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segunda-feira, 16 de maio de 2016

Direct observation...








Uma `ideia´ pode levar ao obscurecimento das sensações e distrair da realidade corrente; 
(...) 

mas nenhuma `ideia´ tem a força de nos arrebatar a um ponto tal 

que não paremos de repente perante um facto impressionante 
e não lhe sacrifiquemos tudo o que, durante anos de trabalho, tenhamos feito em prol da `ideia´.” 




Fiodor Dostoievski





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Direct observation...
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Why do ideas take root in our minds? Why do not facts become all-important, not ideas? 


Why do theories, ideas, become so significant rather than the fact? 

Is it that we cannot understand the fact, or have not the capacity, or are afraid of facing the fact?


 Therefore, ideas, speculations, theories are a means of escaping away from the fact.






















You may run away, you may do all kinds of things; the facts are there the fact that one is angry, the fact that one is ambitious, the fact that one is sexual, a dozen things. 

You may suppress them, you may transmute them, which is another form of suppression; you may control them, but they are all suppressed, controlled, disciplined with ideas. 


Do not ideas waste our energy? 
Do not ideas dull the mind? 


You may be clever in speculation, in quotations; but it is obviously a dull mind that quotes, that has read a lot and quotes.

You remove the conflict of the opposite at one stroke if you live with the fact and therefore liberate the energy to face the fact. 

For most of us, contradiction is an extraordinary field in which the mind is caught. 


I want to do this, and I do something entirely different; but if I face the fact of wanting to do this, there is no contradiction; and therefore, at one stroke I abolish altogether all sense of the opposite, and my mind then is completely concerned with what is, and with the understanding of what is."



















"Anteontem estivemos a falar sobre a maturidade, o que significa, com efeito, o estado mental em que não há contradição. 


Essa maturidade exige energia, energia não considerada como ideia. Porque uma ideia a respeito da energia difere completamente do facto, que é a própria energia. 


Temos fórmulas ou conceitos sobre como produzir uma energia que seja da mais alta potência. Mas, qualquer fórmula é inteiramente diferente da potência renovadora da própria energia.


Não estamos, pois, a falar sobre a ideia, porem sobre o próprio facto. E parece-me que é neste ponto que na maioria de nós apresenta a dificuldade. 


Só nos interessam ideias ou conceitos, quanto ao meio ou modo de produzir energia da mais alta qualidade; e depois de formarmos a ideia ou conceito, trabalhamos de acordo com ele, a fim de produzirmos aquela energia.


Assim, o conceito de como produzir energia, e o facto, que é a própria energia, estão sempre em contradição. 


O homem cheio de energia física não necessita de nenhuma ideia sobre a energia; é enérgico. Mas aquele que não tem suficiente energia, que é doente, mentalmente desequilibrado, nutre conceitos sobre a maneira de produzir aquela energia.


Mas, nesta manhã, ao falarmos de energia, deve ficar bem claro para todos, que não estamos interessados em nenhum conceito, porém no próprio facto. 


Não nos interessa nenhuma opinião ou asserção sobre a natureza dessa energia, ou sobre o modo de produzi-la. Assim, se percebemos, inicialmente, o próprio facto, e não a ideia, a contradição começará imediatamente a desaparecer.


Vamos, pois, falar sobre essa energia. E a mais alta forma, o apogeu dessa energia, é o estado da mente em que não existe nenhuma ideia, nenhum pensamento, nenhum vestígio de directiva ou motivo. 


E essa qualidade de energia não pode ser buscada.
Não se pode dizer: `Mostrai-me como obtê-la, o modus operandi, o método´.


Não há nenhum método de obtê-la. Para descobrirmos por nós mesmos a natureza dessa energia, devemos começar por compreender a energia que diariamente se consome: a energia de que necessitamos para falar; para escutar o canto de uma ave, uma voz; para ver o rio, o amplo céu e o aldeão sujo, desnutrido, doente, semimorto de fome; e a árvore que, ao entardecer, vai a pouco e pouco, mergulhar nas sombras.


