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sexta-feira, 1 de abril de 2016

Act without contradiction...







"If you were walking across a plain, had an honest intention of walking on, and yet kept regressing, then it would be a desperate matter; but since you are scrambling up a cliff, about as steep as you yourself are if seen from below, the regression can only be caused by the nature of the ground, and you must not despair."

Franz Kafka
"The Zurau Aphorisms"
















"It would perhaps be worthwhile to talk over together the rather complex problem of action, not a specialized action in relation to a particular problem, but action as a whole. 

We are not here concerned with political action, or with whether you should choose a particular job, or with what you should do under certain circumstances. 

I think such an approach to the problem of action is invalid because we always seem to get lost in the part and are therefore incapable of tackling the problem as a whole. 

So if it is possible, I would like to consider, rather hesitantly, this question of action, of what to do.

Are we not faced with this problem, all of us, in different ways? But we unfortunately translate it in terms of what to do in a particular set of circumstances, what to do when a challenge arises, and so on. 

Surely, action born of choice is partial; it is never total, and our problem is how to capture the significance, the meaning of total action, and not be caught in a particular form of action demanded by society. 

If we can be very clear in our approach to this problem, then I think we shall find the right answer. But most of us invariably put wrong questions and get wrong answers, which only creates further problems.


So, what is total action


If one understands the totality of action, one will respond rightly to a particular demand, but to respond to a particular demand without this understanding only creates further confusion. 

If I act merely politically, without completely understanding the totality of action, such partial activity itself breeds contradiction. 

That is the case with most of us. Being caught in a network of special ideas, we try to solve our problems through partial action, which only increases and expands our problems.


Then what is total action? It is action in which there is no contradiction, is it not? 


And such action must obviously come about without effort because effort is the result of contradiction. (...)

But before we go into the question of total action, must we not inquire into the present action of the individual in relation to society, in relation to an organized political group, in relation to everything that is going on about us? 

What is the action of the individual at present, and what can he do when society is crushing him, perverting his thinking, so that he has no freedom? 

The more society is organized, the more ruthless it is with the individual. We see this happening in different parts of the world. The communists have no place for the individual; though they talk about his ultimate freedom, the individual is completely destroyed. It is essentially the same with the organized religions. Though they talk about the individual attaining salvation, the individual is conditioned according to a particular creed, whether it be Catholic, Muslim, Hindu, Buddhist, or what you will."



Jiddu Krishnamurti





Act 
without 
contradiction...





































"Em regra, não fazemos perguntas fundamentais, e quando as fazemos, esperamos que outros nos dêem as respostas. Esta tarde, se possível, examinaremos vários problemas que considero fundamentais. Um deles é a fragmentação da vida em actividades várias, opostas umas às outras, contraditórias, e causadoras de enorme confusão. 

Precisamos saber se existe uma acção que possa englobar todas essas actividades divergentes, contraditórias, fragmentárias, pois, ao observar a nossa própria vida, podemos ver quanto estamos fragmentados: politicamente, religiosamente, artisticamente, cientificamente, comercialmente, etc.; todos esses fragmentos em oposição uns aos outros, em contradição uns com os outros. Existe uma acção capaz de atender totalmente às exigências da vida, sem ser contraditória em si mesma? Não sei se alguma vez, sequer, fizestes tal pergunta.


De um modo geral, cada um de nós vive encerrado na sua própria e insignificante actividade e a tentar tirar dela o melhor partido possível. Se sois político, e espero que não o sejais, dependeis de votos e de tantas outras futilidades existentes no mundo com o nome de política; se sois um indivíduo religioso, tendes crenças várias ou seguis algum método de meditação em contradição com as realidades da vossa vida diária; se sois artista, viveis no vosso mundo próprio, absorto nas vossas fantasias, na vossa concepção do belo, na vossa visão das coisas, etc.; se sois cientista, viveis no vosso laboratório, e fora dele sois um homem como os outros: artificial, competidor, etc.






Assim, diante desses factos bem conhecidos da maioria de nós, perguntamos: Qual a acção capaz de atender a todas as exigências e de permanecer não contraditória, integral?  
Se fizerdes a vós mesmos esta pergunta, tal como a estamos a fazer agora, qual será a vossa resposta? Pois, como dissemos na reunião anterior, estamos aqui a compartilhar o problema da nossa vida, não intelectual ou verbalmente, porém realmente. 

