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terça-feira, 5 de abril de 2016

be free!






How many masks wear we, and undermasks,
Upon our countenance of soul, and when,
If for self-sport the soul itself unmasks,
Knows it the last mask off and the face plain?

The true mask feels no inside to the mask
But looks out of the mask by co-masked eyes.
Whatever consciousness begins the task
The task's accepted use to sleepness ties.

Like a child frighted by its mirrored faces,
Our souls, that children are, being thought-losing,
Foist otherness upon their seen grimaces
And get a whole world on their forgot causing;

And, when a thought would unmask our soul's masking,
Itself goes not unmasked to the unmasking.


Fernando Pessoa






be free!





One asks, is it possible to be free


Is it possible for us as we are, conditioned, shaped by every influence, by propaganda, by the books we read, the cinemas, the radios, the magazines all impinging on the mind, shaping it to live in this world completely free, not only consciously, but at the very roots of our being? 

That, it seems to me, is the challenge, is the only issue. 
Because if one is not free, there is no love; there is jealousy, anxiety, fear, domination, the pursuit of pleasure, sexually or otherwise. 
If one is not free one cannot see clearly and there is no sense of beauty.











"Penso que deve interessar muito seriamente a todos nós o que vai pelo mundo, pois vê-se tanta tirania, tanto morticínio em nome desta ou daquela ideologia e que até nas chamadas democracias se acentua lentamente a tendência para moldar a mente humana em conformidade com determinado padrão de pensamento. 

Por toda parte, nos círculos religiosos e também no mundo político, onde quer que o homem viva, seja na aldeia, seja na cidade mais moderna, encontra-se essa tendência a ajustar-lhe a mente de determinada maneira; e pensamos (erradamente) que desse modo, se alcançará uma ordem social que não conterá em si o germe da deterioração e da destruição. Estamos a fazer isso há séculos, não é verdade? 

Pela educação, pelos dogmas e crenças religiosas, pela adoração de um certo deus, pela coerção em todas as formas, esperamos que o homem possa ser condicionado para actuar moderadamente, sem muita exploração, com senso de sociabilidade, e que essa sociedade subsistirá então de maneira ordenada. Desde a antiguidade, têm as religiões do mundo, sucessivamente, moldado o homem para pensar de uma certa maneira, e vemos actualmente os políticos servirem-se de modernos processos psicológicos para controlar-lhe o pensamento. 





Querem a acção colectiva numa base planeada, e assim, procuram adaptar a mente humana a uma certa ideologia, comunista, socialista ou capitalista, esperando que dessa maneira, vós e eu sejamos levados a viver amigavelmente, nas nossas mútuas relações, que constituem a sociedade.


É o que realmente sucede no mundo inteiro. Nas chamadas democracias há mais moderação: podeis ler o que desejais e dizer o que entendeis, dentro de certos limites; mas os jornais, em grande escala, controlam o vosso pensamento e fornecem os preconceitos que devereis nutrir. A literatura que ledes influencia o vosso pensar, e o político, com as suas promessas de uma futura utopia, molda-vos a acção. 


Assim, as autoridades políticas e religiosas moldam a pouco e pouco a mente do homem. Isso é um facto, quer o admitais, quer não.








Eis o verdadeiro estado de coisas, no mundo: A vossa mente é moldada como hindu, budista ou socialista, etc; estais condicionados para crer ou para não crer, e mudar simplesmente a forma de crença, ao abandonar o hinduísmo para vos tornardes cristão, comunista ou o que quer que seja, me parece uma coisa inteiramente fútil, não só fútil, pois é, em verdade, de certa maneira, uma espécie de crime, já que não resolve o problema fundamental. 

Passamos, meramente, de um palavreado para outro palavreado, e essa mudança das palavras tem, em si, extraordinário efeito na mente. Não sei se já observastes como somos escravos das palavras. Trataremos disso mais adiante, no decorrer destas palestras.



Agora, que deve fazer o homem que percebe exactamente o que se está a passar no mundo e realmente deseja descobrir se Deus, a Verdade, é uma realidade ou apenas uma subtil invenção do sacerdote? 
Afinal de contas, vós e eu somos o resultado do `colectivo´, não? 