A própria observação das coisas é energia. E essa energia chega-nos mediante os alimentos, mediante os raios solares. Essa energia física de que nos suprimos diariamente pode naturalmente ser aumentada com alimentação adequada, etc. Ela, decerto, é necessária. 


Mas essa mesma energia, que se converte em energia psíquica, em pensamento, é desperdiçada quando, nela própria, há alguma contradição.





Tende a bondade de prestar atenção. Examinaremos este ponto, passo a passo. Se não procedermos logicamente, sãmente, racionalmente, não alcançaremos aquela força tremenda, a energia na sua mais alta potência, na qual, e só nela, existe o movimento sem tempo. 


E desperdiçamos a nossa energia, essa energia psíquica, a energia que produz o pensamento, a energia que armazena lembranças, a energia que é memória do passado, a energia pretérita e futura que constitui o mecanismo do pensamento.



Sempre que essa energia choca com uma contradição e não a compreende e dela se liberta, essa energia se dissipa, se desperdiça. 



Contradição é: pensar uma coisa e fazer outra coisa, no nível mais baixo e não no mais alto; no nível da nossa quotidiana existência.


Quando falamos rudemente com outra pessoa, e posteriormente nos arrependemos de o ter feito, esse arrependimento é desperdício de energia, desperdício que começa no momento em que falamos rudemente com outro. 

Cria-se, assim, a memória que nos adverte de que não devemos ser rudes, que devemos ser bondosos; daí, a dualidade, cujo conflito é desperdício de energia. Espero, senhores, que estejais a seguir isto.


Assim, o conflito, de qualquer espécie, físico, psicológico, intelectual, é desperdício de energia. 

É dificílimo compreendermos esse conflito e dele nos libertarmos, porque somos educados para lutar, fazer esforço.





Quando na escola, é esta a primeira coisa que se nos ensina: fazer esforço. E essa luta, esse esforço perdura toda a vida: isto é, para serdes bons, deveis esforçar-vos, deveis combater o mal, resistir, controlar. 


Assim, educativa, sociológica e religiosamente, os entes humanos são ensinados a lutar.





Diz-se-vos que para encontrardes Deus, deveis trabalhar, disciplinar, exercitar, torcer e torturar a alma, a mente, o corpo, ao negar, reprimir; que não deveis olhar; que deveis lutar, lutar, lutar, no chamado nível espiritual, que de modo nenhum é espiritual. 

Também, socialmente, cada um só luta por si e pela sua família.

Peço-vos que observeis isso, em vós mesmos; estamos a examinar algo de verdadeiramente profundo. 
Se o desejardes, acompanhai o orador, acompanhá-lo, e não segui-lo como a uma autoridade; caminhar a seu lado, viajar junto com ele. 


Chegareis assim àquela energia extraordinária que se renova sem o mínimo esforço, que renova a mente, mantendo-a sempre juvenil, fresca, inocente.


Assim, pois, religiosamente, ensinam-vos a `fazer esforço´. 
E sociologicamente, também, tendes de lutar para alcançar, realizar, `vir a ser´; `deveis´ ser melhor que o vosso vizinho, ter mais posses do que ele. 


A ambição é a vossa mola propulsora; e essa ambição é, com efeito, uma forma de auto-preenchimento, na família, na sociedade.






Esse auto-preenchimento, identificado com o grupo, com a raça, com a nação, leva a esse constante esforçar-se, esse lutar, lutar, lutar. 

E tal esforço existe por causa desta contradição: quando sois ambicioso, quando desejais preencher-vos, há sempre a possibilidade de frustração, possibilidade que vos impele com mais força, e aumenta a vossa tensão. 


E, se se trata de uma pessoa dotada de certas capacidades, essa tensão expressa-se no escrever poemas ou em extravios vários.


Socialmente, fazemos esforços, movidos pela ambição, a avidez, a inveja, o ódio, o desejo de prazer; e tais esforços são desperdício de energia. 

Por favor, observai isso em vós mesmos.


E, sexualmente, o mesmo processo torna-se um tremendo problema para a maioria das pessoas. 
Vede simplesmente a razão de tudo isso e não o que cumpre fazer. Examinaremos este ponto, e através desse exame, compreendereis.