E tal é o significado da comunicação: considerar juntos o nosso problema comum, que é este: Existe uma acção, uma maneira de viver, em cada dia, que responda à pergunta se a vossa vida, quer como artista, quer como cientista, negociante, etc., pode ser vivida integralmente, sem nenhuma fragmentação, e portanto, sem nenhuma acção contraditória?


Se está clara a pergunta, como iremos descobrir essa acção? Por que método, por que sistema? Se queremos encontrar um método, uma maneira de viver segundo um certo sistema ou padrão, então, esse próprio sistema, esse próprio padrão é contraditório. Peço-vos que compreendam claramente este ponto! 




Se sigo um determinado sistema, a fim de produzir uma acção integral, completa, plena, rica, bela, esse sistema ou método torna-se mecânico. Por conseguinte, as minhas acções serão mecânicas e sempre incompletas. Cabe-me, pois, abandonar toda a ideia de sistema, de actividade repetida, mecânica. E cabe-me, igualmente, investigar se o pensamento pode ajudar-nos a criar essa espécie de acção. Compreendeis minha pergunta? 

Vós viveis fragmentadamente: no escritório sois diferente do que sois em casa; tendes pensamentos `particulares´ e pensamentos `públicos´. Assim, ao perceber a enorme separação e contradição existente entre os fragmentos, perguntamos se o pensamento pode uni-los, efectuar a integração de todos esses elementos. É capaz de tanto?


Consequentemente, cumpre-nos investigar a natureza e estrutura do pensamento. Pode o pensamento, a actividade pensante, o processo intelectual de raciocinar, produzir uma vida harmoniosa? 

Para averiguarmos isso, cumpre-nos investigar, examinar atentamente a natureza e estrutura do pensamento; isso significa que iremos examinar juntos o vosso pensar, não a descrição ou a explicação dada pelo orador, porquanto a descrição nunca é a coisa descrita e nem tampouco a explicação é a coisa explicada. 

Portanto, não nos deixemos enredar na explicação ou na descrição, mas investiguemos juntos, verifiquemos juntos como o pensamento funciona e se ele é realmente capaz de produzir uma maneira de vida totalmente harmónica, não contraditória, completa em todas as acções. 

Isso é muito importante, porque se desejamos um mundo totalmente transformado, um mundo sem corrupção, uma maneira de vida em si mesma significativa, temos de indagar se o pensamento é capaz de criar tal maneira de vida. E indagar, também, o que é o sofrimento, se ele pode findar, e o que é a dor, o medo, o amor, a morte.

Cabe-nos descobrir por nós mesmos o significado de tudo isso, não em conformidade com algum livro ou com o que disse outra pessoa, pois isso não tem valor algum. 
O conhecimento, com efeito, tem muita importância e significação. Se desejais ir à Lua, necessitais de extraordinários conhecimentos tecnológicos; para fazerdes qualquer coisa de maneira eficiente e clara, necessitais de abundantes conhecimentos. 

Mas, esse próprio saber torna-se um sério empecilho quando queremos descobrir uma maneira de viver totalmente harmoniosa, porque o saber pertence ao passado. O saber é o passado, e se vivemos de acordo com o passado, então, é óbvio, surge uma contradição: o passado em conflito com o presente. 

O saber, tal como a tradição, poderia ser útil num certo nível, mas a tradição, se dela nos servimos para atender às exigências do presente, cria confusão e contradição.

Cumpre, pois, investigar a sério a natureza do pensamento.

O que é pensar? Fazei a vós mesmos esta pergunta: O que é pensar? Temos de compreender o significado profundo do pensamento, porque nós vivemos pelo pensamento. Se fazemos qualquer coisa, ou a fazemos reflectidamente, ou a fazemos mecanicamente, em conformidade com o padrão de ontem, a tradição. Temos, portanto, de ver claramente qual é a função do pensamento. 

Se vos observais muito atentamente, não descobris que o pensamento é reacção da memória, sendo essa memória experiência, conhecimento? 

