuto anedótico. Job é o homem frágil cuja força sustenta toda a possibilidade de bem do mundo.




A responsabilidade de Job para com Deus



Mas se Deus é responsável para com Job, também Job é responsável para com Deus. E, mais uma vez, é-o de forma paradigmática para a humanidade. É que, se Deus cria Job como possibilidade de bem, sendo esta possibilidade todo o bem que Job é incoactivamente, tal dom implica imediatamente que quem o recebe seja responsável pelo que com ele faz. Esta responsabilidade não diz respeito apenas ao detalhe da escolha do bem a realizar ou não, mas diz respeito à própria relação entre criatura e criador.
De facto, o Satã sabia muito bem o que estava a fazer quando pôs em causa a responsabilidade própria irredutível de Job: se este não fosse responsável pelos seus actos, seria Deus quem seria. Deste modo, a responsabilidade de Job pelos seus actos é imediatamente a responsabilidade de Job por Deus, no sentido em que, ao ser responsável pelos seus actos faz com que Deus não o seja.
Mas esta responsabilidade, pelo que é como assunção do que é na forma de coincidência entre o que se põe em acto e o que se é em acto, é sempre a escolha de um bem. Quanto maior for esse bem, tanto melhor é o acto e quem o põe. Ora, fazer tal, realizar o melhor bem possível é a definição do acto de amor para como isso que é o bem que se põe. Em última análise é um acto de amor ao bem como absoluto de possibilidade, isto é, a Deus.
Assim sendo, toda a acção de Job é um contínuo acto de amor a Deus, que é também acto de amor para consigo próprio e os demais e o mundo. A responsabilidade pelo bem que se faz é indiscernível do mesmo amor que se realiza em acto ao fazer tal bem.




A responsabilidade de Job pelo bem e pelo mal



Tendo em conta o que ficou estabelecido anteriormente, a responsabilidade de Job pelo bem que fez é total e totalmente sua. Job não tem qualquer responsabilidade pelo mal, pois nunca o realizou. É impoluto. Apenas esta absoluta impoluição lhe permite olhar Deus nos olhos e não vacilar na afirmação do bem supremo da aliança que tem com Deus e que Deus parece ter quebrado em certo momento. Mas tal não interessa, pois Job mantém a sua fidelidade à possibilidade de bem com que Deus o criou, até ao fim.
Tal é indubitável no texto. Mas, como o texto fixa um modelo teórico para toda a humanidade, tal é indubitável para a humanidade como um todo, transcendentalmente considerada, isto é, necessária e universalmente, trans-historicamente.
Depois de Job, ninguém pode dizer, como o velho e fraco Adão: “não é culpa minha”. É sempre responsabilidade nossa: podemos é estar já reduzidos ética ou politicamente e estarmos quase impresentes. Mas a responsabilidade minha continua directamente proporcional à minha presença, o que implica que, se reclamo que não há responsabilidade minha alguma, confesso que já não sou. Perigoso paradoxo.
Hodiernamente, por razões de tipo político, tipificadas na redução onto-antropológica que o nazismo operou junto de milhões de pessoas, ou por razões de tipo ético, que se espraiam por todas as formas de auto-redução onto-antropológica – muitas delas politicamente induzidas como forma de melhor se poder dominar as pessoas –, vivemos num mundo que procura por muitas formas provar que Job está errado e que o ser humano mais não é do que um joguete impotente às mãos de forças multímodas que o determinam e dominam.
Mas Job já se encarregou de desmentir teoricamente tais posições. Só falta realizar Job e desmentir tais posições na prática. No entanto, convém, por razões de honestidade intelectual, chamar a atenção para que tal desmentido prático não poderá ser feito sem passar analogicamente pelo que Job passou, analogia que pode ser muito próxima e dar-se em mim, em qualquer um de nós.




O absoluto da responsabilidade divina 
e da responsabilidade humana: 
a responsabilidade de Deus 
pelo bem e pelo mal