Intelectualmente estais sufocado; nunca pensais por vós mesmos, de maneira original, porém apenas repetis; acumulais conhecimentos tirados dos livros e sois capaz de repetir interminavelmente frases do Gita, Bíblia ou do Alcorão ou do mais moderno autor, etc. 


Assim, intelectualmente, estais a ser tolhido, sufocado, controlado, moldado, e por conseguinte, do ponto de vista intelectual, não há possibilidade de libertação.


Tampouco há do ponto de vista emocional, mas não deis à palavra `emocional´ o sentido de `sentimental´. 


Um ente sentimental é perigoso: pode tornar-se cruel, estúpido, insensível. 
Portanto, não estou a falar de sentimentalidade, e sim da pessoa emocional. 
Impede-se a emoção quando não há apreciação da beleza.


Para se ver a beleza do rosto de uma pessoa, a beleza de um rio, a beleza de uma folha caída à beira da estrada, a beleza de um sorriso, a beleza de uma ave a voar, necessita-se de paixão, de alta sensibilidade. Mas, não temos essa sensibilidade. 


Sensibilidade implica zelo, zelo para com os filhos, o próximo, o serviçal, se o tendes; ter realmente zelo.


E falta-nos o zelo porque somos completamente destituídos de paixão e, por conseguinte, não podemos estar em intimidade, em comunhão com a beleza. 


Vivemos sufocados, tolhidos, porque, para nós, beleza é sexualidade, pois, por todo o mundo, as religiões prescrevem: `Para achardes Deus, não deveis olhar para uma mulher´. 


Assim, emocionalmente, estamos tolhidos, barrados; estamos a ser destruídos por tais preceitos, pelos `semipueris´ `mahatmas´, deuses e santos.


E assim, a única coisa que nos resta é o sexo. Refreados intelectual e emocionalmente, não achamos saída, não temos sensibilidade. E, naturalmente, resta-nos o sexo. 


No emprego, na vida diária, tendes de suportar insultos. Vêde a fealdade da moderna existência, em que sois apenas um dente da vasta engrenagem social; olhai-vos, senhor, por favor!


Desta forma, o marido, a mulher, o sexo tornam-se desproporcionalmente importantes, e por conseguinte, um problema; e com esse problema desperdiça-se energia. 


Ao nos vermos refreados no nosso pensar, criamos a imagem, pensamos naquilo que nos proporciona prazer, na vida, ou seja o sexo. E, fisicamente, temos de frequentar o escritório todos os dias, lutar, viver mal nutrido; bem conheceis os factos da nossa existência.



Em todos os sentidos, pois, estamos a desperdiçar energia. E esse desperdício de energia é, essencialmente, conflito: conflito entre o `devo´ e o `não-devo´. Uma vez criada a dualidade, torna-se inevitável o conflito.





Cumpre, pois, compreender todo esse processo da dualidade; mas isso não significa que tenhamos de negar a existência do homem e da mulher, do verde e do vermelho, da luz e da treva, do alto e do baixo, que são factos. 


Mas, no esforço inerente a essa divisão entre o facto e a ideia, há dissipação de energia.


Não sei se ainda não notastes que as pessoas gostam de falar, falar em público, ou em casa, ou consigo mesmas; que só as ideias lhes interessam, a ideia socialista, a ideia comunista, ou a ideia capitalista. 
Estão entranhadas de ideias e não de factos. 


Quando vos interessais totalmente no facto, e não na ideia, não há mais conflito.


Vêde, por favor, que, se compreenderdes esta tão simples coisa da vida, compreendereis então a natureza do conflito, e por conseguinte, vos libertareis dele. 

A menos que seja eliminada totalmente qualquer forma de conflito, estaremos a desperdiçar toda a nossa energia. 


E não se deve desperdiçar energia, porque a mente necessita de toda a fibra de energia, para poder acompanhar o movimento da vida, que é acção, para poder fluir juntamente com a vida.