Se não tivésseis nenhum conhecimento, nenhuma experiência, nenhuma memória, não haveria pensar. Estaríeis a viver num estado de amnésia. O pensamento, como vimos, é reacção da memória, e a memória está condicionada pela cultura em que viveis, pela educação que recebestes e a propaganda religiosa que vos foi instilada; o pensamento é reacção da memória, isto é, do saber e da experiência nela acumulados. Necessitamos do conhecimento, da memória, para acharmos o caminho de casa, para falarmos uns com os outros, mas o pensamento, sendo reacção da memória, nunca é livre, é sempre velho.


E o pensamento, essa reacção do `velho´, da memória, é capaz de descobrir uma maneira de viver totalmente harmoniosa e clara? Todavia, queremos descobri-la pelo pensamento; e digo: `pensarei nisso a fundo e descobrirei a maneira de viver harmoniosamente´. 
E, já que o pensamento é reacção do passado, do nosso condicionamento, não tem nenhuma possibilidade de descobrir a maneira harmoniosa de viver. Estais a entender? O pensamento não pode descobri-la, e entretanto, usamos o pensamento para descobri-la. 

Bem sabemos que o pensamento é necessário, para podermos voltar a casa, para ganharmos a vida, para fazermos qualquer coisa; num certo nível, ele é absolutamente necessário, mas quando se trata de descobrir uma maneira de viver diferente da actual, que é de desarmonia, o pensamento torna-se um empecilho.


Ao perceberdes esta verdade, que o pensamento, por mais racional e lógico, por mais são e claro que seja, é incapaz de descobrir aquela maneira de vida, qual o estado da vossa mente? Estais-me a acompanhar? Estais a trabalhar com o orador, ou estais meramente a ouvir palavras e ideias? Compreendeis esta pergunta? Espero que estejais a trabalhar com igual ardor e empenho, porque de contrário, nada descobrireis. 






E nós, que vivemos neste mundo insano, temos de descobrir uma nova maneira de viver.






Ora, se o pensamento é incapaz de descobri-la, e compreendemos isso como um facto verdadeiro e não como uma explicação verbal, qual é então o estado da mente, da vossa mente? Qual o estado da mente quando percebe um facto verdadeiro? 

Não me respondais, por favor. Nunca deixais entranhar uma verdade; não`ficais com ela´, mas estais sempre prontos a saltar com palavras e explicações, e sabem muito bem que a explicação não é a coisa real.

Perguntamos, pois: Qual o estado da mente que percebe a necessidade do pensamento e percebe também que o pensamento, por mais que se esforce, não pode de modo nenhum produzir aquela beleza de uma vida totalmente harmoniosa? 

Esta é uma das coisas mais difíceis de transmitir, um dos assuntos mais difíceis de tratar, porque até agora só temos vivido de experiências alheias, sem percepção directa; temos medo da percepção directa. 
E, diante deste desafio, a vossa tendência é fugir, refugiar-vos em palavras e explicações; mas cumpre pôr de lado todas as espécies de explicação. 

Assim, qual o estado da mente, isto é, qual a natureza da mente que percebe a verdade? Por ora, deixemos de lado este ponto, porque não há tempo para entrarmos em pormenores e há ainda muitos assuntos a tratar, a ele voltaremos.

Todos nós sabemos o que é sofrimento, o que é dor física e moral. Se sois hindu, o explicais pela lei do karma; se sois cristão, tendes numerosas formas de racionalização. Segui, não este orador, mas a vós mesmos, e observem o vosso próprio sofrimento. 

Perguntamos se o sofrimento pode findar, isto é, se pode ter fim a dor, a tristeza da solidão, do isolamento, a tristeza de não alcançar este ou aquele alvo, a tristeza de perdermos alguém que pensamos amar; e também, se pode terminar o sofrimento não pessoal, as dores do mundo através de tantos milénios, este mundo em que o homem continua a destruir a sua própria espécie, em que o homem é tão cruel para com o homem. 





Ao vermos um homem atravessar o parque, só, andrajoso, sujo, infeliz (ele jamais conhecerá a alegria de viver), sentimos uma grande tristeza, não por nós mesmos, mas por existirem no mundo entes humanos tão desditosos, pois compreendemos que foi a sociedade que criou tais condições.