E há necessidade de entes humanos completamente libertos do `colectivo´, da sociedade, livres de condicionamento, não em certas camadas ou em certos pontos, porém totalmente livres, porque só esses indivíduos podem descobrir o que é Deus ou o que é a Verdade, e não o homem que segue a tradição, o homem que pratica japam, que atinge a meta, que cita o Gita, e frequenta o templo todos os dias, por exemplo. São irreligiosos os que assim procedem. 


Mas o homem que deseja realmente descobrir o que é este extraordinário movimento do viver deve não só compreender o `processo´ do seu próprio condicionamento, mas também ser capaz de transcendê-lo; porque a mente só pode descobrir o verdadeiro quando livre de todo condicionamento, e não quando se limita a repetir certas palavras e a citar livros sagrados, esta mente não é livre.


É pois, dificílimo, neste mundo, a mente ser livre. O político e o chamado religioso falam sobre a liberdade, é um dos seus temas predilectos; mas põem muito cuidado em que não sejais livres, porque, no momento em que fordes livres, sereis uma ameaça à sociedade, à religião organizada, a todas as coisas mal-sãs existentes ao redor de vós.


Só a mente livre descobrirá o verdadeiro, só a mente livre pode ser criadora; e é essencial, numa cultura como a nossa, não se dê importância à observância de um padrão, doutrina, ou tradição, mas, sim, que se permita à mente ser criadora. Mas a mente só pode criar quando está livre de condicionamento, e essa liberdade não se adquire facilmente; é preciso trabalhar muito para alcançá-la. 

Trabalhais como um mouro para viver, passais anos e anos a `cumprir ordens´ para ganhardes o sustento, vos sujeitais a insultos, inconveniências, desprezo, subserviência; mas mais árduo, porém, é o trabalho de tornar a mente livre. 


Requer bastante discernimento, muita compreensão, um amplo percebimento, em que a mente toma conhecimento de todos os seus obstáculos, barreiras, dos seus movimentos de auto-mistificação, das suas fantasias, ilusões, mitos. 

Uma vez livre, pode ela começar a investigar, explorar; mas o buscar sem ser livre, para a mente nada significa. Compreendeis?










A mente que aspira a encontrar a Verdade, Deus, a extraordinária profundeza da vida, a plenitude do amor, deve primeiramente estar livre. Nenhuma significação tem para a mente que está moldada, condicionada, aprisionada na tradição, a dizer: `Estou em busca da Verdade, Deus´. 

É como um animal amarrado a uma estaca, que não pode ir mais longe do que lhe permite o comprimento da corda.



Assim, se desejamos descobrir que estado extraordinário é esse que se encontra além das fantasias da mente, experimentá-lo deveras, `viver com ele´ e conhecer-lhe o inteiro significado, necessitamos, por certo, de liberdade; e a liberdade exige trabalho mais penoso do que em geral estamos dispostos a empreender. 


Preferimos ser guiados, a descobrir; mas ninguém pode ser guiado para a Verdade. Compreendei, por favor, esse facto bem simples. 






Nenhum swami, nenhum sistema de ioga, nenhuma organização religiosa, nenhuma doutrina ou crença pode conduzir-vos ao descobrimento da Verdade. Só a mente livre pode descobrir. Isso é óbvio, não achais? 

Não podeis descobrir a verdade a respeito de coisa alguma pelo serdes meramente informados sobre o que ela é, porque então o descobrimento não é vosso. Se sabemos através de outrem o que é felicidade, isso nos torna feliz?



Para descobrirmos o sentido da vida, conhecer-lhe o conteúdo e não apenas as camadas superficiais a que chamamos `viver´, estarmos conscientes das suas alegrias, das suas extraordinárias profundezas, da sua amplidão e beleza, como também da esqualidez, da miséria, da luta, da degradação, para compreendermos o significado de tudo isso, a nossa mente, é claro, deve estar livre. 


Se chegarmos a alcançá-lo, então a vossa relação comigo e a minha relação convosco não se basearão na autoridade. Eu não posso levar-vos à Verdade, nem ninguém mais o pode; cabe-vos descobri-la a cada momento do viver quotidiano. 
Pode ser encontrada no curso de um passeio ou numa viagem de cruzeiro, ao discutirdes com a vossa esposa ou o vosso marido, quando estais sentados sozinhos ou a contemplar as estrelas. 