E, para se poder acompanhar o tremendo fluir da vida, que não é uma ideia, que não é nenhuma reforma social, nenhuma atitude socialista, comunista ou hindu, para acompanhar essa coisa extraordinária chamada de `Vida´, a qual é movimento, acompanhar o ritmo desse movimento, sem o mínimo atrito, requer-se tremenda energia. 


Por conseguinte, é necessário compreender isso, em vez de se indagar `Como poupar energia?´.


Com a pergunta `Como poupar energia?´, cria-se o padrão de uma ideia, como poupá-la, padrão que fica a ser a norma de conduta do indivíduo; e assim, recomeça a contradição.


Mas se, ao contrário, perceberdes por vós mesmos, em que estão a ser dissipadas as vossas energias, vereis que a principal força responsável por esse desperdício é o conflito, ou seja, ter um problema e jamais resolvê-lo, viver com a lembrança de alguma coisa morta, viver segundo a tradição. 

É necessário compreender a natureza da dispersão da energia, não em conformidade com Sankara, Buda ou algum santo, porém pela observação objectiva dos diários conflitos da nossa vida.


Vemos, pois, que a principal causa do desperdício de energia é o conflito, mas não estou a dizer que devemos ficar inactivos. O conflito existirá sempre, enquanto a ideia for mais importante que o facto.



Examinemos agora a questão do desperdício de energia motivado pelo medo. Tomo este para exemplo; vós podeis escolher outro exemplo: a avidez, a ambição, o que quer que seja.


Mas, pela compreensão da estrutura, natureza e significado do medo, nos libertaremos da ideia e nos habilitaremos a enfrentar o facto. Isto é dificílimo, isto é, não nos achegarmos ao facto com uma opinião, uma ideia, a lembrança de uma experiência, porém enfrentarmos o facto. Trata-se de duas coisas inteiramente diferentes.


Vamos, pois, examinar o medo e ver o que é facto e o que é opinião. Se vos desagrada este assunto, trataremos mais adiante da violência. 

Porque a maioria das pessoas, pode-se dizer todas, têm medo; e também, praticamente, todos são violentos, em pensamento e em palavras; e se não são violentos no pensar ou no falar, são violentos na vida de família, ou se não são em família, o são nas profundezas do seu ser. 
Vou, pois, examinar esses dois factos.



O medo não existe por si só. Só existe em relação com alguma coisa: medo da opinião pública; medo da morte; medo do marido ou da esposa; medo de perder um emprego. O medo, pois, só existe em relação com alguma coisa, é causado por alguma coisa. 





Ora, direis: `Se posso descobrir a causa do medo, ficarei livre dele´. Tratais então de analisar, examinar introspectivamente a causa do medo. Mas essa análise, esse exame, é desperdício de energia.


Compreendei isso, por favor. Talvez nunca tenhais reflectido nessas coisas; assim, escutai, simplesmente, sem aceitar nem rejeitar; olhai, simplesmente.


Dizeis que tendes medo, e tratais de descobrir a causa disso; investigais, olhais, examinais; depois, se não conseguis encontrar essa causa, ides consultar alguém, o psicanalista ou o guru; ou continuais a procurá-la, até encontrá-la em algum lugar. Vede o que acontece! 

O facto é este: tendes medo. Em seguida, ireís de descobrir a causa do facto, quer dizer, admitis um intervalo de tempo. Esse intervalo de tempo é a análise, a introspecção, a indagação, a busca.


Descobris então a causa e dizeis `Como dissolver esta causa?´. Assim, o facto é uma coisa: o medo; é precisamente pelo tentar descobrir-lhe a causa e eliminá-la, que vos afastastes do facto. 


Com isso consumistes muitos dias ou talvez apenas um minuto, e esses muitos dias ou esse minuto constituiu um desperdício de energia.


O importante é que se compreenda o medo, e não a análise; não o exame introspectivo; não depois de descoberta a causa, cuidar de livrar-se dela. Todo esse processo é um desperdício de energia.


Por favor, não concordeis comigo. Observai. Eu estou a trabalhar, a pensar em voz alta, junto convosco, mas vós não estais a cooperar comigo. Desejais que eu vos guie; estais-me a seguir; e esta é a desgraça da moderna educação, a desgraça da vida religiosa, o conformismo.