Ante o nosso próprio sofrimento, tratamos de fugir, e as palavras, as teorias, as explicações e crenças nos oferecem os desejados meios de fuga. 

Se morre o meu filho, tenho uma dúzia de explicações. Fujo, por medo à solidão. E o que acontece? Torno a adormecer. Mas, o sofrimento é uma espécie de desafio. 
Se `ficardes´ com ele, completamente, sem fugir, sem `verbalizar´, sem nenhum movimento de pensamento, descobrireis toda a sua estrutura.

E cumpre-vos, também, descobrir, por vós mesmos, se o medo pode terminar, não apenas o medo físico, mas também os temores internos, psicológicos.

O que é o medo? É ele produto do pensamento? Obviamente, o medo resulta do pensamento. Pensais numa certa coisa que, ontem ou no ano passado, vos causou dor, física ou de outra espécie, e sentis medo; é desse modo que o pensamento nutre o medo e lhe dá continuidade. 

O pensamento projecta, também o medo no futuro: posso perder o meu emprego, a minha posição, o meu prestígio, a minha reputação. Compreendeis? O pensar tanto no passado como no futuro gera medo. Por conseguinte, perguntamos: Pode o pensamento cessar?






E note-se, ainda, que o pensamento sustenta o prazer. O pensar no prazer que ontem experimentei, ao contemplar o pôr-do-Sol, tão maravilhoso, tão belo, tão estimulante, etc., sustenta aquele prazer.

Temos, pois, o sofrimento, o medo, o prazer e a alegria.

A alegria difere do prazer? Não sei se alguma vez a conhecestes. A alegria `acontece´, vem subitamente. Mas, não se sabe como, o pensamento dela se apodera e a reduz a prazer; e assim, dizeis: `Quero experimentar de novo aquela alegria´. O pensamento, pois, sustenta e nutre o prazer, o medo, e dá continuidade ao sofrimento.

E, por fim, há o medo da morte, o medo fundamental do homem. Dele trataremos mais tarde.

Agora, ao perceberdes que o pensamento perpetua o prazer e o medo, e que evitar o medo, mediante diferentes formas de fuga, deforma a mente, e por conseguinte, a torna incapaz de compreender de todo o medo, qual o estado da vossa mente ao perceberdes esta verdade? 

E qual o estado da mente que sabe quando o pensamento é necessário, quando deve ser empregado, logicamente, objectivamente, equilibradamente, e sabe também que o pensamento, que é reacção do conhecimento, ou seja do passado, torna-se um obstáculo a uma maneira de viver isenta de contradição? Qual o estado da vossa mente quando dizeis: `Compreendo´? Está completamente vazia e em silêncio. Não é exacto isso? 

Só se pode ver uma coisa bem claramente quando não há escolha. Havendo escolha, há confusão. 
Só a mente confusa escolhe, discrimina entre o essencial e o não essencial; mas o homem que vê com clareza não faz escolha.

Há, pois, uma acção que vem quando a mente está vazia de todo o movimento de pensamento, excepto aquele movimento que é necessário quando o pensamento deve funcionar. A mente é então capaz de dar atenção aos factos da vida diária. Mas, é ela capaz de funcionar dessa maneira se sois muçulmano, budista, hindu, etc, se estais condicionado por esse fundo? Não é, evidentemente. 





Por conseguinte, se perceberdes esse facto, deixareis de ser muçulmano, sikh, cristão, etc, e vos tornareis outra coisa bem diferente, não algum dia, no futuro, mas agora, neste mesmo momento. De outro modo, jamais vereis a verdade. Sobre ela podereis falar interminavelmente, ler todos os livros do mundo, mas jamais alcançareis a sua beleza e vitalidade. 

Assim, a mente que investiga, que faz perguntas fundamentais, indaga também se a sociedade pode ser transformada radicalmente, fundamentalmente, não a sua estrutura económica, mas sim, a estrutura psicológica, Porque, enquanto a psicose não for transformada, continuareis a fazer, exteriormente, as mesmas coisas, modificadas, talvez, mas sempre segundo o velho padrão.

Cabe-vos, pois, fazer esta pergunta fundamental; e ninguém pode responder senão vós mesmos. Não há confiar em ninguém. Deveis, portanto, observar, e nesse observar, aprender. 