Se souberdes o que é meditação correcta, descobrireis o que é verdadeiro; mas a mente que foi `preparada´, `educada´, como se costuma dizer, condicionada para crer ou para não crer, que se denomina hindu, cristã, comunista, budista, essa mente nunca descobrirá a Verdade, ainda que a busque por um milénio. 


O importante, pois, é que a mente seja livre; e pode a mente ser livre? 






Compreendeis o problema, senhores? Só a mente livre pode descobrir o verdadeiro, descobrir, e não ser informada sobre o verdadeiro. A descrição não é o facto. Quando sentis fome, a descrição do alimento não vos nutre. 

Mas em geral nos satisfazemos com a descrição da Verdade; e a descrição, o símbolo, tomou o lugar do facto. 

Para descobrirmos se existe uma realidade ou não, devemos ser capazes de ver o verdadeiro como verdadeiro, o falso como falso, sem esperar que no-lo digam, como se fôssemos um bando de crianças, sem maturidade mental.


Assim, para descobrir o verdadeiro deve a mente, em primeiro lugar, estar livre, e o libertar-se é um trabalho dificílimo, mais difícil do que os exercícios de ioga. Estes exercícios apenas condicionam a mente, e só a mente livre pode ser criadora. 


A mente condicionada pode ser inventiva, conceber novas ideias, novas frases, novos mecanismos, poderá construir um dique, planear uma nova sociedade, etc.; mas isso não é acção criadora. 



A força criadora é muito mais do que a mera capacidade de adquirir uma técnica. É porque, dentro da maioria de nós, não existe essa coisa extraordinária que se chama `força criadora´, porque somos tão superficiais, vazios, insuficientes; e só a mente livre tem a virtude de criar.








O nosso problema é, pois: como libertar a mente? E é possível libertar a mente, não por camadas ou porções, um pedacinho aqui, um pedacinho ali, porém totalmente, de ponta a ponta, tanto o inconsciente como o consciente? Ou a mente está fadada a ser sempre condicionada, sempre moldada? 


Deveis descobrir por vós mesmos, e não esperar que eu vos diga se a mente pode ser livre. 


A mente só tem a possibilidade de pensar na liberdade, como o faz o prisioneiro, e estar assim condenada a nunca ser livre, a ser perene prisioneira do seu condicionamento ?




Compreendeis o problema? Pode a mente ser de todo livre, ou é da sua própria natureza o ser condicionada? 

Se a qualidade fundamental da mente é o ser limitada, nesse caso está fora de cogitações o descobrir o que é a realidade; podeis, então, continuar a repetir que há Deus ou que não há Deus, que isto é bom e aquilo é mau, e tudo isso está compreendido no padrão de uma dada cultura. 


Mas, para descobrirdes a verdade a esse respeito, deveis investigar por vós mesmos se a mente pode de facto ser livre. Eu digo que pode, mas isso não é para aceitardes ou rejeitardes. Isso pode ser verdade, ou pode ser a minha opinião, a minha fantasia, a minha ilusão, e não deveis basear a vossa vida num descobrimento feito por outro, ou numa ilusão, numa fantasia alheia, ou numa mera ideia. Vós tendes de descobrir.


Assim, a nossa investigação, no decorrer destas palestras, visará não a como tornar a condicionar a mente, de acordo com um padrão mais nobre, um melhor sistema ou ideologia, como o deseja a maioria das pessoas, porém, antes, a descobrir se é possível libertar de todo a mente. Porque, como vedes, senhores, torna-se necessária uma `explosão criadora´ para fazer nascer uma nova sociedade. 


A simples reforma, dentro do padrão, não é transformação nenhuma. Só há transformação quando nos libertamos do padrão e descobrimos algo novo. Se o que se descobrir terá influência na sociedade, não é isso o que importa. O que é de vital importância é o sermos capazes dessa extraordinária e explosiva força criadora, fora do padrão. Essa `explosiva´ força criadora tem sua acção própria, a qual poderá ou não influir na sociedade, mas, certamente, criará uma cultura totalmente nova, uma nova maneira de pensar, independente do padrão. 


Portanto, não estamos interessados na reforma da sociedade; pelo contrário, a nossa investigação visa a descobrir se podemos libertar-nos da sociedade, ou seja, do nosso próprio condicionamento.