Qual é, pois, o facto referente ao medo? 

O descobrimento da causa do medo eliminará o medo? Já conseguistes isso alguma vez?



Pode-se consumir alguns minutos ou algumas horas, até descobrir a causa. Ela pode ser descoberta de maneira muito simples e rápida. 

E, depois de descoberta, o medo desaparece? Não desaparece, decerto. 


A pessoa vê-se de volta ao ponto de partida e diz, então, para si `Alguma coisa não está certo, neste processo´.


Qual o facto referente ao medo? Como descobri-lo? Por certo, não podeis descobri-lo, se tratais de distanciar-vos dele, a beber, frequentar os templos, ouvir rádio, tagarelar incessantemente, ou ler livros e mais livros. 

Toda a forma de fuga ao medo constitui desperdício de energia. 





Isso é indiscutível e perfeitamente óbvio; portanto, não precisamos estender-nos a esse respeito. Qual é pois o facto relativo ao medo? Temos medo do que o outro diz ou temos medo desse facto que é a morte.


Ora, o que é o medo, e qual o facto referente ao medo? Qual a verdade contida no medo? Não se trata de lhe descobrir a causa, de fugir dele. Qual a verdade encerrada no medo?


Como poderá a mente descobrir a verdade relativa ao medo? 

Antes de mais nada, é necessário compreender que o medo é resultado do pensamento, não é exacto?
Se não pensásseis, não sentiríeis medo. Isto é, se não pensásseis na morte, por exemplo, nenhum medo teríeis da morte. Não é exacto?


E a ideia de que tereis de morrer, a ideia de terdes visto outras pessoas morrerem, a ideia de que precisais pôr a morte o mais distante possível de vós, é que causa o medo. 


Quer dizer, o pensar na morte causa medo. Pergunta-se, pois: `Pode-se viver no mundo sem pensar?´.
Isso não significa pôr-nos a dormir, a vegetar, porém perceber o facto que o pensar na morte (o pensamento, pois) cria o futuro. Correcto? 





O pensamento cria o futuro, o pensamento cria a ideia da opinião pública a vosso respeito; a opinião pública poderá tornar-se desfavorável a vós, tirar-vos o emprego. Vemos, pois, que o pensar no futuro cria o medo, gera o medo. 

E pensar no passado, nos tempos em que tínheis boa saúde, e todos os confortos, etc., tanto o pensar nesse passado, como no futuro, é medo. Correcto?


Assim, para se compreender o medo, é necessário compreender o mecanismo do pensamento, e não querer saber como livrar-se do medo. Como acabamos de assinalar, o pensamento gera medo. E pergunta-se então: `Como fazer parar o pensamento?´.



Não se pode cessar de pensar, isso significaria tornar-se idiota. 



Mas, se pudéssemos compreender o inteiro processo, o mecanismo do pensamento, tornar-nos-íamos aptos a compreender o medo e dele nos livrarmos. Está claro até aqui ?


O que é pensar? Pensar, como o mostra o cérebro electrónico, e como qualquer um pode observar em si próprio, é reacção da memória.

Pensar é a `resposta´ (response) ou reacção proveniente `do que ontem sucedeu´, a reacção produzida por essa ocorrência de ontem. 

Uma experiência, um incidente, um insulto ou lisonja, a lembrança de coisas passadas, a `reacção´ proveniente dessas coisas é o `processo do pensamento´.
Isto é, quando há um intervalo de tempo entre o `desafio´ e a `resposta´, nesse intervalo de tempo está o processo do pensamento.


Olhai, senhores; não façais acenos de cabeça; observai o facto em vós mesmos. Não estais aqui para concordar comigo.


Isto é, todo o pensar verifica-se no intervalo entre a pergunta e a resposta, ou seja o `desafio´ e a `reacção´. Esse intervalo pode ser longo, ou pode constituir-se de uma fracção de segundo. 

Nessa fracção de segundo ou nesse amplo intervalo, o mecanismo da memória está a procurar, a rebuscar, a indagar, exigir, esperar; depois, acha o que procura e, por fim, responde.