Assim, pode a mente manter-se completamente desperta, e observar, a fim de ver a verdade relativa a qualquer coisa, e vendo-a, actuar, assim como actuais em presença de um perigo? Ao verdes um perigo, actuais instantaneamente. Do mesmo modo, ao verdes, por inteiro, a verdade relativa a qualquer coisa, há acção imediata.







INTERROGANTE: O que acontece à mente após a desintegração do corpo?

J. KRISHNAMURTI: Porque dissociais o corpo da mente? Existe tal coisa, uma mente separada do corpo? Psicossomaticamente, existe tal divisão? Ora, senhor, vós fostes educado, neste país, nesta cultura, como hindu, muçulmano, sikh ou sabe Deus o que mais. O vosso condicionamento é o resultado da sociedade em que viveis, sociedade que criastes e que, portanto, não difere de vós.

Vós criastes esta sociedade, os vossos pais a criaram, todas as precedentes gerações criaram a cultura em que viveis e de que fazeis parte. Ora, podeis separar-vos dessa cultura? Só podeis separar-vos, libertar-vos dessa cultura, quando não fazeis parte dela, Não é simples isto? Identicamente, porque separais a mente do corpo? Não vamos responder a esta pergunta, porém vamos examiná-la. Porque separais o corpo e a mente? Porque vos ensinaram que existe o Atman, o `eu superior´, a `alma´. Sabeis alguma coisa a respeito dessa entidade ou repetis o que outros disseram? Como sabeis ser verdadeiro o que outros disseram? Não importa quem o tenha dito, como sabeis que é verdadeiro, e porque o aceitais como tal?

Assim, para descobrirdes se a mente é algo totalmente diferente do organismo, a vossa mente deve estar lúcida, não ter deformação alguma, estar livre de confusão, de ajustamento. Tendes esta espécie de mente, uma mente que não se ajusta? Isto é, quando comparais, quando vos comparais com alguém, estais a ajustar-vos. Descobrir se se pode viver sem ajustamento é descobrir se se pode viver sem comparação, isto é, sem vos comparardes com o que ontem fostes ou com o que sereis amanhã, ou vos comparardes com o homem rico, com o santo, o herói, o ideal. Comparar-vos significa `medir-vos através de outrem ou de uma ideia´. Descobri o que significa viver sem comparação. Sois então livre, se a vossa mente está então inteiramente livre do seu condicionamento.

INTERROGANTE: A questão fundamental da filosofia é se a mente e o corpo são ou não são separados.

J. KRISHNAMURTI: Eu não tenho filosofia.

INTERROGANTE: Desejo a vossa opinião.

J. KRISHNAMURTI: Não tenho opinião.

INTERROGANTE: Desejo esclarecer-me.

J. KRISHNAMURTI: Sereis esclarecido, senhor, se escutardes. Vede, para se descobrir a verdade, nesta matéria, não devemos seguir ninguém. Filosofia significa amor à Verdade, e não amor a teorias, a especulações, a crenças. Significa amor à Verdade, e a Verdade não é vossa nem minha; por conseguinte, não podeis seguir ninguém. Tratai de descobrir este facto básico de que a Verdade não pode ser encontrada através de outrem e que deveis ter olhos para vê-la; pode-se encontrar numa folha morta, mas tendes de vê-la. Exprimir uma opinião a respeito dela é ridículo. Só os tolos opinam.

Nós não estamos interessados em opiniões, e sim, apenas nisto: Possui a mente uma propriedade ou função intrínseca independente do organismo físico? Compreendeis esta pergunta? É a pergunta que me fizestes, se a mente é independente do corpo, se ela se encontra fora das insignificantes limitações nacionalistas, religiosas, etc. Para descobrirdes isso, deveis estar de sobremodo alerto, vigilante; deveis tornar-vos vigilante e sensível. Se sois bem sensível, o mesmo dizer, inteligente, descobrireis, se penetrardes bem fundo, que existe algo inatingível pelo pensamento ou pelo passado.