Ora, como investigar a verdade relativa a qualquer coisa? Estais a compreender, senhores? Se estamos seriamente interessados e não apenas apegados a palavras e frases, a um precário modo de pensar, vós e eu desejamos saber como poderemos investigar a questão de se a mente pode ou não pode ser livre.

Como empreender essa tarefa? Por certo, um dos factores essenciais em qualquer espécie de investigação, de indagação, é não pressupor nem postular coisa alguma, não pensar a partir de uma conclusão; porque se começais a pensar a partir de uma conclusão, isso de modo nenhum é pensar. 


O pensamento que parte de uma ideia pré-estabelecida não é pensar, mas simples repetição.

Estar livre de conclusões, de pressupostos, é dificílimo; mas esse é o primeiro requisito essencial, assim me parece, da verdadeira investigação. 
Não podeis investigar de uma base pré-determinada, a qual pode ser completamente falsa, e por conseguinte, a vossa investigação conduzirá, infalivelmente, a algo igualmente falso.









Assim, podemos, vós e eu, como indivíduos, não como hindus, etc., não como habitantes da Índia ou da Europa, iniciar a nossa investigação sem pressuposto algum? 

Não me refiro aos pressupostos implícitos em factos, tais como amanhã, ontem, o tempo, o alimento, etc., porém aos pressupostos oriundos do estado da mente que exige segurança psicológica: o pressuposto da existência ou não existência de Deus, de que isto é bom, aquilo é mau, etc. 



Senhores, para descobrir se há Deus ou se não há Deus, é claro que não devo pressupor coisa alguma. 
Se tenho real empenho, se desejo deveras descobrir a verdade relativa a uma certa questão; se arduamente pretendo investigar a realidade, compreender o seu significado e beleza, ou a sua precariedade, a sua total vacuidade, se desejo conhecer a realidade, seja ela o que for, a minha mente não deve pressupor nada, não achais?



Verbalmente, podereis concordar que nada deveis pressupor; mas abandonareis de facto as vossas pressuposições? Porque, se nada pressupondes, que acontecerá? 

Estareis contra a vossa família, a vossa sociedade, contra toda a espécie de tradição; tereis de ficar sozinho, completamente dissociado dos valores, das ideias que vos foram inculcadas na mente.

E tal perspectiva horroriza bastante a vossa mente, porque as ideias, as tradições, os valores lhe proporcionam um sentimento de segurança, de permanência; o vosso emprego está baseado em tudo isso, e tendes um interesse psicológico nele. 


Assim sendo, consciente ou inconscientemente, a vossa mente se rebela contra a ideia de ficar completamente só, a fim de descobrir. 






Estar completamente só é estar livre de contaminação pela sociedade, a sociedade, que é constituída de inveja, avidez, vaidade, desejo de poder e prestígio, ânsia das coisas mundanas e das chamadas extra-mundanas, e só essa mente está livre para investigar e descobrir a verdade ou a falsidade daquilo que a supera. 



Assim, o auto-conhecimento é o começo da sabedoria. Nos livros não é encontrável a sabedoria; só desponta na mente que procura compreender o seu próprio mecanismo, e só essa mente pode descobrir a realidade que transcende os seus próprios limites.



Em todas estas palestras haverá perguntas e respostas, ou antes, eu não vou dar respostas às perguntas, mas iremos examinar juntos cada problema.




Ora, porque fazeis uma pergunta? Evidentemente a fazeis com o fim de encontrardes uma resposta. 
E qual é mais importante, a pergunta ou a resposta?



Deveis esclarecer-vos a esse respeito junto comigo. Se a resposta é mais importante, nesse caso a questão não vos interessa realmente, porque estais em busca de uma resposta. 
Compreendeis, senhores? Vê-lo-eis logo, à medida que prosseguirmos.



Há um problema qualquer e desejais uma solução para esse problema. 
Ora, o que está realmente a suceder ao desejardes a solução de um problema? 


A vossa mente não está a dar toda a atenção ao problema. 
Está dividida, distraída pela exigência de solução. 
Um problema só existe quando a atenção está dividida; mas quando aplicais a vossa inteira atenção ao que se costuma chamar `um problema´, ele, o problema, vos dá então a sua própria solução, e não tendes necessidade de ir procurá-la fora do problema. 
Porém, não podeis atentar totalmente para o problema, se estais a procurar uma solução.