Isto é, quando se vos faz uma pergunta familiar, por exemplo `como vos chamais?´, a resposta é imediata, porque estais perfeitamente familiarizado com o vosso nome, a vossa ocupação, o vosso endereço; não há intervalo de tempo. 


Quando ouvis e logo respondeis, há um intervalo de tempo, que pode ser de uma fracção de segundo ou de um milionésimo de segundo, mas esse intervalo existe.

E quando se vos faz uma pergunta que requer mais exame, mais pensar, mais lembrar, então o intervalo de tempo é maior. Correcto? Estais a seguir isso? 

Durante esse intervalo de tempo, a vossa mente, o vosso cérebro, tudo está em actividade, à procura da resposta.

E há, também, um intervalo quando dizeis `Não sei´, mas estais a esperar, a olhar, a buscar, a indagar. 
Esse intervalo poderá durar um ano, ou um dia apenas, mas há espera, expectativa. E, por fim, ao achardes a resposta, dizeis: `Eis a resposta´. Correcto?

Vede, senhor, creio que todas as semanas são publicados quatro ou cinco mil, ou mais livros. Ignoro o número exacto. 

Imprime-se uma enorme quantidade de livros, e por meio desses livros adquirimos conhecimentos. 
A distância entre a Terra e a Lua, as estupendas descobertas da ciência, os progressos da medicina, da cirurgia, da farmacologia, as extraordinárias teorias económicas, sobre tudo isso se escrevem volumes e mais volumes, e não há tempo para lermos todos esses livros.


Entretanto, o homem alertado, vigilante, o homem que observa com interesse, penetração, clarividência, não tem necessidade de ler livro algum. 

Em toda a parte há o que ver e o que aprender. Não se depende então da autoridade; não se depende, tampouco, da própria experiência.





Assim, pois, nesta nossa reunião, o orador não vos está a transmitir conhecimentos, porém, antes, vós e eu estamos a explorar juntos a questão do medo; e nessa exploração, está-se-nos a revelar a inteira estrutura do pensamento. 


O facto, pois é este: o pensamento gera o medo. Compreender o mecanismo do pensamento significa enfrentar o facto, sem nenhum intervalo de tempo. 
E enfrentar o facto sem intervalo do tempo é acção imediata.


O homem que não admite nenhum intervalo de tempo, a quem só interessa o facto, esse homem não tem medo. Mas é realmente importante compreender o intervalo de tempo, ou seja a palavra, o símbolo, a ideia.


No geral, o que tememos é a palavra, e não o facto. Tendes medo da ideia da morte e não do facto que é a morte, pois não conheceis esse facto. 


Se enfrentásseis o facto, sem nenhum intervalo de tempo, a vossa acção seria inteiramente diferente; não existiria intervalo de tempo, para se ter medo. 
Não sei se estais a compreender.


Considera-se necessário o intervalo de tempo para a solução de um facto psicológico. Mas, não se trata naturalmente de um facto tal como a construção de uma ponte, pois para isso é necessário de tempo.



A admissão de qualquer intervalo de tempo constitui um desperdício de energia, porque nesse intervalo de tempo há conflito. 



E o intervalo de tempo compreende não só a busca da causa do medo, mas também a análise para se descobrir a causa, e a determinação de nos livrarmos dessa causa; tudo isso constitui o intervalo de tempo, no qual há esforço, e por conseguinte dissipação de energia. 
Estais a perceber, senhores?



Dissemos que iríamos também considerar a questão da violência. Na maioria somos violentos, não apenas fisicamente. Bater em alguém, irritar-se, ser ambicioso, competir, tudo isso é violência.

















Mas não vos iludais ao dizer que a violência é uma mera acção física. Violência é também esta acção tremenda: impor a si próprio uma disciplina, um padrão de disciplina: repressão, controle, subjugação, dominação. 



Não se trata da simples violência que conhecemos na nossa existência diária, porém de coisa muito mais subtil. Profundamente, bem como superficialmente, exteriormente somos violentos; tal é o facto, pois evoluímos do animal, e temos medo; e quanto mais forte o animal, tanto mais violento.