O pensamento, como dissemos, é matéria, reacção da memória; a memória está contida nas células cerebrais, e portanto, é matéria. Só se as células cerebrais se tornarem totalmente quietas, tereis possibilidade de descobrir aquela coisa; mas, dizer que ela existe ou não existe não tem sentido nenhum.

Dedicai-vos, pois, a descobri-la, do mesmo modo como trabalhais para viver. Mas, em vez de vos dedicardes a descobri-la, para o que necessitais de energia e paixão em sumo grau, ides beber em fontes estranhas, que estão secas. Tendes de ser a luz de vós mesmos.

INTERROGANTE: Credes na evolução?

J. KRISHNAMURTI: Isso é bem simples, senhor, e vou responder-vos. Há evolução do carro de bois ao avião a jacto. Ir à Lua é evolução. Biologicamente, é provável que os entes humanos tenham alcançado o apogeu; mas existe evolução interior? Entendeis esta pergunta? Pode o `eu´ evoluir, tornar-se um ente maravilhoso?

Ora, antes de perguntardes `pode o eu evoluir?´, tendes de saber o que é o `eu´. Dizer`o eu evolui’ não tem sentido. O que é o `eu´? O `eu´ são os vossos móveis, a vossa casa, os vossos livros, a vossa memória, as lembranças de prazer e de dor, o `eu´ é um feixe de `memórias´. É mais alguma coisa? Dizeis que o `eu´ é espiritual, que nele existe uma essência espiritual. Como o sabeis? Não é isso uma invenção do pensamento? 
Cumpre-vos, pois, descobrir porque o pensamento inventa tais coisas. Não aceiteis nada, nem mesmo o vosso `eu´, porque, para descobrir a Verdade, a mente deve estar livre do `eu´ ou `eu superior´. `Eu superior´ e `eu´ é a mesma coisa, uma pura invenção dualista.

INTERROGANTE: Como pode a mente inferior descobrir a mente superior?

J. KRISHNAMURTI: Como pode a mente inferior descobrir a mente superior... Parece que, ao cabo de uma hora e quinze minutos, estamos ainda a falar sobre fragmentação. Dissemos que o `eu superior´ e o `eu inferior´ fazem parte dessa divisão, e no fim de todo este tempo, ainda vos levantais para perguntar o que é `mente superior´!

INTERROGANTE: Quero referir-me ao elemento causal.

J. KRISHNAMURTI: Vedes o que diz este senhor. Estivestes a traduzir as nossas palavras na vossa terminologia sânscrita, e por conseguinte, estais confuso. Mas vós deveis dizer:`Não sei e desejo investigar´. Não desejais descobrir uma maneira de viver realmente bela, isenta de dor e de medo, uma maneira de viver totalmente harmoniosa, não desejais descobri-la? Se o desejais, tendes então de abandonar as vossas frases, tudo o que foi dito por outros, e tratar de descobri-la. Isso significa que necessitais de uma energia extraordinária; mas estais a desperdiçar a vossa energia a repetir palavras sem nenhuma significação, a não ser para aqueles que as inventaram.

INTERROGANTE: Qual a relação entre o `eu´ ou`ego´ e a mente que vê a Verdade?


J. KRISHNAMURTI: Qual a relação entre o `eu´ ou `ego´ e a mente que, ao estar vazia, completa, vê a Verdade? Qual a relação entre essas duas coisas? O que é o `eu´, o `vós´? Quando dizeis: `Eu, sou político, sou santo, sou isto ou aquilo´; o que significa isso? Vós vos identificais com a vossa família, os vossos móveis, os vossos livros, o vosso dinheiro, a vossa posição, o vosso prestígio, as vossas lembranças; o `eu´ não se constitui de tudo isso? 

O `eu´ é também chamado `eu superior´, `Atman´. Mas, a identificação com o `eu superior´ faz ainda parte do pensar, do pensamento: `deve haver uma coisa permanente, porque a vida deve ser permanente´. Existe alguma coisa permanente?
Perguntais qual a relação entre o `eu´ e aquele maravilhoso estado de percepção do verdadeiro. Nenhuma! Não há relação alguma entre as duas coisas. Uma é o resultado de conflito, aflição, agonia, dor, e a outra é vazia, pois não contém nenhuma dessas coisas."



Jiddu Krishnamurti
"O novo ente humano"













t.


































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