Não darei, pois, nenhuma resposta. A vida não tem resposta categórica para nada; o que ela vos manda fazer é penetrar o problema, considerar o problema com toda a intensidade, atenção, vitalidade, que lhe puderdes dar. Então, o problema se resolve por si mesmo; ele ainda não se resolveu porque só quereis encontrar uma `solução´.


É desta maneira que vamos considerar esta pergunta, e perdereis o seu significado se ficardes à espera de uma resposta minha. Digo-vos, logo de começo, a fim de evitar enganos da vossa parte, que não vou vos dar nenhuma resposta, porém vós e eu vamos investigar juntos o problema.












Pergunta: Embora os líderes políticos, os reformadores sociais e os vários santos a condenem incessantemente, a exploração continua a existir nas relações humanas, do mais alto funcionário do governo ao iletrado trabalhador de aldeia. Vós mesmo tendes pregado contra ela nestes últimos trinta anos. Como concebeis acção isenta de exploração?



J. Krishnamurti: Senhores, podeis estar conscientes deste problema da exploração, ou podeis não cogitar dele, porém ele está bem à frente do vosso nariz e existe em todos os níveis sociais. O homem talentoso, política, religiosa ou cientificamente, explora-me, porque tem capacidades que eu não tenho. Se tenho uma certa instrução e vivo numa pequena aldeia, exploro os analfabetos de lá, e o trabalhador da aldeia explora a sua mulher. 
Ora, o que se entende por exploração?

Há a exploração da terra: utilizamo-la, cultivamo-la, a fim de colher os produtos terrestres para benefício do homem. Esta é uma espécie de exploração. E há a outra espécie, que é a exploração do estúpido pelo inteligente, do fraco pelo forte. O político esperto, o sacerdote sagaz, o líder astuto, o santo perspicaz, todos têm sua ideia de como deve ser a sociedade, a sua ideia sobre moral, sobre virtude, e tiram proveito dessa ideia, com a sua maneira de viver, a sua maneira de falar, etc.; e os estúpidos, os iletrados, os irreflectidos os seguem. 

Assim, em que nível nos colocamos ao falar de `exploração´? Compreendeis, senhores? 
Quando um homem diz:`Encontrei Deus; sei o que isso significa´, e ficais muito interessados em conseguir a mesma coisa, não há dúvida que ele vos explora. O chamado líder espiritual supõe conhecer o Mestre e vós não o conheceis, e assim, o seguis, porque desejais algo que julgais que ele tem, ou algo que ele promete. Por outras palavras, sois explorados `para vosso próprio bem´.


Assim, quando um homem`sabe´ ou diz que`sabe´, e outro diz: `Eu não sei, ensinai-me´, não existe exploração na relação entre os dois? 
Entendeis, senhores? 




Quando há instrutor e discípulo, não há exploração? Se digo: `Eu sei, eu experimentei´, e vós dizeis que não sabeis, mas desejais ter essa mesma experiência, qualquer que ela seja, não vos colocastes na situação de ser explorados por mim?



Certo, quer se acumulem posses, quer conhecimentos, a coisa é a mesma; só o nível é diferente. E enquanto se verificar o processo de acumulação, tem de haver exploração. O problema, pois, é: se podemos ficar num `estado de aprender´ e não num `estado de acumular´. Se a vida é para mim um `processo de aprender´, não há então exploração, não há divisão de instrutor e discípulo.


Então, ambos somos importantes e aprendemos um do outro. Não há então `o de cima´ e `o de baixo´, o mais espiritual e o menos espiritual, porque então ambos estamos a aprender e não a acumular.



Por conseguinte, enquanto há acumulação, em qualquer forma, ou seja, acção egocêntrica, tem de haver exploração. 
Essa acção egocêntrica pode ser desenvolvida em nome da sociedade, ou em nome de Deus, ou pode ser em nome de uma nação ou ideologia, mas é sempre exploração. 















O político que está `de cima´ pensa que sabe o que é bom para o país. 
Ele tem poder, prestígio, capacidade, popularidade, e portanto, serve-se de vós, que não sabeis, para pôr em prática as suas ideias; e como não tendes a capacidade necessária para estudar, investigar, etc., vós o seguis, simplesmente.