Não sei se já observastes os cães deste acampamento. Deveis tê-los ouvido todas as noites, perturba-vos o sono; e como são violentos! 

Há algo de extraordinário no barulho. Quanto mais se combate o barulho, quanto mais a ele se resiste, tanto mais se perde o sono e a tranquilidade. Mas, se deixardes `passar o barulho´, assim como o vento passa pela janela, isto é, sem lhe resistirdes, vereis então que os cães poderão ladrar até enrouquecer, sem que o vosso espírito se perturbe. Experimentai!


No geral, somos violentos. Por isso inventamos a ideia de que devemos ser `não-violentos´. Vêde o resultado! 



Sou violento, nos meus gestos, nas minhas atitudes, na minha inacessibilidade, no meu insulamento, no meu orgulho, na minha inveja, na minha ambição. 


Sou violento, transijo com a violência, e invento a ideia da `não-violência´.


O facto é uma coisa, e a fórmula, a ideia outra coisa, na qual nos vemos enredados. Correcto? 



Essa esquizofrenia, essa atitude dupla perante a vida, em que nunca enfrentamos o facto, mas falamos incessantemente de uma ideia sem nenhuma realidade, é a causa directa do conflito.


Não sou fraterno porque, para ser fraterno, não deve haver nacionalidade, nem família; `família´ como ideia, o que estou a dizer não significa que não devemos ter mulher e filhos. 

A família, evidentemente, é directamente anti-social, pois está sempre oposta ao resto do mundo. Não trataremos deste assunto.


Assim, como somos violentos e não temos possibilidades de dissolver essa violência, esperamos libertar-nos dela por uma ideia ou ideal, de modo que cultivamos tal ideal. 





Este orador nenhum ideal tem, porque só lhe interessam factos e não ideais. O facto só pode ser observado quando não há intervalo de tempo. Isso é preciso compreender, pois é bem evidente que a violência existe.



Ora, cumpre averiguar o seguinte: a palavra `violência´ criou a violência ou o facto existe por si próprio? Entendeis?



Senhor, a palavra não é a coisa; a palavra `mulher´, a palavra `criança´, a palavra `porta´, não são a mulher, a criança, a porta. Para a maioria de nós a palavra é a porta, a criança, a mulher. 


Olhai-vos, considerai isso vós mesmos e vereis a extraordinária influência das palavras.





Uma pessoa é comunista, brâmane, burocrata, engenheiro, doutor, com fartos honorários. Tudo só palavras! 


Cabe-nos, pois, averiguar se a palavra é responsável pela violência, ou se a violência existe independentemente da palavra. Examinai-o, vós mesmos. Requer-se muita atenção para averiguar isso.



No geral, estamos completamente enredados na palavra e não no facto. 


A palavra torna-se, assim, uma abstracção do facto, e por conseguinte, a maioria de nós ocupa-se unicamente com a abstracção, e não com o facto. 


Ocupar-se com o facto significa não admitir o intervalo de tempo entre o acto de ver e a acção, de modo que o ver seja acção.



E assim, como perceber o facto sem intervalo de tempo é acção, não há violência. Se examinardes isso, percebereis que a mente pode libertar-se completa e totalmente de qualquer forma de violência.



Só quando a mente não está a dissipar energia em conflito, e por conseguinte, não está a permitir a interferência de nenhum intervalo de tempo entre o observador e o facto, só então cessa o desperdício de energia; estamos, assim, a eliminar toda a espécie de conflito, toda espécie de conflito, que implica sempre dualidade.


A dualidade continuará existente enquanto ao facto se opuser uma opinião, uma ideia, um intervalo de tempo. 


Quando o facto está presente, e o tempo totalmente ausente, a acção é imediata, instantânea.





Começamos, pois, a ver que o desperdício de energia é causado pelo ajustamento ao padrão, que o desperdício de energia é causado pelo pensamento, pelo intervalo de tempo intercalado entre o passado e o futuro.


A mente educada pelo padrão político, socialista, comunista, é incapaz de olhar realmente um facto; só sabe olhá-lo através de uma opinião, através do seu condicionamento. 