O Livro de Job inicia-se com uma estranha crise da bondade da criaturalidade,
paradigmatizada em Job, que imediatamente implica uma crise da bondade do autor da mesma. Pôr em causa a bondade de Job, é pôr em causa a bondade do seu criador, Deus. Em Job e com Job, Deus aceita pôr-se em causa como merecedor de ser Deus. Neste teste supremo, Deus manifesta a sua absoluta responsabilidade pela criação. É o supremo risco do abismo entre o absoluto do sentido e o absoluto do sem-sentido. Um deus menor nunca correria este risco, até porque não possuiria substância lógica que lhe permitisse atingir o estádio ontológico para tal necessário. Apenas o absoluto do bem pode pensar pôr em causa o absoluto do bem, pois o mais não sabe sequer o que isso seja.
Nunca saberá.
É esta a situação comum da humanidade, relativamente boa – e não-boa – impassível de saber o que é o bem absoluto e o seu contraditório, único, o nada. Assim sendo, é necessário indiciar o que esse absoluto possa ser e fazê-lo na dimensão e ao nível do humano. Job incarna em seu mito esta indiciação, esta mostração (que é analógica: o bem de Job é analogia do bem absoluto). Em Job, é a questão da responsabilidade por isso que se é que implica o acrisolamento, de onde emerge a sua vitória final, na forma de uma total e inequívoca responsabilidade, indefectivelmente assumida, pelo bem
que se é, a que habitualmente chamamos “fidelidade de Job”.
A vitória de Job é também a vitória de Deus que vê, assim, confirmada a bondade sua posta na criatura. Mas o que Deus pôs na criatura não foi o detalhe ontológico da sua acção e suas consequências, mas uma possibilidade, imensa possibilidade: a possibilidade de ser bom (de ser não-bom).
A responsabilidade de Job e a responsabilidade de Deus referem-se a esta possibilidade e apenas a ela, diferenciadamente. Deus é responsável apenas pelo dom de poder-ser; Job é responsável pela administração deste dom, utilizando-o no sentido do bem, de Deus.
Não compete a Deus administrar o dom de possibilidade; tal compete apenas ao ser humano, a Job, a todos nós. É isso que Job faz, admiravelmente. É isso que implica que Deus tenha de não interferir durante o processo de administração do dom. Qualquer interferência anularia a possibilidade como tal, necessitando, isto é, tornando necessária a escolha de Job, do ser humano universalmente considerado. É esta a noção de destino como algo de necessário, que transcende a acção do próprio sujeito.
A Job é dado construir o seu fim, que só ganha foros de destino quando realizado e, assim, tornado eterno.
Ao criar um ser capaz de dizer “sim” ou “não” a uma infinidade de possibilidades derivadas da sua possibilidade primeira, Deus é responsável por esta criação, mas não o pode ser, directa ou indirectamente, pelas escolhas concretas, sem o que estas escolhas, o “sim” ou o “não”, deixariam de pertencer aos seres criados, para passarem a pertencer a Deus. Tal não é lógica e metafisicamente possível. Apenas a não-criação de tais seres implicaria a impossibilidade do mal. Seria esta uma opção radical prévia à criação da criatura capaz do bem, mas, necessariamente capaz do mal. O ser humano poderia não ter sido criado. Nunca teria havido mal, mas também nunca teria havido qualquer crítica ao criador por ter criado tal entidade.
O mal como possibilidade e como realidade é o preço a pagar pelo bem como não-necessário, como possível: é da radical possibilidade do bem que nasce o mal como possibilidade e é desta que, concretizando-a, nasce o mal.
É neste sentido e apenas neste sentido que o mundo em que tal se dá é o melhor dos mundos possíveis. Deste ponto de vista, um mundo absolutamente bom por necessidade é um mundo incompleto porque lhe falta a possibilidade do bem, mas esta acarreta sempre a possibilidade do mal. Terrível condição, aparentemente paradoxal. Mas o paradoxo não é real, pois a possibilidade do bem é especial. É a única possibilidade, porque é a possibilidade de todo o bem, isto é, de toda a positividade ontológica, que permite que só haja bem, se for actualizada na sua plenitude. Assim, isso que pode ser visto como condição paradoxal, é, na realidade, o absoluto condicionante da possibilidade do bem, na relação também absoluta com a sua contraditoriedade – que nunca é uma auto-contraditoriedade. Assim que o absoluto da possibilidade do bem é posto é posto o absoluto da possibilidade do não-bem relativo. No limite, se o absoluto da possibilidade do bem tende para Deus como fim, o absoluto da possibilidade do mal tende para o nada. E é uma “eternidade” de movimento que a ambos espera, pois um e o outro fins são inatingíveis.
Não há, pois, qualquer paradoxo no absoluto da posição da possibilidade do bem. É a nossa inteligência e a sua parte motora, a vontade, que não são capazes de perceber a grandeza do absoluto da possibilidade do bem como motor de si próprias e como único modo de engrandecimento ontológico nosso e do restante da criação feito a partir não de um mecanismo, mas de actos que podem, à partida ser tal ou o seu contraditório.
Se é neste ponto fundamental que reside a responsabilidade de Deus por ter criado tal possibilidade, é sumamente nele que reside a nossa responsabilidade pelo modo como realizamos tal possibilidade.
Deus é responsável pela possibilidade de Job. Job é responsável por tudo o resto e tudo o resto é o Job a que chamaríamos de histórico, se Job tivesse sido de carne. Mas, não o tendo sido ele, somos nós.
O responsável pela actualidade do bem e pela actualidade do mal sou eu.








Américo Pereira




“A Crise do Bem. Reflexão sobre Job e o sofrimento.”

                                        












































































































Tito Colaço

XIV _ III _ MMXV







































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