Senhores, é isso o que estamos realmente a fazer. 
`Vós sabeis e eu não sei´, eis como estabelecemos no mundo uma mentalidade hierárquica, baseada na autoridade. 



E o interrogante deseja saber como eu concebo a acção de um homem que não está a explorar, isto é, que não está a acumular; que pode ter algumas roupas, algumas posses, mas é destituído do espírito de aquisição na forma de bens materiais, ideias ou crença, e que está livre do desejo de engrandecimento pessoal, de todo e qualquer interesse egocêntrico, na vida.







Ora, por que o desejais saber? 
Por que perguntais como concebo o `estado de acção´ isento de exploração? É porque sois indolentes, não é verdade? Quereis ser informados sobre o que é esse estado, quereis examiná-lo, para aceitá-lo ou rejeitá-lo; não quereis estar nesse estado. 
Se estivésseis nesse estado, não faríeis uma pergunta dessas.




Escutai, senhores, por favor. Isto é realmente importante, porque, se o compreenderdes, vos levará a algo prodigioso. Mas, porque sois indolentes, dizeis: `Dizei-me o que significa ser livre de exploração, e eu concordarei convosco ou discordarei de vós´. Não desejamos estar nesse estado, porque exige trabalho penoso, exige investigação, quebra das actuais condições de exploração, quer no nível mais alto, quer no ínfimo dos níveis. 


Não desejamos quebrar as presentes condições de exploração; queremos que elas continuem, e no entanto, perguntamos qual é o estado do homem que actua sem exploração. 
E eu digo: descobri-o, ponde-vos nesse estado, e vereis que ele tem sua acção própria, acção muito mais significativa, muito mais vital e mais rigorosa do que a outra.






Saber o que significa não adquirir, ter o sentimento desse estado, e não apenas a imagem mental suscitada por palavras, é não conhecer nenhum sentimento da própria importância, nenhum sentimento de acumulação; é ser realmente nada, interiormente. Embora exteriormente possais ter algumas roupas, algumas posses, todas essas coisas são insignificativas. 
Sentir profundamente que não estais a adquirir bens materiais, que estais à procura de êxito, que não estais a desejar o beneplácito de uma sociedade corrupta; que psicologicamente, não tendes nenhum interesse em `vir a ser´ alguma coisa. Compreendeis? 







Enquanto estais ocupados em `vir a ser algo´, que é processo de aquisição, tem de haver exploração. Podeis falar muito sobre o estado de não-exploração, mas, enquanto houver essa ânsia interior de `vir a ser algo´, tornar-se santo, político famoso, rico, ou seja o que for, sendo esta a própria raiz da acção egocêntrica, tem de haver exploração. 


E esse movimento de “vir a ser algo” é uma das coisas mais difíceis de abandonar, porque para ficar livre dele é preciso compreender o inteiro `processo´ do tempo como meio de ascensão para o êxito, pela aquisição de posses, de poder, posição ou saber. 


Qualquer actividade ou reforma social, como meio de tornar importante o `eu´ ou como meio de auto-esquecimento, conduz à exploração.



























Se estais seriamente interessado nesta questão e se desejais ardentemente descobrir se a mente pode, em algum tempo, cessar de explorar, então, descobrireis que é possível viver neste mundo sem nada acumular, e isso significa morrer a cada minuto para tudo o que adquiris, para o saber, para a virtude, para as coisas que acumulastes, tanto neste mundo material como no mundo psicológico. 


Mas, morrer totalmente para todas as coisas, para a experiência, para o saber, para todo o `processo´ de aquisição, é árdua tarefa. 

Significa estar completamente consciente, inteiramente atento aos movimentos da mente, e isso só é possível quando se observa o `processo´ mental em funcionamento, ou seja na acção das relações. 





Observai como tratais os vossos criados, como adulais o patrão, o político importante, o governador, o santo, e o homem tido por `sabedor´. Só a mente realmente humilde não está a explorar, e a humildade não é coisa que se cultive. 





Tem-se a mente no estado de `não-exploração´ quando está em silêncio, sozinha, quando não adquire, nem busca êxito, nem galga os degraus da popularidade. Só essa mente pode trazer a sanidade a este mundo tão cheio de crueldade e exploração."



Jiddu Krishnamurti
"O homem livre"

















t.































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