Há outro factor de contradição, o qual é muito mais complexo e exige muito mais atenção. Esse factor é a dualidade pensador-pensamento, da qual não temos tempo para tratar agora. O que já examinamos é suficiente, se me acompanhastes até aqui.


Não haverá, pois, desperdício de energia quando a mente for capaz de enfrentar qualquer facto sem intervalo de tempo, quer se trate do simples facto de retirar uma pedra do meio do caminho, de consertar uma estrada, de retirar um espinho, quer se trate do facto que sois vós mesmos, o que sois realmente, e não o que pensais ser.


O enfrentar o facto sem o intervalo de tempo constitui a cessação do desperdício de energia, e por conseguinte, a continuação do perene movimento da energia. E nesse movimento não há resistência, conforme já expliquei. 


Essa energia não vai de encontro a nenhum obstáculo, porque compreende, na sua marcha, toda a resistência, toda a forma de conflito, toda a contradição; não há esperas, indagações, exigências; ela é movimento, vida; movimento de todos os momentos.





Essa energia parte do nível mais baixo (na realidade não existe nada `mais baixo´, mas servimo-nos da expressão como meio de transmitir o que queremos dizer), começa com a vida diária.
Não empregarei de novo a expressão `mais baixo´, para que não façais mau uso dela. 


A energia presente em cada acção da existência diária, o que pensais, o que fazeis, o que sentis, o que dizeis e como o dizeis, quando essa energia do movimento diário é libertada de todo e qualquer obstáculo, de todo e qualquer conflito, que é contradição, esta move-se então com extraordinária rapidez, com extraordinária liberdade. 


Só essa energia renova, torna a mente juvenil, fresca, inocente; e só ela alcança a culminância, e a culminância é o Inefável, o Sublime.


Pergunta:  A acção imediata é acção total?


Muito bem, senhor. Eu disse `acção imediata´. Esta é uma das coisas mais difíceis de compreender; portanto, não digais com tanta naturalidade `acção imediata´.


Como sabeis, há gente que diz: `Vivei no presente!´. Viver no presente é uma das coisas mais extraordinárias. 


Para viver no presente. e isso é acção imediata, é preciso compreender o condicionamento que é o passado, e não projectar esse passado no futuro; por conseguinte, é indispensável eliminar o intervalo de tempo e viver naquele extraordinário estado de consciência do imediato. Isso requer muita energia.



Mas essa energia não provém das ideias, senhor. 
Sabe-se que as ideias dão energia. As ideias sempre dão energia: a ideia de pertencerdes a uma nação vos dará energia para lutar contra outra nação. E vivemos satisfeitos, nesse extraordinário esbanjamento de energia.


E quando chega alguém e diz: `Não esbanjeis energia´, prontamente traduzis isso, e dizeis: `Muito bem, vou permanecer celibatário, vou fazer isto...´, e desse modo, criais contradições e nelas vos deixais enredar.


Assim, senhor, para compreender bem esta questão, deve a pessoa ser muito simples. Não me refiro à simplicidade de usar tanga, que, afinal, é uma ostentação de não-simplicidade. 


Digo que a pessoa deve ser realmente simples, quer dizer, penetrar em si própria, comungar consigo mesma a todos os instantes, sem nenhum intervalo de tempo.





O homem pode ir à Lua, a Marte, a Vénus; essa façanha requer energia. Considerai a espantosa energia dos engenheiros, dos matemáticos, dos mecânicos que ajustam entre si um milhão de peças. 
Creio que a montagem de um foguete requer um milhão de peças distintas e cada uma dessas peças deverá funcionar impecavelmente. Isso requer tremenda energia, e essa energia é relativamente fácil.


Mas, a energia necessária para um homem penetrar em si mesmo e nunca dar repouso a essa energia, não deixá-la estagnar-se, não deixá-la `olhar para trás ou para a frente´, porém mantê-la em movimento infinito, só essa energia, que penetrou profundo, infinitamente em si própria, conhece o Sublime." 








Jiddu Krishnamurti
"Uma nova maneira de agir"












t.


















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